Antes de começar a soltar o verbo, nada mais justo do que eu me apresentar. Pois bem, sou a Rafa. 33 anos, e dois anos antes de ser mãe, me tornei “drasta” (má ou boa, é preciso perguntar pro meu enteado, rs rs,). Por hora, creio que seja o suficiente.

Vou contar duas histórias:

1ª – Meu companheiro sempre teve, e ainda tem, cabelo comprido. Nada mais natural, que o nosso pequeno quisesse ter o cabelo igual ao do pai. Para nós não havia problema algum, mas foi só o tempo do cabelo do guri crescer na altura do queixo para que a pressão começasse:

“Ahhhh, mas menino tem que ter cabelo curto!”

“Quando vamos cortar seu cabelo?”

“Fala pra mamãe levar você no salão.”

E até o inacreditável: “Vamos levá-lo ao salão, eu pago!”.

Nessas horas eu vestia (e ainda visto sempre que necessário) minha melhor cara de alface (!) e lembrava dos Pinguins de Madagascar: “Sorria e acene”. Para os que insistiam, ainda emendava: “Ele quer ter o cabelo igual ao do pai”. E seguíamos a nossa vida. Até que um dia, meu pequeno chega em casa e  o pego em frente ao espelho analisando o próprio cabelo, quando ele solta:

_ Meu cabelo é feio.

_ Claro que não meu filho, seu cabelo é lindo. Olha, ele tem cachos iguais ao meu e igual do seu pai. E lembra, você quis deixar ele crescer pra ficar igual ao do papai!

Passaram-se uns dias e um tempo depois ao buscá-lo na escola – no caminho pra casa – ele solta novamente:

_Eu sou feio, por que meu cabelo é grande.

Na hora em que ouvi aquilo, fiquei meio sem reação. Só consegui soltar um:

_Eu acho você lindo!

E a conversa sobre isso, momentaneamente, encerrou-se ali. Chegamos em casa, puxei o pai no canto, expliquei a situação e fomos lá tentar entender o que estava acontecendo.

_Filho, a mamãe me contou que você disse que é feio por que seu cabelo é grande, verdade?

_É, eu gosto do meu cabelo, mas o fulano da minha sala disse que eu sou feio, por que meninos não tem cabelo grande. Só meninas. O pai dele falou que piá não pode ter cabelo comprido.

Nisso, começou a chorar copiosamente.  E aí nos conversamos, falamos que todo mundo pode ter o cabelo que quiser. Comprido, curto, enfim, terminamos perguntando se ele queria cortar o cabelo.

_Quero, quero cortar meu cabelo, bem curto.

_Então vamos pro banheiro que eu vou cortar o seu cabelo.

Entramos no banho, e mesmo com dó, cortei o cabelo dele exatamente como ele havia pedido. E enquanto cortava, explicava que todo mundo pode ter o cabelo que quiser, que tudo bem se algum dia ele quisesse deixar o cabelo crescer novamente, ou quisesse cortar sempre.

2ª – Aqui em casa procuramos não fazer distinção entre brinquedos de meninos, e meninas. Com isso, o pequeno além de seus brinquedos, herdou de mim alguns brinquedos – que ainda há quem diga são apenas para meninas (um daqueles bebezões, um jogo de chá em miniatura de porcelana, panelinhas, etc).

Por conta disso, uma vez passamos pela seguinte situação:

O pequeno estava com um amiguinho brincando na sala, quando foi até o quarto e voltou com o bebezão pra brincar. Tudo numa boa, até que o amigo pega o bebezão e joga no chão.

_Ei fulano, por que você jogou o bebe no chão?

_Meu pai disse que guri não pode brincar de boneca.

_Ahhh é? Quando ele vier te buscar vou conversar com ele. (E desandei a falar que podia sim, por que aí quando ele fosse adulto, e tivesse filhos, ia saber como cuidar, que ia saber dar colo, carinho. E eles continuaram a brincar). Quando a mãe chegou pra busca-lo, fiz questão de contar que eles tinham brincado com o bebê. E para o seu azar, ela pergunta:

_ Você não tem medo?

_Do quê? Dele aprender a ser bom pai?!

(Sorri “e acenei” – iguais aos pinguins, lembram?)

Não sei o que se passou depois, mas levou um tempo até ele voltar em nossa casa.

Pois é, essas duas histórias são apenas pequenos exemplos de alguns, dos tantos, preconceitos que infelizmente nós – sim, me incluo aqui, pois eu também tenho um monte deles e luto diariamente para aprender respeitar as diferenças  – pais e mães passam pros filhos e filhas todos os dias. 

Uns de forma bem descarada como eu contei aí em cima. E outros mais sutis, como  a recente recusa da mãe de uma amiguinha que não acha adequado sua filha vir brincar na casa do amiguinho (Como eu sei disso? Porque ela olhou pra mim e disse: “Minha mãe não vai deixar nunca!”).

E o que eu quero dizer com tudo isso?

Quero espalhar aos quatro ventos que se a gente quer um mundo melhor para os pequenos é preciso EMPATIA.

É preciso se colocar no lugar do outro. Afinal, não somos tão diferentes assim que não possa haver respeito e acolhimento. E isso é um exercício diário, e a mudança não se vê da noite para o dia. É um processo, longo e nem sempre fácil. Mas, nunca antes tão importante e preciso.

Por quê?

Porque filhos são espelhos de nós mesmos! E você, quer ver o que no seu espelho?

É preciso lembrar sempre que enquanto carregarmos nossos preconceitos, eles também o farão.

Um abraço e até breve.