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Imagem da sede da Prefeitura (Levy Ferreira/SMCS/Arquivo)

Para Ricardo Costa de Oliveira, sociólogo e professor titular da Universidade Federal do Paraná (UFPR), onde é também coordenador do Núcleo de Estudos Paranaenses (NEP), Curitiba sempre teve uma forte marca de famílias políticas na Prefeitura e no Governo do Paraná. Para ele, a eleição para prefeito de Curitiba neste ano será uma ‘gincana’ entre famílias políticas.

BEM PARANÁ: O que são as chamadas “famílias políticas” e como se desenvolve esse campo de pesquisa na Sociologia Política que trata de genealogias?
RICARDO COSTA DE OLIVEIRA:
Olha, há muitas décadas que nós trabalhamos nessa questão. Nós consideramos o poder político no Brasil – e aí no Paraná e em Curitiba também – vinculado com as estruturas de parentesco, com as famílias políticas. Então é a forma, o processo histórico no qual o próprio Brasil se constituiu e também o Estado, as instituições, de um modo que em todas as eleições a realidade sempre confirma essa tese. Nós até elaboramos a chamada Teoria do Nepotismo, que na Sociologia Política é a relação entre parentesco e poder, onde há a variável família política. E é exatamente o que explica os atores, a movimentação, e ao longo de várias décadas essa Teoria do Nepotismo sempre informa para analisarmos, investigarmos as famílias políticas, as genealogias, as dinastias familiares, que sempre dominam a disputa em Curitiba, no Paraná e em boa parte do Brasil: famílias políticas no Executivo, Legislativo, Judiciário, militares, Tribunais de Contas, empresariado… Então é o nosso tema de pesquisa já há bastante tempo.

BEM PARANÁ: E a Teoria do Nepotismo surge justamente aqui em Curitiba, a partir das pesquisas do Núcleo de Estudos Paranaenses (NEP) da Universidade Federal do Paraná?
RICARDO COSTA:
Exatamente. Desde o meu Doutorado, ainda na década de 1990, há 30 anos, que nós procuramos pesquisar a política paranaense e aí também reconhecendo a importância dessas famílias na disputa pelo poder. E Curitiba sempre teve uma forte marca na Prefeitura, no Governo do Paraná, de famílias políticas. E aí é um modelo que nós hoje aplicamos também no Brasil inteiro, que já deveria ser muito mais pesquisado o tema das famílias políticas, o fenômeno do nepotismo, as indicações… Mas nas Ciências Sociais, na Sociologia Política, aqui em Curitiba que nós fomos um dos primeiros, há mais de 30 anos, a colocar ênfase na pesquisa sobre famílias políticas e nepotismo.

BEM PARANÁ: E uma grande parte dessas famílias políticas, imagino, são grupos que vem se reproduzindo desde os tempos do Império, ainda que os sobrenomes possam até ter mudado ao longo dos anos…
RICARDO COSTA:
Exatamente, porque muitas vezes é também a questão dos casamentos pelas mulheres, e aí você tem a continuidade do poder social, econômico e político, que vem do período colonial, passa pelo período imperial e pela República também, ao longo de todos os ciclos, e entra muito forte no século XXI. E tem mais um fenômeno, Rodolfo: quem entra na política e é um ascendente, é um emergente, cria a sua nova família política. E o grande exemplo aqui no Paraná, claro, é o da família Ratinho Massa, e aí a gente viu, com a ascensão do Ratinho como apresentador, humorista, comediante, showman, e aí radialista, na televisão, programas policiais, programas humorísticos… Agora, até, teve um acadêmico do nosso grupo que defendeu Mestrado sobre a trajetória inicial do Ratinho pai. Mas [o Ratinho pai, embora seja conhecido como apresentador, esteve] sempre na política: foi vereador em Jandaia do Sul, em Curitiba, depois, na época do Fernando Collor de Mello, foi deputado federal pelo PRN.

