Haveremos de resguardar a canalhice necessária para aderir em tempo oportuno. Expressão sábia de um velho coronel mineiro do Vale do Jequitinhonha, na divisa com a Bahia. Nas eleições gerais de 2014, encerrado o prazo das convenções partidárias, resguardar a canalhice e aderir a vantagens inqualificáveis retratou um tempo brasileiro. A cultura da vassalagem dos princípios e fundamentos éticos e morais prevaleceram nas composições partidárias. Aderir ao poder a qualquer preço gerou uma cultura política cortesã, onde a grande vítima é a administração pública.
A sociedade queda-se perplexa diante dessa canalhice militante. Obrigada pela legislação discricionária a votar, comparece às urnas: escolhe quem deve ser governo e quem deve ser oposição. A fragilidade e a corrupção dos partidos políticos se encarregam de sepultar esse fundamento democrático. A inexistência da fidelidade partidária e doutrinária é a garantia da adesão fisiológica ao poder. A oposição desaparece ao passar a integrar cavilosamente os governos em todos os níveis. Federal, estadual e municipal. Aí reside um dos referenciais da baixa credibilidade e respeito de majoritários contingentes dos brasileiros, em relação aos políticos.
A adesão marginal ao poder sempre teve presença no passado, mas em níveis menores. No presente, essa canalhice assumiu proporções oceânicas. Coerência no respeito ao compromisso popular celebrado com os eleitores passou a ser quase sinônimo de palavrão. Reinterpretam o conceito hispânico, travestido de roupagem fisiológica: Se hay gobierno, sou a favor.
São os chamados partidos e políticos de resultados, autênticos despachantes de luxo responsáveis por futuras irregularidades no uso e abuso do dinheiro público. O falacioso argumento: para atender as suas regiões não podem divergir dos governos de plantão. Sob pena de ver marginalizadas as suas propostas de atendimento às demandas regionais. A honra ao mandato, obtido por ser oposição, é maculada pela adesão sem convicção.
Na eleição presidencial de 2014 e nas estaduais, não se enxerga programa de governabilidade, onde aflore os fundamentos de um projeto de desenvolvimento para o Brasil, Prevalece a política rasteira e esgotada das coalizões políticas. Algumas verdadeiras colisões políticas pelos conflitos que haverão de gerar. O foco da adesão às candidaturas não se realiza buscando governar para o bem comum, mas para garantir a divisão de benesses, pela ocupação da administração pública no futuro, onde a meritocracia e a competência tem valoração negativa.
Essas frentes políticas partidárias não tem compromisso com enxugamento da máquina pública ou redução da carga tributária. São camaleões políticos, agentes profissionais do apoio a qualquer governo. Usam a estrutura pública para atender demandas e interesses. Acumulando assim poder e prestígio e, quase sempre, incorporando patrimônio pela traficância sem limite nos corredores do poder.
Nesse cenário, onde predomina o balcão de negócios políticos, a marginalização dos políticos éticos, decentes (e são muitos), é o objetivo a ser buscado. Deles não se pode prescindir, daí a imperiosidade de prestigiá-los, nesse tempo de engodo e prevalência dos oportunistas e aventureiros. A opinião pública consciente precisa ser o sustentáculo daqueles que honram o voto popular. São os que impedem que a chama da esperança se apague. É o contraponto à canalhice do tempo oportuno.

Hélio Duque é doutor em Ciências, área econômica, pela Universidade Estadual Paulista (Unesp). Foi Deputado Federal (1978-1991). É autor de vários livros sobre a economia brasileira