O novo time da economia brasileira, que acaba de ser escalado, capitaneado pela Fazenda, com Joaquim Levy, representa o Plano B de Lula e Dilma, que, depois de demonizarem os financistas durante o ciclo eleitoral, optaram pela indicação de Henrique Meireles, por Lula, com a pronta rejeição de Dilma, e de Luiz Carlos Trabuco, do Bradesco, pela própria Presidente, sendo esta surpreendida por uma constrangedora recusa, associada menos a apegos corporativos e mais à ausência de garantias quanto à independência operacional da pasta.
As tarefas do grupo escolhido, por enquanto em regime de transição, repousariam em um conjunto de ações sincronizadas, capaz de restaurar a confiança perdida junto à comunidade doméstica e internacional; evitar o rebaixamento da nota de crédito do País e a provável perda do grau de investimento, selo de qualidade para o acesso aos recursos externos baratos, obtido em 2008; e recomeçar a pavimentar os caminhos para a retomada de uma trajetória de crescimento sustentado, desprovida de pressões inflacionárias.
É consensual o caráter crucial do resgate dos propósitos de convergência dos índices de preços no varejo para o centro da meta (4,5% a.a.), fixada pelo CMN, verdadeira bússola da política monetária, mesmo com a premência de correção dos itens administrados; a geração de superávits fiscais primários próximos de 3% do PIB, indispensável para assegurar a solvência do setor público; e a diminuição dos déficits em conta corrente do balanço de pagamentos, requerida para o abrandamento da vulnerabilidade externa do País.
A prospecção e a identificação desse cenário provável servem para eliminar, na prática, qualquer chance de viabilização da hipótese (ou desejo, talvez crença), aventada por Dilma, antes e depois dos palanques eleitorais, de promover a aplicação de um receituário com apenas algumas correções de rota absolutamente indolores para os atores sociais e preservar plenamente os programas sociais – como seguro desemprego, pensões por morte bastante generosas, abono salarial e aposentadorias precoces por tempo de serviço – e os níveis de renda e emprego.
O cumprimento da agenda restritiva exigirá, em curto prazo, a execução, em regime de sintonia fina, de uma estratégia voltada à compressão da oferta de crédito, notadamente das linhas subsidiadas disponibilizadas por bancos oficiais, à austeridade fiscal, à desindexação dos preços-chave, incluindo tributos, tarifas e salários, ao abrandamento do intervencionismo estatal e à desvalorização da taxa de câmbio, principal engrenagem da máquina de reversão da desindustrialização que assola a nação.
Em paralelo, o êxito da pauta de médio e longo prazo dependerá de um árduo, complexo e maduro esforço de articulação e negociação política entre Executivo e Legislativo, notadamente na tramitação de projetos que comportem a fixação do contemporâneo marco institucional demandado para a devolução das condições de competitividade sistêmica da microeconomia atuante em território nacional, com ênfase para as reformas nos arcabouços tributário, fiscal, financeiro, patrimonial, previdenciário e trabalhista.
Nesse contexto, afiguram-se absolutamente equivocadas a avaliação e a propagação de ideias, realizadas, sobretudo, pelos meios especializados, acerca de um entrosamento liberal-conservador do condomínio – detentor de retaguarda acadêmica e experiência no mercado e no setor público – que comandará a economia brasileira a partir de 2015.
Em vez disso, parece razoável supor o regresso da peleja para a conquista de envergadura política entre os desenvolvimentistas, hospedados nos ministérios do Planejamento (Nelson Barbosa) e da Casa Civil (Aloisio Mercadante), e os mãos de tesoura da Fazenda (Joaquim Levy, com passagens pela gestão de Fernando Henrique Cardoso, ex-secretário do Tesouro Nacional na gestão Pallocci, entre 2003 e 2006, e pupilo de Armínio Fraga, presidente do Banco Central, entre 1999 e 2002) e ortodoxos do Banco Central.
Até porque o futuro titular da pasta do Planejamento não pode ser rotulado como cristão novo da ortodoxia, pois foi um fervoroso defensor do desenvolvimentismo inclusivo e, na melhor das hipóteses, complacente com a nova matriz econômica, exercitada desde agosto de 2011. Não bastasse esse desvio, por certo, a Chefe de Estado não abdicará de continuar desempenhando as funções de economista-chefe do governo federal, mesmo que com algum despojamento do comando imperial e confuso prevalecente no primeiro mandato.
Nessas circunstâncias, não podem ser consideradas desprovidas de fundamento as apreensões quanto à materialização de operações cotidianas contrárias aos interesses dos mercados, e ao conserto dos estragos, e sensíveis às demandas do populismo redistributivista, especialmente em momentos de crise, para desespero da teoria econômica, dos economistas e, mais adiante, da sociedade. Um bem-sucedido ajuste, ainda que pesado, em 2015 é o requisito para um feliz 2016.

Gilmar Mendes Lourenço é economista, diretor-presidente do IPARDES e professor da FAE Centro Universitário