O Ratinho pai se aproxima muito das famílias político-midiáticas de algumas décadas atrás, que continuam por aí. Uma é a família Martinez, do José Carlos Martinez. Até já faleceu, mas era uma família dona da Rede OM [Organizações Martinez], fundada por ele e seu pai, Oscar Martinez. E a outra, é claro, uma família importantíssima para esta eleição, a família Pimentel, do ex-governador Paulo Cruz Pimentel. E como nós sempre investigamos, é uma família, casa com outras famílias importantes e vão casando, criando uma conexão familiar e genealógica muito importante.

E aí a gente explica o governador Ratinho Júnior. Ele entra na política já como um herdeiro, com um grande apoio empresarial, midiático. E aí o pai dele, o Ratinho pai, se torna um dos maiores empresários da mídia, não só no Paraná ou em Curitiba, mas no Brasil. E sempre ligado à política, a cargos no Legislativo.

Quer dizer, é uma família nova, mas opera como uma família política. E é fundamental essa forma, essa estrutura, para entendê-los.

BEM PARANÁ: E já entrando, então, na genealogia dos candidatos a prefeito, o caso do próprio Pimentel é bem exemplar nesse sentido: o Paulo Pimentel casa com uma Lunardelli (família tradicional do norte do Paraná e que, inclusive, dá nome a um município na região) e, depois, uma filha dele se casa com um membro do clã Slaviero (importante família empresarial).
RICARDO COSTA:
Exato. E o Slaviero também tem toda uma genealogia, que vem dos Gomes e Slaviero. É uma família política de Irati [na região central do Paraná], inclusive com parentesco com o ex-governador Emílio Hoffmann Gomes. A família Gomes, em Irati, é uma das principais famílias políticas locais, há muitos vereadores e prefeitos [dessa família] ao longo da história de Irati. E o Slaviero também é um poderoso grupo empresarial, da imigração italiana. Todos esses materiais e atores e famílias, nós já temos muitos artigos, livros do nosso grupo, o Núcleo de Estudos Paranaense [NEP]. Aí também recomendo um artigo da nossa colega, professora Mônica Helena Goulart, que é sobre a família Slaviero, que ela vai investigar a trajetória empresarial, a trajetória política da família Slaviero.

E agora com os três irmãos, o Eduardo Pimentel Slaviero, vice-prefeito, secretário estadual – até agora ele foi também alvo de um processo do PSOL que queria investigá-lo, que ele vai e volta, e também é uma trajetória muito importante, uma vez que para essa eleição ele é cotado, colocado como herdeiro e possível sucessor do Rafael Greca de Macedo. E temos também os dois irmãos dele, o Daniel Pimentel Slaviero, que já foi da Abert (Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e TV), da Copel e que também é um operador político; e a irmã dele, a Claudia Pimentel Slaviero, que também é mais uma importante conexão. A irmã que é casada com Daniel César Maranhão Khury, que é o irmão do todo-poderoso deputado estadual Alexandre Maranhão Khury, que é o neto do Aníbal Khury. Pelo lado Maranhão, é aquilo que a gente estava falando, é uma família que vem das capitanias hereditárias, lá de Pernambuco. Família Maranhão, você vê a genealogia Albuquerque-Maranhão, que o outro avô dele era o desembargador Guilherme de Albuquerque Maranhão, tradicional família jurídica, de juristas, desembargadores, e também tem um poder expressivo na Assembleia Legislativa, tanto que muitos apontam que o Alexandre Maranhão Khury tem todos os elementos para ser o próximo presidente da Alep. Então, o cunhado do Eduardo Pimentel é o Alexandre Khury. Além dele, já vem de uma família muito importante, Gomes-Slaviero-Pimentel, e aí todas essas conexões – neto do Paulo Pimentel, que foi governador, grande empresário da mídia; bisneto da poderosa família latifundiária Lunardelli… E a família do Paulo Pimentel, em Avaré (SP), já era também uma família política do poder local, isso no início do século XX. A gente tem também essa genealogia mais antiga do Paulo Pimentel, quando ele vem para o Paraná, para Porecatu, casado à família Lunardelli.

