RENATO OSELAME
SÃO PAULO, SP – Após seis pregões consecutivos em alta, a Bolsa de Valores encerrou as negociações da sexta-feira (22) em baixa.
O Ibovespa, seu principal índice, recuou 0,99% para 58.407 pontos, pressionado pela escalada nas tensões entre Rússia e Ucrânia e pela repercussão do discurso de Janet Yellen, presidente do Federal Reserve.
O volume de negociações na Bolsa somou R$ 4,957 bilhões, valor bem menor que os R$ 7,3 bilhões registrados no pregão anterior.
As negociações no Brasil foram afetadas pela turbulência política na região do Mar Negro, que se intensificou após um comboio humanitário russo entrar na Ucrânia sem autorização de Kiev. O ato foi condenado pelo governo ucraniano, que o caracterizou como uma “invasão direta”.
Posteriormente, a Casa Branca se posicionou em defesa da Ucrânia e ameaçou fazer novas sanções econômicas à Rússia, caso Moscou não retire os caminhões do país.
Acompanhando o cenário político internacional tenso, os investidores preferiram realizar os lucros obtidos na Bolsa brasileira nos últimos pregões.
“As notícias [da Ucrânia] afetam o Brasil porque causam uma redução no fluxo de recursos”, afirma, Julio Hegedus, economista chefe da corretora Lopes Filho, “Os investidores buscam títulos mais seguros e, de uma certa forma, isso gera volatilidade”.
CÂMBIO
O dólar comercial, utilizado no comércio exterior, encerrou o dia com alta de 0,57%, negociado a R$ 2,281. Já o dólar à vista, referência nas operações do mercado financeiro, subiu 1,16%, a R$ 2,282.
“O dólar está de olho na decisão do Fed, além de ter um movimento de aversão ao risco em torno da questão na Ucrânica”, diz Hegedus.
Em seu pronunciamento no simpósio de Jackson Hole, nos Estados Unidos, a presidente do Fed, Janet Yellen, reafirmou a posição do comitê de política monetária de que os juros do país podem ser elevados antes do previsto.
O aumento estaria atrelado à melhora dos indicadores do mercado de trabalho acompanhados pelo Fed e ao alinhamento da inflação no país à meta de longo prazo, que é de 2% ao ano.
“Será um ajuste muito gradual, mesmo que seja no segundo semestre deste ano [antes do previsto pelo Fed]. E o mercado não tem motivos para ficar muito ouriçado com isso”, diz Hegedus.
Na opinião do economista, o mercado de trabalho norte-americano não tem se recuperado rápido o suficiente e o processo de elevação da taxa de juros só deve ter início em 2015.
Para Ítalo Santos, especialista em câmbio da corretora Icap do Brasil, a alta do dólar também foi puxada pelo fraco desempenho da moeda americana ante o real nos últimos dias. “Tivemos três ou quatro dias praticamente sem voo [alta significativa no dólar]”, afirma, “A alta de hoje tem um pouco a ver com o discurso da Yellen, mas o real ficou defasado em relação às demais moedas nos últimos dias e ficou mais atrativo comprar [dólar] aqui”.
EMPRESAS
Em dia de noticiários econômico e eleitoral fracos no Brasil, a maior parte das empresas da Ibovespa passou por um movimento de realização de lucros e encerrou o pregão em baixa.
A Petrobras foi uma delas. Os papeis ordinários da petroleira, que dão direito a voto, caíram 1,89%, a R$ 19,72, enquanto as ações preferenciais, de maior liquidez, recuaram 1,78%, negociadas a R$ 20,92.
A Vale passou pelo mesmo processo, agravado pela redução nos preços do minério de ferro, que é exportado pela companhia. O produto caiu para perto dos US$ 90 dólares por toneladas, o menor patamar em dois meses, na sua segunda semana consecutiva em queda.
As preferenciais da Vale caíram 0,92%, negociadas a R$ 27,92, enquanto as ordinárias recuaram 0,60% para R$ 31,37. “O mercado fez realizações [de lucros] hoje, mas alguns papeis, por serem commodities, têm um movimento mais forte”, diz Hegedus.
Também sofreram redução no preço de suas ações as principais empresas do setor bancário: Itaú Unibanco (-1,10%), Bradesco (-1,57%) e Santander (-0,97%).
A Gol foi uma das poucas companhias que fecharam o dia com alta, de 0,21% (R$ 13,88), após divulgação de dados favoráveis na demanda total por voos da companhia em julho.
Nesta sexta (22), o BC deu continuidade ao seu programa de intervenções diárias no mercado de câmbio, negociando 4.000 contratos com vencimento em junho e setembro de 2015, no valor de US$ 197,2 milhões.
A autoridade monetária também rolou o vencimento de 10 mil contratos que devem vencer no próximo dia 1º, numa negociação que alcançou US$ 493,4 milhões.
EFEITO MARINA
O último pregão em que a Bolsa havia encerrado o dia no vermelho ocorreu no dia 13 de agosto, quando o candidato à Presidência, Eduardo Campos (PSB), morreu em um acidente aéreo. No dia, o Ibovespa fechou o pregão com desvalorização de 1,53%, aos 55.581 pontos.
Desde então, o índice tem acumulado ganhos consecutivos com a especulação a respeito da candidatura de Marina Silva (PSB) ao Planalto.
Na última sexta-feira (15), o mercado financeiro avaliou pela primeira vez que a mudança na chapa aumentaria a possibilidade de um segundo turno em outubro. Como resultado, a Bolsa avançou 2,12% e as ações da Petrobras, que tem sido fortemente influenciada pelo noticiário político, tiveram a maior alta das últimas dez semanas.
Com os problemas recentes na coordenação da campanha do PSB, contudo, o “efeito Marina” perdeu força nesta sexta (22) e fez com que os investidores optassem por realizar lucros.
MERCADO EXTERNO
Fora do Brasil, as principais Bolsas internacionais também foram afetadas pela escalada das tensões na Ucrânia. Nos Estados Unidos, o índice Dow Jones caiu 0,22%, a 17.001 pontos e o S&P 500 recuou 0,20%, a 1.988 pontos. Somente o índice de tecnologia Nasdaq teve avanço, de 0,14% (para 4.538 pontos), puxado pela alta de 0,74% nas ações da Apple, que encerraram o pregão cotadas a US$ 101,32.
O índice DAX, da Bolsa de Frankfurt, caiu 0,66%, a 9.339 pontos. O FTSE 100, de Londres, permaneceu praticamente estável, recuando 0,04% para 6.775 pontos. Já o CAC 40, da França, caiu 0,93%, a 4.252 pontos.
Após o fechamento das Bolsas europeias, o diretor do Banco Central Europeu (BCE), Mario Draghi, fez pronunciamento no simpósio de Jackson Hole.
Em seu discurso, Draghi discutiu o mercado de trabalho na zona do euro e afirmou que a melhoria nos índices de desemprego nos países da região estava atrelada a um “mix de políticas que combinam medidas monetárias, fiscais e estruturais nos níveis da União [Europeia] e nacionais”.
O presidente do BCE também disse estar preparado para ajustar “ainda mais” a política monetária do bloco, sinalizando que poderá agir em auxílio econômico à região. Apesar disso, Draghi afirmou estar confiante de que o pacote de medidas anunciado em junho deverá impulsionar a demanda agregada. No mês em questão, o BCE baixou as taxas de juros às mínimas históricas e injetou dinheiro nas economias europeias.