Houve um tempo em que reinava uma rainha muito negra, bela, dominava o antigo território de Sabá, que se denominava o mais poderoso da Arábia Feliz. Incluía a Etiópia e a Arábia e os etíopes a chamavam de Makeda.

Já os árabes preferiam chamar de Balkis. Ou Bilkis. A formosa viveu no século X antes de Cristo e foram os arqueólogos alemães da Universidade de Hamburgo que descobriram as ruínas do palácio da rainha de Sabá, na cidade de Axum, cidade sagrada daquele pobre país africano da atualidade.

Dizem as lendas – e o Velho Testamento – que Makeda ou Balkis ficou sabendo que o rei Salomão era considerado um sábio. Resolveu procura-lo e para tanto arrumou quatro toneladas e meia de ouro, atravessou os desertos da Arábia, cruzando a Etiópia e o Egito, seguindo a costa do mar Vermelho, até alcançar Jerusalém.

Salomão, já que era sábio, também tinha ouvido falar da tal rainha negra, bela e rica, que comandava um povo adorador do Sol. Enviou mensagem com um convite, recebeu a bela em seus aposentos, seduziu a rainha e foi por ela seduzido. Do encontro nasceu Menelik I, o primeiro imperador da Etiópia.

Se você duvida da história, visite o Batistério em Florença, cujos afrescos de Piero della Francesca (1466) reproduzem em dois painéis a visita da rainha de Sabá a Salomão. Bocaccio escreveu em De Mulieribus Claris ( Sobre as Mulheres Famosas), que a rainha da Etiópia , Egito e Arábia tinha um palácio luxuoso em uma ilha – Meroé – em algum ponto próximo do rio Nilo.

ETHIOPIAN AIRLINES NO BRASIL
O presidente dos Estados Unidos, estica a viagem ao Quenia, terra de seu pai e seus ancestrais, para a Etiopia. Você poderá fazer a clássica pergunta do e eu com isso. Mas nós também estamos nos envolvendo cada vez mais com a Etiopia, e nem sabemos muito bem a razão.

Nem descobrimos como um país, o mais pobre do continente africano, tem dinheiro para colocar aeronave moderna voando para o Brasil e muito menos o motivo do aumento de frequências semanais, que passam de três para cinco e, e um futuro próximo, para voos diários.

Até 15 de agosto estará operando no Brasil o B777-200 LR, substituindo o 787 Dreamliner atual, que tem 3 voos por semana de São Paulo (Guarulhos) para Addis Abeba, na Etiópia. Com apenas dois anos no Brasil, a Ethiopian já passa a cinco voos semanais e é representado em nosso país pela Aviareps. Um verdadeiro milagre, já que a Etiópia está em 173º lugar no ranking de desenvolvimento humano da ONU. Mas colocou um B – 787, o mais do que noticiado Dreamliner ( pegou fogo em Heathrow, Inglaterra, e também no Japão, na mesma época) com 3 frequências semanais entre Adis-Abeba (capital da Etiópia), Lomé (Togo), Rio de Janeiro e São Paulo. Cada vôo pode transportar até 270 passageiros, sendo 24 na classe executiva e 246 na econômica..

Quem pretender voar com a Ethiopian vai sair de Adis Abeba para Lomé (4 horas e meia), onde a escala é de uma hora, seguindo depois para o Rio (mais oito horas) e fazendo outro vôo para São Paulo (40 minutos). Indo para Adis Abeba, o vôo sai de São Paulo para Lomé, e de lá, com a devida escala, para a Etiopia. Veja em www.flyethiopian.com

OPERAÇÃO SALOMÃO
Porque Menelik I,- filho do rei Salomão e da rainha de Sabá -, foi para a Etiópia, os judeus, no século 10 antes de Cristo, passaram pelo Egito e seguiram até o atual Sudão, partindo depois para o norte da atual Etiópia. A história é longa e complicada. A verdade é que no início dos anos 90 de nossa era, Israel lançou a Operação Salomão, levando mais de 14 mil judeus etíopes para seu território e mais tarde, a partir de 2010, reconheceu o direito dos fakash mura de emigrar para suas terras. A lista de espera em 2013 ultrapassou 8 mil inscritos. O problema é que o processo para aliyah (migração) demora. Há quem continue esperando pela benesse há mais de vinte anos.

