*André Giamberardino

O projeto do Estatuto de Controle de Armas de Fogo, que revoga o Estatuto do Desarmamento e flexibiliza restrições para a posse e o porte, não tem nada a ver com a proteção da vida humana.

Sua perspectiva de aprovação deve ser compreendida no contexto de fragilidade institucional do país e do oportunismo de setores do mercado. Não se trata de discutir segurança pública ou direito à autodefesa: trata-se apenas de negócios. Não é à toa que dados oficiais do TSE indicam a doação de valor próximo a R$ 8.201,3 milhões a candidatos e comitês partidários, apenas nas últimas eleições, por parte de grandes empresas do ramo.

É por isso que espanta a facilidade pela qual tantos embarcam com ingenuidade no discurso sedutor segundo o qual todo cidadão de bem, diante da ineficiência do Estado, tem o direito de andar armado para se defender dos bandidos.

Apenas demagogia, incapaz de se sustentar em suas próprias premissas. A distinção entre bandidos e cidadãos de bem não passa de retórica vazia: atiradores em shoppings e escolas, por exemplo, eram todos cidadãos de bem até fazerem o que fizeram. Ou bandido seria quem tem inquéritos policiais ou processos criminais em andamento? Pois uma das alterações propostas derruba a restrição ao porte de armas hoje existente justamente para esses casos! É evidente que o princípio da presunção de inocência deve ser defendido sempre, mas é impossível não se estarrecer com a incoerência entre o discurso e o que o projeto propõe. Esperemos que a presunção de inocência seja lembrada também na hora de atirar contra o próximo a quem defino como ameaça, e não sirva apenas como regra de ouro para vender mais armas e munições.

É comprovado que boa parte dos homicídios decorre de atos impulsivos, sem premeditação, desdobramentos infelizes e trágicos de brigas de bar, no trânsito ou em casa. O debate honesto deverá admitir, nesse sentido, que a redução da disponibilidade e do número de armas de fogo em circulação é diretamente associada à redução das mortes violentas. Se continuam a circular nas mãos de organizações criminosas, o que se há de fazer é combater o tráfico de armas e suas causas, valorizando e buscando um novo papel à polícia dentro da democracia. Transformar as relações sociais em um permanente faroeste em potencial não é a medida mais inteligente, muito menos eficaz.

Legítima defesa não é um direito em abstrato, mas sim uma situação muito específica que autoriza o sujeito a agir com violência no caso de injusta agressão atual ou iminente, e apenas na medida necessária para tanto. Pressupor que devemos sair às ruas prontos para, a qualquer momento, agir em legítima defesa significa dizer que há uma ameaça em cada esquina, em cada vizinho, em cada cidadão: é o sepultamento da cidade, do espaço público, da cidadania, em prol de uma sociedade fundada no medo e em uma filosofia pseudo anarcoliberal de radicalização do individualismo.

A primeira arma aos 21 anos, presente para o filho. Cinquenta balas por mês, até nove armas em casa. Ocorre que não há salvação para a segurança pública sem o resgate do espaço público e de políticas que valorizem a convivência e a coexistência. A banalização da violência significa a vitória desta última, não seu combate. Como canta O Rappa, afinal, também morre quem atira.

* O autor é professor da Universidade Positivo e da UFPR, é defensor público no estado do Paraná.


Direito e política

Criando corvos

Carlos A. Vieira da Costa

Dias atrás o compositor Chico Buarque foi abordado em uma rua do Leblon, bairro onde mora no Rio de Janeiro, por um grupo de jovens que o atacaram verbalmente pelo seu alinhamento com o PT. Na ocasião, dada a repercussão do fato, as redes sociais foram tomadas por mensagens contrária e favoráveis ao artista.

Na verdade, não é de hoje, que Chico é hostilizado por sua propalada e reconhecida simpatia pelo PT, por Lula e mais recentemente por Dilma, numa demonstração clara de intolerância, pois é evidente que não apenas ele, Chico, como milhões de brasileiros anônimos podem ser simpáticos ao Partido dos Trabalhadores e ao seu programa político, como de fato o são, como demonstram as repetidas vitórias eleitorais de candidatos petistas nas eleições presidenciais, estaduais e municipais.

E essas manifestações de intolerância sempre provocaram alguma preocupação, não pelo PT em si, mas sim pela revelação de uma dificuldade crescente e disseminada em uma parcela importante da sociedade de aceitação de valores, pensamentos e atitudes contrárias aos seus.

Mas é evidente que isto, para quem eventualmente está sendo beneficiado, acaba pouco importando, pois de uma forma ou de outra lhe favorece, como no caso da oposição ao governo federal, que durante o ano passado conseguiu se mimetizar na voz das ruas e capitalizar um relativo e momentâneo ganho de popularidade.

Todavia, como sempre acontece nesses casos, o feitiço acaba virando contra o feiticeiro, e ontem o alvo foi FHC, chamado de covarde pelo MBL – Movimento Brasil Livre, após sua manifestação contrária ao pedido de extinção do PT apresentado pelo seu próprio partido, o PSDB. E a conclusão sobre esse episódio é clara e singela: não importa quão boas sejam suas intenções, se você cria corvos acabará um dia com os olhos furados.


A Conduta e o Direito Penal

O que é o lobby e o que é corrupção

*Jônatas Pirkiel

Na instrução processual do processo que trata da Operação Zelotes, a defesa dos acusados se apresentam mais eficientes do que os da Lava Jato, pois defende a tese de que fazer lobby não é crime e que a atividade não tem regulamentação no país. A ponto de afirmar, uma das envolvidas no caso, que: …a ação do Ministério Público é uma agressão e que os lobistas são profissionais altamente especializados, além de que o lobby faz parte da economia.

