Estima-se que o número de motocicletas no Brasil seja de 5,4 milhões. Em 2000 circulavam pelo País cerca de 2,5 milhões motos. No mesmo período, a frota nacional de automóveis e caminhões cresceu 15,6%. O baixo valor das prestações na compra deste veículo e o fato de serem uma alternativa ao trânsito pesado das grandes cidades são as principais justificativas para o crescimento acelerado deste mercado.


O fato é que as motos são uma realidade das ruas. Pensar em engenharia de tráfego ignorando estes novos veículos é resolver apenas metade do problema do trânsito. Em 2005 registrou-se 1.505 mortes provocadas por acidentes de trânsito na malha viária paulistana, o que representa elevação de 6% em relação ao ano anterior. No período, 345 motociclistas morreram. A cada dia, quatro pessoas perdem a vida no trânsito: dois pedestres vítimas de atropelamento, um motociclista e um ocupante de automóvel. Estima-se em 500 mil o número de motos em São Paulo. Embora representem 10% da frota total de veículos, as motos são causadoras de 23% das mortes no trânsito.


É bem verdade que boa parte desta situação poderia ter sido controlada há quase dez anos, quando foi regulamentado o Código de Trânsito Brasileiro. Em 1997, o então presidente da República, Fernando Henrique Cardoso, vetou o artigo 56 do Código, que impedia a circulação de motos nos corredores entre os automóveis. Como já se sabe, esta não se mostrou a melhor opção: nem os motoqueiros estão disciplinados para trafegarem entre carros e nem os motoristas suficientemente atentos a estes veículos. Além disso, ainda há a problemática dos pedestres que insistem nas travessias fora das faixas. O resultado são mais atropelamentos.


Entre os dias 18 e 22 de setembro aconteceu a Semana Nacional de Trânsito, uma deliberação do Contran (Conselho Nacional de Trânsito). O slogan deste ano – “você e a moto: uma união feliz” – foi criado com a finalidade de transmitir uma mensagem positiva, remetendo à importância do convívio cidadão entre motociclistas e demais usuários do espaço público. Mas para que este tipo de atitude não fique apenas na retórica, algumas iniciativas tornam-se mais do que necessárias.


A CET-SP (Companhia de Engenharia de Tráfego de São Paulo) parece ter dado o pontapé inicial para que motociclistas e demais usuários possam parar as degladiações: uma importante – mas não tão movimentada – avenida de São Paulo, a Sumaré, ganhou faixa exclusiva para motos. A proposta deverá beneficiar novas vias da capital paulista após período de avaliação deste trecho. Os automóveis não poderão utilizar a faixa exclusiva, sob pena de multa. Porém, os motociclistas que optarem por não utilizar este espaço ficam isentos de represálias.


Precisamos levar em consideração que trata-se de um projeto piloto, portanto, ainda há muito a ser acertado. Mas a CET-SP tem o mérito de ser a pioneira em encarar o problema de frente. Não dá mais para colecionar estatísticas: é hora de agir.


A criação de acessos especiais corretamente sinalizados, o respeito de motoristas e pedestres por esta sinalização, bem como a eficácia funcional destas demarcações são pré-requisitos para uma nova realidade que pode estar começando a se desenhar. Vale lembrar que a sinalização não precisa apenas existir, ele deve ser eficiente e aqui vai um exemplo prático: muitos atropelamentos também ocorrem em plena faixa de pedestres. Por que o condutor não respeitou a sinalização? Nada disso. Porque em dias de pista molhada, muitas tintas utilizadas para sinalizar não “seguram” os pneus.


Todas estas variantes precisam ser dimensionadas para que as estatísticas do trânsito não se resumam a tragédias. Se pedimos respeito às regras sinalizatórias é porque, em primeiro lugar, elas devem existir nas vias e, em segundo, porque confiamos em sua funcionalidade. Sinalizações horizontais e verticais explícitas, eficazes e duradouras e cada um fazendo sua parte em respeito a estas regras: pré-requisitos para que esta fraternidade no trânsito possa se tornar, realmente, plausível e feliz. 


*Áurea Rangel é química, mestre em engenharia de materiais e diretora-executiva da Hot Line.