FALASH MURA
Gonder, no norte da Etiópia, é o centro dos falash mura, com escola judaica mantida pelo governo de Israel, onde o currículo tem as nove disciplinas normais da educação no país e outras duas específicas: hebraico e judaísmo (história e doutrina da religião).Em Gonder, a população toda é parte da mítica tribo perdida de Judá, dos judeus que se desgarraram há 3 mil anos da Terra Prometida.

Os falash formaram há 2.500 anos uma comunidade isolada dentro do próprio país. Nos anos 80 começaram os resgates e perto de 30 mil pessoas foram levadas para Jerusalém, uma das maiores operações de remoção da história. Mas outros 70 mil migraram por conta própria. Em 2013 os falash foram levados em grupos de 50 a 100 pessoas. No final de agosto do mesmo ano foi marcado o final da série dos resgatados, encerrando um capítulo de três mil anos. E é aí que começa outro problema, bem maior.

Só que ainda não deu para compreender bem o porquê dos vôos, entre nosso país e o país etíope, muito menos a prometida freqüência semanal, transportando 2.590 passageiros a cada 7 dias. Daqui para lá – de lá para cá. Quem viver, verá.

NAS TERRAS DA RAINHA DE SABA
Quem se aventura a fazer um roteiro pelo país de tão longa história e tanta pobreza, vai encontrar lugares selvagens, uma terra de tradições extremas, castelos de pedra. O início da viagem será Addis Abeba, a terceira capital mais elevada do mundo, situada a mais de 2000 metros sobre o nível do mar. O segundo passo pode ser Bahar Dar, um cidade nas margens do lago Tana, para visitar o monastério de Ura Kidane Mihret, aberto para homens e mulheres, indistintamente ( o que já é uma raridade).

O roteiro turístico segue com uma excursão a Tiss-Issat, para que se possa admirar a cascata do Nilo Azul, por séculos um objetivo de exploradores e aventureiros. Os caminhos levam então para Gonder, capital imperial nos séculos XVII e XVIII. Na cidade de imperadores e dominadores do passado, devem ser visitados o Castelo Fasilidas , a igreja Debre Berhan Selassie e de Kusquam, o mercado na vila de Felasha.

A etapa seguinte será para Lalibela, capital de uma dinastia medieval. Lalibela foi considerada a oitava maravilha do mundo, com suas igrejas monolíticas, escavadas na pedra, mas dentro da terra. Antes do retorno a Addis Abeba,uma parada para ver os misteriosos obeliscos, palácios e o museu de Axum, que segundo se acredita, foi a primeira capital da Rainha de Saba, no décimo século. Por razões climáticas, a melhor época para realizar a aventura é entre setembro e janeiro.

LAGRIMAS DE DEUS
O irmão Nilo Azul vem da Etiópia, onde é chamado de Abbay (o outro Nilo é o branco).

O Nilo na verdade tem dupla natureza, formado pela confluência do Nilo Azul e do Nilo Branco. Mas é o Abbay, o menor lago, o que contribui com a massa de água principal do rio. As primeiras gotas d´água são chamadas de Lagrimas de Deus e caem de um paredão rochoso que domina Gish Abbay, ao sul do lago Tana, fazendo a gênese das águas, antes que se transformem em rio.

Para entender essa dupla natureza do rio, é preciso fazer uma viagem no tempo e no espaço, adicionando também o cristianismo, as profecias sobre os rios de águas sagradas, a dupla natureza de Cristo, tão longamente debatida e ainda indispensável para a compreensão da Etiópia de nossos dias.

Na pobre e belicosa África, a Etiópia é o mais pobre de todos os pobres países. Mas guarda alguns monumentos religiosos que chamam a atenção do mundo. Debre Libanos fica a pouco mais de 100 km ao norte de Addis-Abeba. Seu monastério foi fundado no século XIII pelo santo Tekle Haymamot, nome que em aramaico,- a língua do país -, quer dizer árvore da fé.

Uma trilha na montanha permite chegar até onde se acredita que o santo tenha ficado de pé durante anos e anos. Perto do antigo mosteiro foi construída uma igreja moderna, com vitrais do pintor Afework Tekle. Inaugurada em 1961 pelo imperador Hailé Sélassie I, para celebrar a liberdade finalmente permitida à igreja copta da Etiópia, ao deixar de ser dependente do patriarca de Alexandria (Egito), como o foi durante séculos.

