A Diretora Geral da Organização Mundial da Saúde, a chinesa Margaret Chan, em 8 de agosto declarou o Ebola uma emergência internacional de saúde pública, dizendo que os países afetados simplesmente não têm capacidade para lidar com um problema destas dimensões e complexidade. Pediu à comunidade internacional que lhes dê suporte com a maior urgência possível. Passado um mês e meio o caos sanitário e também político na Guiné, Serra Leoa e Libéria – os três mais atingidos pela epidemia – só fez aumentar e o vírus que até aqui já matou mais de 1500 pessoas com uma letalidade em torno de 60% (ou seja, há cerca de 1000 pacientes que sobrevivem) na última semana manifestou-se também na Nigéria e na República Democrática do Congo, embora neste último caso por meio de uma cepa menos agressiva.

Nas Américas ainda se discute a respeito das verdadeiras causas da epidemia e da possibilidade real de que consiga chegar por aqui. O Ebola é um vírus “a RNA”, pertence à família Filovirus e consiste numa única molécula de RNA negativo enrolada, apresentando proteínas incorporadas responsáveis pela sua conformação. Pode ou não apresentar envelope (proteção externa), tendo sido identificado primeiramente em 1976 em Nzara no Sudão e em Yamburo na República Democrática do Congo em região próxima ao rio Ebola que dá o nome à doença. O Ministério da Saúde brasileiro explica que a transmissão ao homem se dá a partir de morcegos frutívoros que são os hospedeiros naturais, mas também pelo contato com sangue, órgãos ou fluídos corporais de outros animais infectados como chimpanzés, porcos-espinhos, antílopes. Pelas mesmas vias não está excluída a possibilidade de contágio por contato direto com outros seres humanos (inclusive no manuseio de agulhas de injeção e lençóis utilizados pelos doentes). Em consequência os grupos sob maior risco são os familiares e os cuidadores.

A Secretaria nacional de Vigilância Sanitária afirma que é possível controlar surtos de Ebola com medidas relativamente simples, como a adoção de práticas básicas de biossegurança em serviços de saúde e no atendimento aos doentes (isolamento dos pacientes; uso de máscaras, luvas e aventais pelos profissionais de saúde; e limpeza adequada de superfícies, entre outras medidas) e, na comunidade, evitando que pessoas tenham contato com o sangue e fluidos corporais dos pacientes. Profissionais de saúde que atuam em portos e aeroportos estão orientados para providenciar a remoção de qualquer passageiro que apresente quadro de doença infecciosa durante a viagem ou antes dela, encaminhando-o para um hospital de referência.

Uma das razões que justificam a rápida expansão no número de casos reside no fato de que, no continente africano, a resistência à intervenção do pessoal de saúde tem aumentado. Na vila de Nzerekore próxima à fronteira sul da Guiné, a reunião da equipe de saúde com a comunidade começou bem. O objetivo era difundir medidas preventivas e de detecção precoce do vírus Ebola e acertar como seria feita a desinfecção de prováveis focos nas redondezas. Os chefes locais distribuíram a cada um dos visitantes dez amêndoas de kola como sinal de boas-vindas.  Mas, logo depois, um bando de jovens proveniente de um povoamento vizinho começou a apedrejar o grupo terminando por massacrá-lo com a ajuda de cacetes, porretes e facas. A sangue frio foram assassinados dois médicos, um pastor, membros da administração local e três jornalistas que os acompanhavam. Uma quarta profissional, correspondente de um jornal guineense, conseguiu escapar e ficou escondida na mata ouvindo chamar por seu nome até que os atacantes desistiram e se enfurnaram nas matas próximas após lançarem os oito corpos na latrina da escola.

Muitas comunidades, repetindo um comportamento comum em outras pequenas localidades pelo interior da Guiné, Libéria e Serra Leoa, acreditam que o pessoal da saúde é o responsável pela difusão da epidemia.

Mesmo sem um diagnóstico final o folclórico governo da Venezuela reagiu dramaticamente à notícia, confirmada pela Associação Médica do estado de Aragua, de que um surto hemorrágico de causa desconhecida foi o responsável por levar rapidamente a óbito quatro crianças e quatro adultos no hospital estatal de Maracay, na última semana. Diante de suspeitas de que poderia se tratar de ebola ou da febre chicunguya, imediatamente o presidente Nicolás Maduro tomou os microfones (sempre à sua disposição por lei) e declarou que se tratava de uma campanha de desinformação e de terrorismo fomentado pela direita venezuelana.

Vitor Gomes Pinto
Escritor. Analista internacional. Doutor em Saúde Pública.
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