Quer dizer, é todo um esquema, aquilo que na Sociologia se denominam capitais sociais e político-familiares, que colocam a candidatura do Eduardo Pimentel com um potencial de favoritismo muito grande. Se vai se realizar, é a questão. Mas na pesquisa, que foi feita agora, esses últimos dias, ele aparece em primeiro lugar. E também tem o PSD, o partido em que está lá o Alexandre Khury, o governador Ratinho Junior.

Outro dado importante é que o presidente da Câmara Municipal, o vereador Marcelo Facchinello, também foi uma indicação muito próxima do Alexandre Khury. Quer dizer, então, que é mais um apoio. Muitos na época não entenderam, [questionaram] “por que o Fachinello?”, porque ele era vereador de legislatura. Mas a relação dele com o Alexandre Khury foi muito importante para entender como ele se torna presidente da Câmara Municipal e é mais um vereador, também, estratégico aí para a campanha do Eduardo Pimentel. Além, é claro, daquilo que a gente sabe em Curitiba: toda a base empresarial, a base das famílias tradicionais, aquele circuito que se denomina Graciosa Country Club e Curitibano. Conhece esse circuitão? E aí passa também, é o circuitão: Graciosa-Curitibano-FIEP-Associação Comercial do Paraná, que formam uma cruz. Quem está bem nos quatro polos é favorito, porque vai ter dinheiro empresarial, apoio, redes sociais, redes eleitorais, e além do próprio apoio do prefeito Rafael Greca de Macedo, que foi também objeto de muitos livros nossos, artigos, pesquisas nos últimos 30 anos, e que vem da mais poderosa oligarquia familiar, eu diria, em Curitiba: a família Macedo. Vários prefeitos de Curitiba, vários desembargadores do Tribunal de Justiça, vários presidentes da Associação Comercial do Paraná, empresariado. Então é uma família muito atuante.

E até os dados para quem, como nós, pesquisamos a genealogia, que o Rafael Greca de Macedo, ele é primo genealógico, pelo clã Macedo, do Beto Richa, que também é candidato e outro exemplo de família política. O Beto Richa é filho do falecido ex-governador José Richa, que foi senador, foi um homem importantíssimo na política paranaense, na redemocratização. E pela mãe, ele também é do clã Macedo. E a outra prima deles, com destaque na política atual, contemporânea, é a Rosângela Wolff de Quadros Moro. A esposa do senador Sergio Moro também é do clã Macedo. Rosângela, deputada federal por São Paulo, ainda que tenha transferido o título [eleitoral para o Paraná].

Em terceiro lugar na pesquisa, também um ex-prefeito, também um quadro consolidado, o Luciano Ducci, deputado federal do PSB, ele é casado também com uma sobrinha de um político, que é lá de Paranavaí, que é a Marry Dal-Prá, sobrinha do deputado Dionísio Dal-Prá, que foi da região noroeste, foi até do Arena [partido criado em 1965 com a finalidade de dar sustentação política ao regime militar]. Então, também é alguém casado, ainda que seja alguém que tenha tido uma trajetória política diferente, também tem o componente familiar aí, da família Dal-Prá, da esposa do Luciano Ducci.

Quer dizer, com isso a gente vê como a análise pelas famílias políticas é muito importante para entendermos o enredo.

