No mundo medieval os fundamentos da fé cristã predominaram por séculos. Dante Alighieri, vivendo nesse tempo, escreveu a sua obra prima Divina Comédia, imaginando o que seria o inferno, o purgatório e o paraíso. O inferno é o sofrimento dentro da terra onde não existem portas, nem cadeados e está sempre aberto. O purgatório seria a alternativa de saída através grande montanha que serviria de escada na escalada para o céu. O paraíso, o topo do purgatório onde as almas arrependidas, pelas virtudes demonstradas, chegariam ao céu. O arrependimento e a confissão de todos os pecados cometidos no mundo temporal garantiria a ascensão confortável do mundo extratemporal.
Os três estágios da magistral obra alighieriana encontram eco na história, recentíssima, da Petrobrás. Foi lançada no Portal do Inferno, onde um mundo subterrâneo invadiu a empresa em verdadeiro crime de lesa pátria praticado contra o patrimônio nacional. Os governos Lula/Dilma são os responsáveis pelo assalto planejado envolvendo políticos, diretores delinquentes e empresários poderosos na mutilação patrimonial da empresa considerada joia da coroa. Foi capturada e esquartejada no mercado da incompetência e da corrupção.
Foi salva das garras de Satanás, antes de atravessar o arco do inferno que proclamava: uma vez dentro deve-se abandonar toda esperança de alcançar o céu. A salvação da Petrobrás deve-se à Operação Lava Jato, pela ação histórica do Ministério Público Federal, da Polícia Federal e da Justiça Federal, no momento em que o mar subterrâneo da corrupção ameaçava transformar-se em imenso oceano. A sua nova administração, através o presidente Aldemir Bendini afirma: Recuperar a Petrobrás é projeto de 5 anos.
Vive agora o caminho de chegar ao purgatório, buscando a escalada difícil e pedregosa da subida na grande montanha objetivando alcançar o paraíso. A travessia na expurgação dos tempos de inferno não será fácil. O seu Plano de Negócios e Gestão 2015-2019, determinou corte dos seus investimentos de US$ 206 bilhões para US$ 130 bilhões como base estrutural na escalada da montanha. Forçando a redução do seu tamanho com a venda de partes do seu ativo no total de US$ 58 bilhões. Hoje a Petrobrás é a empresa mais endividada do mundo no montante de US$ 104 bilhões. Ao nomear incompetentes para a sua direção, o estágio da anomia, caracterizada pela desintegração das normas que regem a conduta empresarial, nocauteou a maior empresa da América Latina.
Felizmente os fundamentos sólidos da empresa resistiram (com enorme prejuízo) aos roubos e rombos. Os seus acionistas minoritários são grandes vítimas. No 2º trimestre de 2015, o lucro operacional foi de R$ 9,48 bilhões, mas o lucro líquido que refletirá nos dividendos foi de R$ 531 milhões. No seu estágio de purgatório, deduziu do resultado R$ 2,8 bilhões para quitar parcelas atrasadas do IOF, questionadas na Justiça. Pagou R$ 1,4 bilhão à Receita Federal de impostos atrasados, igualmente optou pela baixa contábil de ativos de R$ 1,2 bilhão. Resultado: o lucro líquido foi 89% menor em relação ao mesmo período do ano passado. A reorganização administrativa e financeira da empresa passa por essa etapa desagradável, onde os brasileiros são os grandes perdedores.
Adentrar as Portas do Paraíso, no médio e longo prazo, é a etapa que precisa ser planejada e executada com autonomia e independência. Sem subserviência ao irresponsável governo que colocou a empresa nessa tempestade que vem vitimando o desenvolvimento nacional. Contudo, já começa a despontar no horizonte desempenho operacional relativamente positivo. Dona de reservas comprovadas superiores a 12 bilhões de barris, acima da média internacional, deve focar investimentos na produção e elevação da extração de petróleo e gás. O pós-sal e o pré-sal serão o filet mignon na sua lenta recuperação. Felizmente a evolução dessa produção vem ocorrendo em nível ascendente.
Por fim, um fato relevante: a revista norte americana Fortune, especialista em economia, acaba de publicar o ranking mundial das 500 maiores empresas do mundo. A Petrobrás ocupa o 28º lugar, definida como a maior empresa da América Latina e dona de ativos de US$ 300 bilhões, mas ressalta que as suas cicatrizes vão demorar algum tempo para cicratizar. Projetando os números da Fortune em perspectiva de futuro, sem interferência política, empecilhos burocráticos e investimentos irresponsáveis, a empresa poderá se reencontrar com a sua história, alcançando o paraíso e voltando a ser orgulho dos brasileiros. Para que isso ocorra, é fundamental fazer do respeito e cumprimento das Leis Anticorrupção e de Improbidade Administrativa, dogma intocável.

Helio Duque é doutor em Ciências, área econômica, pela Universidade Estadual Paulista (UNESP). Foi Deputado Federal (1978-1991)