A música do despertar, cantada em coro pela manhã bem cedinho, soou familiar. As carinhas de sono, cheias de preguiça, até pareciam as mesmas. Mas não eram. Depois de sete anos de ausência, lá estava eu de volta a um acampamento de férias. Como que por milagre, os tempos de acampante e, mais tarde, de monitora, vieram à tona. Só que, desta vez, a experiência de estar à frente daquela animada turma teve um gosto de reminiscência. E foi repleta de tombos e de risadas.

Antes mesmo de tomar o café, o grupo espantou o cansaço com canções animadas. Essa rotina, ainda bem, pouco havia mudado. Era o último dia da primeira temporada de julho do acampamento Timbalaia, que há 20 anos é feito em um sítio em Mairiporã, a 35 quilômetros de São Paulo. Algumas crianças se preparavam para voltar a São Paulo, outras buscavam fôlego e roupas limpas para enfrentar mais duas semanas de muita atividade.
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Agendas circulavam para que cada um anotasse messenger, e-mail e celular. Recursos tecnológicos que antes passavam longe das mãos das crianças. Ainda tenho guardadas algumas cartas – aquelas de papel mesmo – que por meses troquei com amigos que conheci nesses acampamentos.

Se as formas de comunicação sofreram grande modificação, o mesmo não se pode dizer a respeito de duas coisas: a energia dos monitores e o espírito de acampamento, que contagia até mesmo os mais urbanóides. Na mesa do café, o assunto que dominava as rodinhas era a aventura do dia anterior.

Uma chuva de granizo pegou o grupo no meio de um passeio e todos tiveram de se esconder em uma caverna. Reclamações? Que nada! A trilha ficou ainda mais emocionante. Enquanto a conversa rolava solta, os “tios” preparavam a primeira atividade do dia.

Em grupo

Nem mesmo os mais cansados deixaram de fazer a trilha que leva a uma gruta. Nessa caminhada mais difícil, com lama e muitas subidas, percebe-se o maior trunfo do acampamento: despertar o espírito de equipe e o companheirismo. As risadas ao se levar um tombo, a ajuda para vencer obstáculos. Tudo isso de mão dadas.

A roupa não fica limpa por mais de dez minutos. E ninguém se importa – até as meninas deixam a vaidade um pouco de lado. O importante é curtir a aventura. No meio do caminho, um simples cipó vira diversão. É só se pendurar e balançar para os dois lados. Mas antes de os pequenos brincarem de Tarzan, os monitores testam a resistência da planta. Em um minuto todos já estavam enfileirados esperando sua vez de brincar. Ser monitor é um pouco disso também: se divertir antes de todo mundo, para garantir que ninguém se machuque.

O Timbalaia é um acampamento mais tradicional, sem muito apelo para atividades radicais ou equipamentos high tech. O barato lá é brincar como antigamente e gastar muita energia. O coordenador dos monitores, Cenno Stourbzé Sbrighi, de 27 anos, assim como outros três do grupo dos “tios”, é um ex-acampante. “Para ser monitor é preciso conservar um pouco do lado criança e, ao mesmo tempo, impor respeito na molecada”, disse. Outra coisa fundamental é ter um apelido. Cenno, por exemplo, vira Rato no período de férias.

Infância

Hora da última gincana da temporada. Desde o primeiro dia, o grupo de 75 crianças, de 5 a 17 anos, havia sido dividido em equipes e a competição entre elas estava acirrada. Para fechar bem a semana (e definir o placar), nada melhor do que uma brincadeira com água.

Na gincana DDdrim cabia aos monitores se fantasiar de mosquito. Os acampantes precisavam acertar os “insetos” com bexigas cheias d’água. Uma correria sem parar. No fim, todos estavam mais do que encharcados – isso inclui meu bloco de anotações.

Bye-bye

Ir para um acampamento tem somente um lado ruim: uma hora, inevitavelmente, você vai crescer e não poderá mais freqüentar as temporadas. O jeito, então, é guardar com carinho as boas recordações ou tentar se tornar monitor.

Helena Maria Salla, de 16 anos, e Gabriel Pires de Camargo Curti de 17, estão na idade limite para ser acampantes. Ambos já têm uma idéia fixa. “É claro que quero continuar vindo! Não imagino as minhas férias sem o Timbalaia”, disse a garota. “Queria muito virar monitor, meus pais vão adorar a idéia”, completou Gabriel.

Em troca de esticar esses anos de diversão, os dois vão ganhar responsabilidades no trabalho no acampamento. Eles garantem que não se assustam com a possibilidade. “O importante é poder fazer parte desse grupo, não importa como”, disse Helena.