Na parte mais baixa da rota, uma ponte de 400 anos tem pilares apoiados em 2 blocos de basalto, na beira do abismo. Os soldados portugueses da época misturaram casca de ovo de avestruz moída com gema, clara e conchas em pó, para fazer mais resistente a mistura de terra e água da construção. A ponte é a via de passagem constante de pedestres de um povo que ficou conhecido pelas incríveis vitórias em maratonas internacionais. Um povo que é infatigável em suas andanças. Pelos caminhos do país, passam homens, mulheres, crianças, velhos, peregrinos, camponeses.

Para chegar a Motha são necessários cinco dias de marcha a pé. Tempo para aprender o guèze, língua litúrgica e literária da Etiópia. O lago Tana, com 85 km de norte a sul, 65 km de leste a oeste, 3.630 km quadrados e uma profundidade média de 14 metros, é o terceiro maior lago da África, depois do Victoria e do Tanganyika. Seu principal emissário é o Nilo Azul, com as águas das fontes míticas de Gish Abbay, alimentado por cerca de 60 pequenos afluentes.

São as ilhas que guardam tesouros históricos e litúrgicos. O tesouro mais representativo do legendário etíope fica na ilha Tana Qirgos, onde se acredita que a Sagrada Família passou 3 meses e 10 dias, durante a fuga do Egito. Na península de Zeghiè, distante 15 km de Bahar Dar, igrejas e vilas contam a lenda mais bonita: a igreja de Zeghiè Ghiorghis, no norte da península, quando teve sua construção de pedra terminada, um cego quebrou seu bastão em 3 pedaços e plantou cada um deles separadamente na terra. O primeiro floresceu com a planta do café; o segundo deu um limoeiro e o terceiro se transformou no arbusto do lúpulo, para a fermentação da cerveja.

QUEDAS DO NILO AZUL
30 km adiante, ao sul de Bahar Dar, as quedas do Tissisat, do Nilo Azul, são considerados das mais belas do planeta. A melhor hora para apreciar tal paisagem é ao amanhecer, quando aparece um arco-íris junto do sol. Na região os pescadores utilizam pirogas feitas de papiro (tankwa), fabricadas no mesmo padrão do antigo Egito dos faraós. A modernidade, que chega vagarosamente no país mais pobre entre os pobres da África, é uma ameaça que tem a forma de uma barragem gigante, nos planos de governantes, agora que foi iniciado o desvio do Nilo Azul. Tudo em perigo, só para fornecer energia elétrica aos ribeirinhos. Uma espécie do São Francisco lulista. O que faz prever que em breve as tankwa tradicionais serão substituídas por barcos em plástico moldado.

DEBRE DANO
Cada 24 de outubro acontece a peregrinação ao monastério de Debre Dano, nos altos da Abissínia, província do Tigre. Uma montanha de pedra, terminando em um cume liso, forma uma espécie de fortaleza geológica. Debre Dano é o mais antigo monastério da Etiópia e os peregrinos, cerca de 50 mil, chegam todos os anos caminhando durante muitos dias, debaixo de um sol forte e inclemente.. O espetáculo é surrealista e se repete há 15 séculos. A lenda diz que o monastério foi fundado no século VI por Za Mikael, ou Aragawi (O Velho), vindo da Síria. Extasiado com o lugar predestinado à meditação e ao recolhimento, teve a visão de São Miguel. O santo apareceu com uma serpente imensa, que levou Aragawi ao ponto mais alto da montanha. Daí a corda, que ainda hoje é usada, simbolizando a serpente divina.

Uma centena de monges vivem em Debre Damo, depois de fazerem voto de pobreza, obediência e caridade. Passam 364 dias sem terem contato com ninguém. Mas no dia 24 de outubro, data em que Aragawi desapareceu no ano 534, o mundo desaba na vida dos monges. É preciso explicar que eles acreditam que Aragawi não morreu, apenas desapareceu ao olhar humano, enquanto espera a Ressurreição

PARA QUEM VAI
Quem se aventurar a viajar até a Etiópia deve procurar fazê-lo evitando a estação das chuvas. A melhor época é o período das grandes celebrações religiosas, como a Timkat (19 de janeiro), festa da Epifania. Em termos de formalidades, o visto de entrada é fornecido no aeroporto de Addis-Abeba, pago em euros (25) ou em dólares, transformados em moeda local, o birr (Etb ) – 1 euro vale 11 Etb. A vacina contra febre amarela é obrigatória. Algumas operadoras regionais se especializaram no destino, como a Horizons Nômades (www.horizonsnomades.com), que organizaram expedições para pequenos grupos de até 12 pessoas, incluindo uma que chega até as montanhas da Abissínia, berço da civilização da Etiópia