FABÍOLA SALANI E RENATO OSELAME
SÃO PAULO, SP – Em dia de grande volatilidade na Bolsa de Valores, o dólar acelerou ante o real e encerrou o pregão desta terça-feira (23) acima do “teto informal” estipulado pelo mercado financeiro para a moeda, com base nas intervenções diárias do Banco Central no câmbio.
O dólar comercial, utilizado em negociações do comércio exterior, fechou o dia em alta de 0,62%, cotado a R$ 2,409. Já o dólar a vista, referência no mercado financeiro, teve alta de 0,64%, a R$ 2,406. Já a Bolsa caiu 0,49%, para os 56.540 pontos.
Durante o dia, investidores especularam sobre um possível movimento conjunto no mercado de câmbio para testar os limites da política de intervenção do BC em relação ao dólar. Essa leitura se baseia em uma “faixa informal” para flutuação da moeda americana, que estaria entre R$ 2,20 e R$ 2,40 e seria determinada pelas ações da autoridade monetária.
DESVALORIZAÇÃO CONTÍNUA
O superintendente executivo de câmbio do banco Santander, Mauricio Auger, discorda dessa interpretação. Para o analista, a evolução do dólar nas últimas semanas não é um processo momentâneo, mas uma tendência contínua baseada na deterioração de fatores macroeconômicos do Brasil, na valorização global da moeda americana e nas incertezas da corrida eleitoral.
Segundo Auger, existe um consenso de mercado a respeito de uma melhora na economia americana, o que implica na valorização do dólar. “E com os fundamentos [do Brasil] que estão aí, eu creio que há um cenário de desvalorização contínua [do real], mas com algumas ‘paradas'”.
As “paradas”, na opinião de Auger, serão determinadas pelo próprio mercado financeiro à medida que a escalada do dólar leva a moeda a alçar novos patamares. O analista crê que o Banco Central pode intervir e causar uma alteração pontual dessa tendência, mas sem conseguir reverter o movimento a longo prazo.
“Parte da ausência do BC [em controlar a alta do dólar] eu credito a isso. Ele está deixando o mercado seguir a tendência. O BC poderia intervir e causar um alívio de um ou dois dias, mas depois o mercado seguiria o seu curso normal”, diz.
MERCADO EXTERNO
A economista do Itaú Unibanco, Julia Gottlieb, concorda que a melhora da economia americana tem influenciado a desvalorização do real. “Já há indicação de que os juros [americanos] vão subir em 2015/2016 e isso pressionou a cotação [do dólar]”, afirma.
Um aumento nos juros dos Estados Unidos deixaria os títulos públicos do país mais atrativos, tornando os países emergentes menos interessantes aos investidores. Esse processo, segundo Gottlieb, tem provocado a depreciação da moeda destes países.
Um segundo fator seria os dados da economia chinesa, que vem demonstrando fraqueza. A desaceleração na China faz cair o preço de commodities, das quais o Brasil é grande exportador, e, portanto, afeta a nossa moeda. “Essa é uma das principais forças que está levando à depreciação do real”, diz Gottlieb.
A analista do Itaú também não acredita em um “teste” dos investidores com o BC. “Não é um movimento só do real. Todas as outras moedas de emergentes perderam valor no último mês, o que reforça nossa visão de que é de fato o cenário externo o maior fator de influência sobre o câmbio”.
Gottlieb também afirma que o BC pode optar por não reforçar o lote diário de contratos de swap para rolagem em suas datas de vencimento, por entender que se trata de um processo global.
O BC tem ofertado novos contratos de rolado as datas de maturidades de negócios já existentes como estratégia para conter a alta do dólar. Nesta terça (23), a autoridade monetária vendeu toda a sua oferta de 4.000 contratos, com vencimento em setembro de 2015. O volume da operação equivale a US$ 197,5 milhões.
O BC também rolou os vencimentos de 6.000 contratos de swap, no valor de US$ 296,2 milhões.
BOLSA
O mercado acionário no Brasil teve dia de grande volatilidade devido a especulações em relação às pesquisas eleitorais divulgadas nesta terça-feira.
As ações das estatais, com destaque para a Petrobras, sofreram com a divulgação da pesquisa da Confederação Nacional do Transporte (CNT) na abertura da Bolsa, que mostrou uma disputa mais acirrada no segundo turno entre Dilma Rousseff (PT) e Marina Silva (PSB).
Contudo, por volta das 10h30, a tendência do Ibovespa se inverteu e o principal índice da Bolsa chegou a subir para os 57.332 pontos. O motivo era a aposta dos investidores de que as pesquisas Ibope e Vox Populi, agendadas para divulgação nesta terça (23), mostrariam um panorama diferente.
Ao final do pregão, contudo, a cautela prevaleceu entre os operadores e a Bolsa caiu 0,49%, pela quinta vez consecutiva, para os 56.540 pontos.
“O investidor permanece sem muita visibilidade a respeito dos desdobramentos no ambiente interno e externo”, avalia Fernando Aldabalde, gestor da Áquilla Asset Management. Nesse contexto, o analista cita a imprevisibilidade das eleições como fator interno e a possível desaceleração da economia chinesa.
Como resultado desses movimentos, as ações ordinárias da Petrobras, que dão direito a voto, cederam 1,75%, cotadas a R$ 19,06. Já as ações preferenciais da petroleira, de maior liquidez, caíram 2,23%, para R$ 20,13.
EFEITO CHINA
A Vale recuperou parte das perdas registradas no pregão anterior, quando suas ações foram afetadas por uma nova queda no preço do minério de ferro e pelas expectativas dos investidores ante uma possível desaceleração da economia chinesa.
Os economistas temiam que o índice de gerentes de compras (PMI, na sigla em inglês) da indústria chinesa sinalizasse uma estagnação. O indicador, no entanto, surpreendeu o mercado e indicou o oposto, com um resultado de 50,5 pontos.
A perspectiva favorável da China animou os investidores e fizeram os papéis da mineradora subirem, apesar de nova queda no preço do minério de ferro, cotado em US$ 79,40 a tonelada.
As ações ordinárias da companhia tiveram alta de 0,98% no pregão, negociadas a R$ 27,55. Já os papéis preferenciais, de maior liquidez, subiram 0,71%, para R$ 24,04.
TELECOMUNICAÇÕES
A principal notícia do setor nesta terça (23) foi a decisão da Oi de não participar do leilão do 4G, realizado pela Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) no próximo dia 30.
A companhia informou em fato relevante que possui um “diversificado portfólio de espectro”, que permite prover serviços de forma competitiva. Em relação à tecnologia de 4G, a Oi possui a faixa de 2,5 GHz para utilização até 2017 e afirma que no futuro poderá também usar a faixa de 1,8 GHz.
Em fato relevante, a companhia disse ainda que “decidiu manter sua estratégia de investimento em projetos estruturantes de rede” para melhorar a qualidade dos serviços prestados e aumentar a cobertura e a capacidade da rede móvel, além da expansão de banda larga e TV paga.
A desistência pode significar uma perda de competitividade para a Oi no médio e longo prazos, mas impulsionou as ações da companhia neste pregão. “A Oi está muito endividada e a não participação no leilão acaba sendo um trigger [gatilho] de curto prazo de melhora”, afirma Aldabalde.
As ações ordinárias da empresa subiram 1,69%, a R$ 1,80. Já as preferenciais ganharam 1,16%, negociadas a R$ 1,73.
A saída de uma das grandes rivais do leilão também beneficiou as ações da TIM, que subiram 1,18%, para R$ 13,70.