BEM PARANÁ: E como que acaba sendo também o impacto da existência
e perpetuação dessas famílias políticas no funcionamento de uma democracia?
RICARDO COSTA:
Uma vez que são poucas as famílias, não há muita renovação eleitoral, não há muita competitividade, o que temos é um regime oligárquico. E a gente verifica que, eleição após eleição, é aquilo que a gente pesquisa há 30 anos: sempre são poucas e as mesmas famílias políticas. A gente vai vendo as matérias antigas, sempre é aquela questão: família política, dinastias políticas, nepotismo nessa relação pela qual o poder é transmitido, transferido entre pai, filho, avô e neto. A gente verifica que são esses casos e é o que explica o Eduardo Pimentel, o Beto Richa – que também já foi de tudo na política, quer voltar a ser prefeito, mas já foi prefeito, governador, teve o conflito com a Lava Jato e aí não conseguiu o Senado, mas depois virou deputado federal. A esposa dele, a Fernanda Vieira Richa, da família Andrade Vieira, também foi uma das famílias mais ricas do Paraná, do antigo Banco Bamerindus, o tio dela, o senador José Eduardo Andrade Vieira, e também vai conectando com outras famílias importantes. Por isso que a gente sempre tem que analisar os atores, a genealogia, os casamentos… Tudo isso é muito importante.

E aí entra também o Deltan Dallagnol, do Novo, que teve o mandato de deputado federal cassado devido a irregularidades, crimes eleitorais. Também a família Dallagnol é uma família importante, o pai dele também era procurador do Estado e tem até várias matérias daquela série muito interessante, [do site] De Olho nos Ruralistas, da família Dallagnol numa região de floresta na Amazônia Legal.

Aí também, correndo junto, embolado, o Ney Leprevost, que também é de uma família política: o avô também foi prefeito durante um momento em Curitiba, o irmão dele, o Alexandre Leprevost, também é vereador e ele vem há muitas eleições concorrendo, está disputando.

Tem o Paulo Martins, do PL, que é mais para pegar o veio bolsonarista de extrema-direita, também com menos chance, eu diria.

Aí também sempre está presente, mais uma candidata de famílias políticas, a Maria Victoria Borghetti Barros, filha do poderoso deputado Ricardo Barros, que é uma das principais famílias políticas de Maringá: ele [Ricardo] já foi prefeito, o irmão já foi prefeito, o pai foi prefeito. Família Barros e Magalhães, muito atuante na região. Ela também é uma herdeira política e está também cotada na disputa

Temos ainda o Luizão Goulart, que foi prefeito de Pinhais, aqui na região metropolitana, já foi do PT e está no Solidariedade.

E a Carol Dartora, aí sim uma novidade. É uma professora, do Partido dos Trabalhadores, negra, não tem família política. Mas ela também está com intenção de voto baixa, bem como o Goura, que é deputado estadual, já foi candidato a prefeito e até teve um desempenho razoável, também está aí nas indicações.

De modo que, para os favoritos – eu diria o favoritíssimo, pela estrutura, o poder, a máquina da prefeitura, a máquina empresarial, as famílias políticas, o Eduardo Pimentel; o Beto Richa também, de família política; o veterano Luciano Ducci, e correndo atrás o Deltan Dallagnol, também tem sua família; o Ney Leprevost, família política, e a Maria Victoria também.

Então, de modo que os candidato a prefeito favoritos, todos têm fortes conexões com famílias políticas, mais uma vez, como é a tradição curitibana.

BEM PARANÁ: E a gente pode dizer que Curitiba e o Paraná se destacam até mais do que outras localidades na formação dessas famílias políticas?
RICARDO COSTA:
É um fenômeno nacional. Como nós aqui estudamos, criamos a teoria do nepotismo e passamos a valorizar muito as famílias políticas, isso ficou em evidência. Mas quando a gente vai para várias outras cidades, encontramos as mesmas estruturas. Em Recife, por exemplo, tivemos recentemente o João Campos, filho do falecido presidenciável Eduardo Campos, neto do governador Miguel Arraes, disputando a última eleição pela Prefeitura contra a prima dele, a Marília Arraes. Então em vários municípios muitas vezes encontramos esse fenômeno. Em alguns grandes municípios, como São Paulo, Rio de Janeiro, se vê mais renovação. Mas em vários municípios brasileiros, inclusive capitais como Curitiba, é sempre uma disputa de família política. Eu até brinco nas aulas, eu até falei nesta semana: Curitiba não tem só uma eleição, mas uma gincana entre famílias políticas e herdeiros políticos. É uma gincana de famílias políticas e de herdeiros políticos, sempre os favoritos.

