“Filho amado,

Estamos te criando para que tenha asas. E por isso, eis alguns dos nossos desejos para ti:

Que tenhas autonomia sobre a tua vida, sobre teu alimento e tua água.

Desejamos que você se reconheça em cada pessoa que passar pelo teu caminho, pois somos um.

Que tenha coragem para lutar pelo que você quer e não desista, mesmo que assim te digam.

Que você sempre tenha empatia. E quando não a tiver, que você que tenha respeito. Desejamos que saiba do teu valor, mas que nunca se esqueça da força do coletivo.

Que você aprenda cedo que dinheiro é um pedaço de papel às vezes necessário, mas nem sempre fundamental. Há coisas de muito maior riqueza na vida.

Que você tenha sempre o coração aberto para receber o que a vida te oferece. Mas que também saiba dizer não ao que possa te prejudicar.

Esperamos do fundo do nossos corações que você viaje (e com a maior certeza que se pode ter te digo: você pode sim viajar sem, ou com pouco, dinheiro! E isso não vai equivaler a passar ‘perrengue’). O melhor de viajar provavelmente não serão os lugares pelos quais irá passar e sim as pessoas que encontrará. Cada pessoa é um mundo, e como é incrível ter a alegria em partilhar um caminho.

Estou escrevendo tudo isso porque há alguns dias pedia pra vida um sinal. Um sinal para restabelecer a certeza no caminho que escolhi (pois diariamente tenho sido confrontada por pessoas que não entendem bem o fato de termos escolhido um modo de vida mais simples, a opção – ao menos por agora – de ser autônoma e tantas outras coisas que, por vezes, me estremecem de alguma forma).

Eis que na terça (15), perto da hora do almoço, ouvimos palmas no portão. Teu pai foi atender e voltou: “Eles tem fome, e não comem nada desde ontem”. Comecei a separar algumas frutas quando ele diz novamente: “São mochileiros, estão viajando.”, ao ouvir isso falei: “Abra o portão vamos fazer um almoço.”

E foi assim que conhecemos Valentina, Sol e Facu, Nerea e José. Ela uruguaia, eles argentinos e o último, chileno. Enquanto preparávamos o almoço ouvíamos suas histórias. Há dois meses na estrada, pegando carona, dormindo como dá e fazendo algum dinheiro com música, malabares e artesanato.

Conversa vai, conversa vem, pergunto a eles quantos anos tem e para minha surpresa a média de idade é de 22 anos! Uau! E meu coração de mãe – como se nunca tivesse passado pela casa dos 20 anos – logo começa a enchê-los de perguntas: “Mas e os pais de vocês? E vocês não tem medo? E isso? E aquilo?”. Escutei todas as respostas, maravilhada. Tive uma aula de pensamento sobre política sulamericana – dada por um menino de 19 anos – que eu aqui, dos meus 33, jamais conseguiria elaborar com tanta maestria. Isso tudo me fez revirar o coração e achar num canto “a caixa” das coisas que ainda vou fazer na vida!

Eu sempre quis ‘mochilar’ mas faltou coragem, porque eu – criada numa família de classe média baixa – sempre achei impossível viajar sem dinheiro e não tinha coragem pra provar o contrário, além de todo o medo que me era imposto cada vez que falava disso com amigos – “Ahhhh mas viajar sozinha é perigoso”, “Mas como você vai viver?”. Então, permitia-me vez ou outra viajar sim, mas sempre com reservas para qualquer imprevisto e sempre com destino certo, fosse um hotel, ou fosse à casa de amigos.

E quando finalmente encontrei um parceiro, passamos dois anos juntando coragem suficiente para cair no mundo, e a vida nos deu você!

A viagem mais feliz e louca que já fizemos! <3. Com amor, mamis.”

 

PS: E se você leu até aqui e acaso encontrar estes queridos por aí (eles estão subindo o mapa), não hesite em abrir a porta, a mente e o coração! =)

mochileiros

Valentina, José, Sol e Nerea no parque ao lado da nossa casa, durante uma roda de viola. <3[/caption] [caption id="attachment_580" align="alignnone" width="620"]mochileiros-viajar-brasil Nossos queridos mochileiros (da esq. para dir.) Sol, Facu, Valentina, José e Nerea, que nos trouxeram alegria e aprendizado e já deixaram saudades