Há que se diferenciar porém, e esta é uma tarefa processual do Ministério Público Federal, o que é lobby, entendido como: …toda e qualquer prática exercida por pessoas ou empresas para influenciar os espaços decisórios do poder público, atuando tanto no Executivo quanto no Legislativo, ou até mesmo no Judiciário…, também chamado grupo de pressão. Que não se confunde com a corrupção que é um processo muito parecido, com a característica de que, neste caso, é oferecida ou solicitada algum tipo de vantagem. Desta forma, no processo de convencimento ou de pressão sobre as esferas de decisões públicas, verificando-se que uma das partes aceitou promessa de vantagem, solicitou ou recebeu qualquer vantagem, está caracterizado o crime de corrupção, na forma do disposto no artigo 317 e seus parágrafos, do Código Penal: …Solicitar ou receber, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora da função ou antes de assumi-la, mas em razão dela, vantagem indevida, ou aceitar promessa de tal vantagem… em consequência da vantagem ou promessa, o funcionário retarda ou deixa de praticar qualquer ato de ofício ou o pratica infringindo dever funcional.. deixa de praticar ou retarda ato de ofício, com infração de dever funcional, cedendo a pedido ou influência de outrem….

O lobby seria uma maneira de agir, daqueles que intermediam interesses de quem depende de ato da administração, direta ou indireta, logicamente recebendo por isso, para que uma decisão seja tomada desta ou daquela forma, ainda que coincidente com os interesses públicos. O grande problema é que este tipo de pressão sobre as esferas de decisão, no Brasil, vem acompanhado de pedido ou de oferta de alguma vantagem, qualquer que seja ela, para que o ato seja praticado ou a decisão seja tomada.

Nos Estados Unidos a prática é regulamentada: …Há, inclusive, o registro do cargo de lobista, que seria aquele profissional especializado e contratado por empresas, sindicatos ou até pessoas físicas para mediar o lobby. O mérito dessa função seria o fato de o lobista conhecer melhor as articulações e o funcionamento do meio político e público para, assim, direcionar melhor as demandas dos grupos de pressão….

Vemos que a Operação Zelotes vai contribuir para a regulamentação da profissão no país.

*O autor é advogado criminalista (jô[email protected])


Painel

Livro
No próximo dia 28 (quinta-feira), o Delegado de Polícia Judiciária Cláudio Marques Rolin e Silva lançará o livro ‘Operação Sepulcros Caiados I’ às 20h, na sede da Adepol-Pr, em Curitiba.   A obra apresenta ao leitor os bastidores da corrupção jurídica. Informações (41) 9701 4447 e (41) 9112 5147

Mestrado
O Centro Universitário Internacional Uninter está com inscrições abertas, até 5 de fevereiro, para mestrado em Direito. Sob a coordenação de André Peixoto, o curso está estruturado em duas linhas de pesquisa: Teoria e História da Jurisdição e Jurisdição e Processo na Contemporaneidade. 
Inscrições uninter.com/mestrado.

Negócios
Filipe Augusto Küster de Lara, Gestor de Projetos do Küster Machado Advogados Associados, está na Alemanha para uma série de reuniões com membros da IHK Baden-Württemberg – Federação de Indústria e Comércio do estado germânico de Baden-Württemberg. O objetivo da missão empresarial é identificar e promover potenciais oportunidades de negócios que foram mapeadas durante todo o ano de 2015.

Simpósio
De 26 a 28 de maio, Curitiba se torna palco de discussões sobre Liberdade e Direito, que serão travadas no XII Simpósio Nacional de Direito Constitucional. Além de congregar grandes nomes do Direito, o evento reúne relevantes pensadores brasileiros e estrangeiros. Inscrições no site www.abdconst.com.br/simposio.


Direito sumular

Súmula nº 524 do STJ– No tocante à base de cálculo, o ISSQN incide apenas sobre a taxa de agenciamento quando o serviço prestado por sociedade empresária de trabalho temporário for de intermediação, devendo, entretanto, englobar também os valores dos salários e encargos sociais dos trabalhadores por ela contratados nas hipóteses de fornecimento de mão de obra.

 

LIVRO DA SEMANA

A questão central do presente livro, que se busca responder afirmativamente, é: existe um direito moral ao casamento homossexual? Para tanto, analisa-se o tema a partir da Filosofia Moral e Política, o que demonstra a necessidade de se conceituar o casamento antes de verificar se este constitui ou não um direito moral. Parte-se das concepções de casamento formuladas por John Finnis e Ronald Dworkin, analisando-as criticamente, propondo-se, após, uma que seja capaz de tratar o casamento enquanto um conceito interpretativo. Somente então é possível verificar se o casamento corresponde a um direito moral dos homossexuais, o que se faz primordialmente a partir das críticas desenvolvidas por Herbert Hart e Dworkin à posição de Patrick Devlin, e da concepção dworkiniana de igualdade e dignidade humana. Conclui-se que o dever do Estado de tratar os indivíduos com igual respeito e consideração implica reconhecimento do casamento como direito moral dos homossexuais, e que a análise da questão sob a ótica da moralidade pública implica a discussão de seus limites, bem como no debate mais amplo acerca dos direitos das minorias em geral.

COORDENAÇÃO: RONEY RODRIGUES PEREIRA
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