BEM PARANÁ: E outro fator que chama também a atenção é que uma grande parte dos candidatos mais bem colocados tem alguma relação com o lernismo. De fato o lernistmo ainda vive na política paranaense e como o senhor espora que isso vá se manifestar agora, nessa eleição que se aproxima?
RICARDO COSTA:
Sim. Na verdade, é aquilo: o próprio lernismo, o Jaime Lerner, ele foi mais um capítulo da política do neysmo anterior, do Ney Braga, que foi o grande chefe político do Paraná durante o regime ou a ditadura militar. E foi o Ney Braga que também depois viabilizou o Jaime Lerner, principalmente na carreira política dele, que foi na segunda administração da Prefeitura, concomitante ao segundo governo de Ney Braga. E aí esse grupo que era do Ney Braga, mais antigo, passa pro Jaime Lerner, que também agrega novos valores na época, um dos quais também era o próprio Rafael Greca de Macedo, Cássio Taniguchi, o próprio Luciano Ducci. E depois também se aproximam do Aníbal Khury e aí o próprio Beto Richa também, quando ele foi eleito deputado estadual, também se aproximava do Anibal Khury, do esquema com o próprio Jaime Lerner – ainda que o pai dele tivesse disputado no auge pelo PMDB, o ciclo do PMDB, que foi o José Richa, o Álvaro Dias e o Roberto Requião, anos 1980 até o início dos anos 1990. Aí em 1994 o Jaime Lerner vence, é reeleito em 98 e depois volta o Requião.

Então, todas essas conexões, elas existem, né? E esse grupo do Jaime Lerner, também, antes era um grupo do Ney Braga, e antes era sempre… É uma política dominante no Paraná, de grupos que controlam o governo, o Estado e, geralmente, a Prefeitura, com poucas exceções.

BEM PARANÁ: E como que se faz para mudar esse cenário e garantir uma abertura maior, uma renovação maior nos centros de poder?
RICARDO COSTA:
O problema é que para entrarem novos, quadros emergentes, pessoas sem famílias políticas, tem que começar uma nova carreira. Mas o sistema político e eleitoral, ele tende a privilegiar quem já está bem posicionado, porque boa parte das eleições, para o Legislativo, é ainda o poder econômico – e muitas vezes, a gente sabe, o abuso do poder econômico – que elege grandes bancadas, como agora a de vereadores, ou nas eleições, também, quando é para deputados estaduais, federais… O poder econômico é muito decisivo, e geralmente são famílias políticas, famílias empresariais, que têm mais dinheiro, mais financiamento, mais recursos, e aí bloqueiam os novos. Muito pouca gente nova ou de partidos e, às vezes, quando entram, são também aliado com as famílias políticas.

Vamos lembrar, também, que tivemos há pouco tempo na Prefeitura o Gustavo Fruet. É do PDT, é um nome mais de centro-esquerda, mas também de uma família política, uma vez que ele é filho do também ex-prefeito Maurício Fruet e que a irmã dele também era secretária municipal. Então, mesmo o Fruet também era uma família política.

E aquela questão, Rodolfo: é a teoria do nepotismo tem muita abrangência e validade, que passam as décadas e ela continua explicando e sendo válida. E para alguém novo, seja de direita, não consegue furar.

Curitiba teve também até candidatos mais de extrema-direita, como agora Paulo Martins e, antes dele, o Francischini. Também era uma família, e aí mais ligada à extrema-direita, ou até ao bolsonarismo, agora em crise – está até realmente [havendo] uma redefinição desse campo. Ou da esquerda ou da extrema-esquerda, e aí muitas vezes até nomes vão tentando abrir o espaço, como o fenômeno até aqui em Curitiba, no Paraná, do deputado Renato Freitas, que foi vereador e aí ele consegue façanhas, como ser o primeiro vereador cassado em 300 anos – e aí ele foi à Justiça, ao STF, que garantiu a continuidade dele do cargo [impedindo a cassação]. E agora também, como deputado estadual, ele sempre numa disputa com os donos do poder, com o próprio presidente da Casa se equilibrando, o deputado Traiano, muito experiente e que é de uma outra família política, eu descobri também há pouco tempo, lá da região Sudoeste [do Paraná]. No começo eu achava que não, que vinha de uma imigração italiana, de colonos. Mas não, ele também tem os vínculos de casamento lá com famílias tradicionais do Sudoeste, da região de Clevelândia, Palmas, de modo que essa dimensão do poder familiar é decisiva.

