Aprovada pelo Congresso Nacional em 2010 e validada pelo Supremo Tribunal Federal em fevereiro último, a Lei da Ficha Limpa chega às vésperas da eleição municipal de 2012 cercada de dúvidas. Apesar de ter sido considerada constitucional pelo STF, que garantiu ainda sua aplicação já para a disputa de outubro próximo, a aplicação da norma que barra candidaturas de políticos condenados em segunda instância pela Justiça ainda corre riscos. A polêmica é um dos destaques do Congresso de Direito Eleitoral que começou ontem em Curitiba, e trará hoje à Capital paranaense a presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ministra Carmen Lúcia.

Segundo o advogado Luiz Fernando Pereira, um dos organizadores do evento, a principal dúvida é se a Justiça Eleitoral terá condições de julgar todos os pedidos de impugnação de candidatos com condenações judiciais a tempo de barrar sua participação na eleição. O problema é que quem tem o registro indeferido segue candidato até ser julgado o último recurso. Às vezes o recurso só é julgado após a eleição. Como há uma avalanche (de ações) a partir de julho, pode faltar tempo, explica.

Ele cita como exemplo o caso do ex-prefeito de Londrina, Antonio Belinati (PP), que apesar de pendências judiciais, só teve o seu registro cassado depois de eleito em 2008. Por conta disso, foi necessário realizar uma nova eleição, vencida por Barbosa Neto (PDT).

A lei da Ficha Limpa surgiu a partir de um projeto de iniciativa popular apresentado com o apoio de mais de 1,3 milhão de assinaturas. Ela foi aprovada pelo Congresso em maio de 2010, às vésperas da eleição para governadores, deputados federais, estaduais e senadores. Inicialmente, o Tribunal Superior Eleitoral determinou sua aplicação imediata. Mas uma ação de candidatos barrados acabou fazendo com que o STF decidisse que ela só poderia ser aplicada em 2012, já que por lei, qualquer mudança nas regras tem que ser feita no mínimo um ano antes da eleição.

A lei torna inelegível por oito anos um candidato que tiver o mandato cassado, renunciar para evitar a cassação ou for condenado por decisão de órgão colegiado mesmo que ainda exista a possibilidade de recursos. Na prática, as eleições deste ano será a primeira vez que ela será aplicada efetivamente. A estreia é agora em 2012. E será uma estreia com muitas incertezas, inclusive se a Justiça eleitoral vai dar conta de julgar todos os pedidos de impugnação, diz o advogado Luiz Fernando Pereira.

Outra dúvida é quanto a extensão da aplicação da norma para políticos condenados antes da entrada em vigor da lei. Ou também para aqueles cujas penas já prescreveram. Após o julgamento que considerou a lei constitucional, em fevereiro, os ministros sinalizaram que o Tribunal ainda terá que decidir se os políticos condenados, porém com penas prescritas devido à demora do julgamento, devem ou não ser submetidos às regras mais rígidas impostas pela lei. Penas de até um ano prescrevem três anos depois que a ação penal começou a tramitar, enquanto as penas de mais de 12 anos prescrevem em 20 anos.

Apesar de os efeitos da condenação serem suspensos com a prescrição, a possibilidade de o político nessa situação ficar inelegível começou a ser cogitada por uma ala conectada com o efeito moralizante da lei. Esse grupo acredita que a prescrição não anula o entendimento judicial de que houve delito, e que, portanto, o político não tem o passado limpo exigido para concorrer a um cargo eletivo.

Outro argumento usado pelos defensores da aplicação da lei é que os critérios da Ficha Limpa não são punição, e sim pré-requisitos que devem ser seguidos por quem quer ser candidato. Até agora não foi definido se em todos os casos ela retroage antes da vigência da lei. O Supremo acenou que ela deve retroagir, mas não é algo plenamente definido, diz Pereira.