GUILHERME GENESTRETI, ENVIADO ESPECIAL
PAULÍNIA, SP – A estreia em longas de um diretor apontado como promissor e o retorno à ficção de um nome consagrado do cinema brasileiro marcaram o quarto dia do Festival de Cinema de Paulínia.
Foram exibidos os filmes “Casa Grande”, do estreante carioca Fellipe Barbosa, e “Sangue Azul”, do pernambucano Lírio Ferreira, que havia produzido a última ficção (“Árido Movie”) em 2005.
“Eu estava com saudade de ver os atores na minha frente se engolindo”, diz Ferreira, que nos últimos nove anos fez dois documentários (“O Homem que Engarrafava Nuvens” e “Cartola-Música para os Olhos”).
Em “Sangue Azul”, Daniel de Oliveira vive um ilhéu de Fernando de Noronha que deixa para trás o irmão e a mãe (Sandra Corveloni) e passa a viver como homem-bala num circo capitaneado por Kaleb (Paulo Cesar Pereio). Quando o circo retorna à ilha, o personagem revira o passado, que inclui um amor antigo (Caroline Abras), agora casada com o irmão de Pedro (Oliveira).
O cenário paradisíaco, registrado com uma fotografia marcante, entrou por acaso. “Fernando de Noronha não foi uma escolha proposital, podia ser outra ilha, mas ela foi entrando e não saiu mais, muito por conta da sua natureza vulcânica”, diz o diretor à reportagem.
Ferreira diz que o filme –uma “fábula de amor e aventura”, como descreve– retrata seu momento atual, “de achar que estou sozinho quando na verdade estou junto com todo mundo. É um momento vulcânico.”
CASA GRANDE
Antes de “Sangue Azul”, o festival teve a pré-estreia brasileira do drama social “Casa Grande”, de Fellipe Barbosa, filme que já rodou festivais estrangeiros, nos quais foi comparado a “O Som ao Redor” (2012).
Em “Casa Grande”, Jean (Thales Cavalcanti) é um garoto de classe alta que mora num condomínio fechado na Barra da Tijuca e estuda num colégio particular tradicional do Rio. Seus pais (Marcello Novaes e Suzana Pires) escondem do adolescente que a família está quebrada.
Aos poucos, o garoto vê os empregados da casa sendo despedidos e a mãe tendo de passar a trabalhar para ajudar nas despesas enquanto ele se apaixona por uma menina de escola pública. Numa das principais cenas do filme, um churrasco na casa da família do protagonista, os pais batem boca com a namorada de Jean sobre cotas raciais na universidade; ela a favor.
Durante a sessão, a plateia riu da cena e das muitas outras em que o longa distribui farpas ao discurso da classe alta brasileira retratada no filme. “Não esperava que fosse ser esse riso o tempo todo. Fiquei até preocupado que as pessoas estivessem zoando o meu filme”, afirma Barbosa.
Segundo o diretor, o filme é uma forma de “confrontar” a riqueza. “Ela é sempre retratada no cinema e na TV como um desejo ou como pano de fundo para comédias brasileiras que não acho engraçadas. Queria falar de riqueza de forma mais crítica.”
O longa é semiautobiográfico. Quando o diretor cursava o mestrado, seus pais também quebraram. “Foi o momento em que eu me senti mais igual a todos, que era o que eu queria”, diz.
Sobre as comparações com “O Som ao Redor”, de Kleber Mendonça Filho, filme que também tem uma forte carga de crítica social, mas voltada à classe média de Recife, Barbosa diz: “Procede porque estamos tratando de diferença de classes. Mas o filme dele é mais cerebral em termos de construção cinematográfica. O meu é mais de personagem, mais uma fábula”.