Quando vem um político emergente, ele não consegue ter aderência, espaço para concorrer a um cargo majoritário, com muita dificuldade, e os partidos também acabam que passam a ser clubes de famílias políticas, tipo hoje o PSD. E para as famílias, o partido político é secundário, o que vale é a conexão familiar e genealógica.

BEM PARANÁ: E encaminhando a nossa conversa para o final, professor, queria fazer, digamos, um resumo de tudo que a gente conversou. Afinal, o que a gente pode esperar dessa disputa eleitoral que se aproxima
pelo Palácio 29 de Março?
RICARDO COSTA:
Olha, sendo realista como analista, acho que é mais do mesmo. Continuar as famílias políticas, né? Pelo menos a princípio – claro, a candidatura, se decolar, vai ter ainda mais apoio, do Eduardo Slaviero, que tem todos os elementos familiares, com família Slaviero, família Pimentel, família Gomes, cunhado do Alexandre Khury, com os irmãos, com a Câmara Municipal, muitos vereadores, com a máquina da Prefeitura do Rafael Greca de Macedo, de saidera, com o governador Ratinho [Junior]… E também procura-se o nome. O Eduardo Pimentel teve uma atuação discreta, também não tem nenhuma grande rejeição, ele é bem discreto, não se aproximaram – nem o próprio Ratinho, já se descolou do bolsonarismo, tanto que eles não foram nessa última grande manifestação em São Paulo. O Ratinho não foi, nem o pai dele. Eles têm um instinto. Quando Lula estava para se eleger, foi até muito bem entrevistado pelo Ratinho, o pai, lembra? Eles já sabiam que onde há poder, eles também querem compor, com um pragmatismo muito grande.

E pelas pesquisas, um nome, recall também, é o do Beto Richa, que já passou o tempo dele, já passou o auge. Mas é aquilo, como o próprio Rafael Greca de Macedo, muitos diziam isso na eleição retrasada [de 2016], que o Greca era carta fora do baralho. E não, o homem se elegeu, muito por causa da família Macedo, e depois se reelegeu com tranquilidade, sobrando espaço, né? E daí também o Beto Richa, quem sabe, mas eu acho que a princípio é o Eduardo Pimentel [o grande favorito], até pelas pesquisas de opinião, e aí o Beto Richa.

O Ducci também, vamos ver se ele teria fôlego. Ele tentou uma aliança com o PT, mas a base do Partido dos Trabalhadores votou contra. A esquerda, o PT, não vai com a cara dele, então não teve ainda uma aderência para formar algo como uma frente ampla com o Ducci, PSB, PT, e ele também já foi adversário histórico do PT Curitibano em outras eleições, na Prefeitura.

O Deltan Dallagnol também já está com o facho da Lava Jato mais apagado – até o Moro, vamos ver essa questão agora, nos próximos meses, se o Moro vai ser cassado também por irregularidades, a Lava Jato também já passou o tempo.

E Leprevost continua sempre aí, é um candidato com família.

Então acho que deve ficar entre eles mesmo, né? E a princípio, candidaturas sem família política tem muita dificuldade em terem uma maior presença eleitoral, porque não tem dinheiro, não tem apoio de vereadores e não tem apoio do famoso circuitão que eu falei, Graciosa-Curitibano-Fiep-ACP. Quem fecha esse retângulo, esse quadrado, vai ter muito apoio, dinheiro, base, rede, né? E é o caso, aparentemente, do Eduardo Pimentel mesmo. Vamos ver.