A Universidade de São Paulo decidiu abrir espaço para a implantação de matérias lecionadas exclusivamente em língua estrangeira em alguns cursos de graduação. Estão entre as matérias optativas, que os alunos podem escolher livremente cursar para complementação curricular, não sendo obrigatório que sejam em outro idioma.

Segundo a USP, até agora suas faculdades que desejassem ofertar matérias em língua estrangeira deveriam oferecê-las também em português, o que se tornava inviável na maioria dos casos. Como essas disciplinas são geralmente ministradas por professores visitantes e têm ementas muito específicas, a mera transcrição do conteúdo para nosso idioma não abrangeria toda sua complexidade e contexto, ofertando-se aos alunos apenas uma cópia simplificada que, certamente, não cumpriria seu objetivo de modo eficaz.

A abertura permitirá uma ampliação considerável nos intercâmbios de alunos, professores e conhecimentos entre o nosso e vários outros países, numa prática enriquecedora e indispensável em tempos de internacionalização de culturas, economias e trabalho.

A medida enfrenta alguma oposição dentro da própria universidade, fala-se que reduziria as escolhas dos estudantes que não falam, ou não gostam de outros idiomas. Essa mesma redução de perspectivas já ocorre no caso de cursos de pós-graduação, ou mesmo de graduação realizados no exterior, infelizmente é muito raro que sejam ministrados exclusivamente em português.

O fato de que a língua corrente nas relações internacionais atualmente é o inglês, como já foram o latim e o francês, pode ferir alguns brios, mas é inescapável. Muito provavelmente em poucas décadas a humanidade se comunicará em mandarim nas cúpulas políticas e econômicas, até o final deste século pode ser em espanhol ou em português. Porém, hoje a fluência na língua inglesa é indispensável a quem queira estudar e trabalhar na aldeia global.

Desde a década de 1990, com o avanço do processo de globalização, a internacionalização das instituições de ensino tem sido estimulada, inclusive como forma de agregar qualidade ao ensino superior. Nas atividades de pesquisa essa prática sempre foi um ideal a ser perseguido, como forma de atualização e manutenção do intercâmbio de conhecimento e avanços científicos.

No entanto, a dificuldade trazida pela herança burocrática e fiscalizadora advinda do próprio Estado tem prejudicado esta boa intenção, o excesso de normas e a dependência obrigatória às políticas estatais dificultam o relacionamento com países com procedimentos mais autônomos e menos formalistas. Outra dificuldade é tradicionalmente conhecida como o próprio tamanho do Brasil, a pouca existência de vizinhos com os quais comunicarmo-nos, que produziu uma nação de monoglotas.

Poucos brasileiros tem procurado fluência em outros idiomas, tarefa considerada difícil ou até indesejável; de certa forma como se tivéssemos um complexo de inferioridade, nos impedindo de partilhar conhecimentos dos outros países e com os outros países, sempre causando-lhes certa estranheza, já que não conhecemos suas culturas e modos de viver.

Assim, muitos pretendem que a simples obstrução ao uso de outros idiomas é ação de justiça com quem não teve oportunidade de estuda-los desde cedo, atitude ofensiva, primeiro aos milhares de brasileiros que superaram essa dificuldade e, em seguida, à lógica mais básica que recomenda a melhoria do padrão de ensino desde os primeiros anos escolares para todos, inclusive quanto à língua pátria e às estrangeiras.

O avanço nas áreas científicas, humanas, econômicas, artísticas, depende explicitamente de que pesquisadores, alunos, trabalhadores, entendam, e se façam entender perfeitamente, em relação aos avanços de suas respectivas áreas, existentes ou em desenvolvimento, no mundo. Um bom sistema educacional deve melhorar as habilidades e conhecimentos de todos, olhando o estado da arte da ciência, tecnologia e cidadania mundiais, sob pena de produzir uma aldeia isolada num planeta globalizado.

Wanda Camargo – educadora e assessora da presidência do Complexo de Ensino Superior do Brasil – UniBrasil.