ÁLVARO COSTA E SILVA RIO DE JANEIRO, RJ (FOLHAPRESS) – Apostar no que está dando certo -um desfile tecnicamente perfeito- ou na ousadia da sátira política. Entre as duas opções, Beija-Flor de Nilópolis e Mocidade Independente de Padre Miguel dividiram a preferência do público no primeiro dia de desfiles do Grupo Especial do Rio. Correndo por fora, Grande Rio e Unidos da Tijuca fizeram apresentações corretas, mas sem empolgar o Sambódromo. Sob o comando de Laíla, que chefia um grupo com mais seis carnavalescos, a Beija-Flor conseguiu, nos últimos dez anos, quatro campeonatos -é atual campeã- e dois segundo lugares. Há um consenso: quem quiser ganhar, terá de ganhar da Beija-Flor, que fez um desfile de impressionante harmonia, carros alegóricos espetaculares e animação por parte dos componentes (não das arquibancadas). A escola escolheu um enredo que, incrivelmente, continuava inédito: homenagear o marquês de Sapucaí, que dá nome à avenida onde o Sambódromo foi construído. Com alguns exageros carnavalescos -no título do enredo, o político Cândido José de Araújo Viana (1793-1875) é chamada de “poeta imortal”- contou uma história que vai de Nova Lima (MG), onde nasceu o figurão, à Universidade de Coimbra, em Portugal, passando por sua influência junto a dom Pedro 2º e princesa Isabel. Houve certo abuso na cor dourada, principalmente nos primeiros carros que retrataram o barroco mineiro. No mais, a costumeira competência de uma escola que parece se apresentar pensando sobretudo nas notas dos julgadores. Chamou a atenção o fôlego e a resistência do intérprete Neguinho da Beija-Flor, que está completando 40 anos de carreira e mais parece um menino. Sua passagem, no alto do carro de som, foi ovacionada, a puxar o forte refrão do samba-enredo. Sem vencer desde 1996 e amargando algumas péssimas colocações no período de jejum, a Mocidade resolveu meter o dedo na ferida da crise política. Para conduzir o enredo desenvolvido por Alexandre Louzada, a figura de Dom Quixote. Logo na comissão de frente, um moinho de vento transformou-se em torre de petróleo, em torno da qual dançavam corruptos sem rosto. O abre-alas trouxe um Quixote gigantesco, retratado numa escultura de 18 metros, a maior da noite e dos últimos tempos na Sapucaí. Em seguida, no carro em que apareceu mais uma enorme escultura, esta de Sancho Pança, ratos de colarinho e gravata saíram de dentro de um queijo suíço sobrevoado por moscas, simbolizando os escândalos recentes do país. A cantora Anitta veio sambando no chão, à frente de um carro em forma de tanque, uma referência (meio perdida no contexto) à ditadura militar. A Mocidade não economizou no número de integrantes -quatro mil, o máximo permitido pelo regulamento-, e um dos sete carros teve um problema na dispersão. A evolução, que já apresentava algumas misturas entre as alas, complicou-se ainda mais. A Grande Rio -cujo enredo propôs um passeio por Santos, a cidade do litoral paulista- surpreendeu na comissão de frente, com um Pelé “criança” e o surgimento de uma enorme bola, em cima da qual “outro” Pelé apareceu vestindo a camisa 10 da seleção brasileira -o “original” não pôde desfilar por recomendação médica. Neymar, que disputa o Campeonato Espanhol pelo Barcelona, também não veio. Dando (como sempre) exagerado destaque a celebridades da televisão, a escola de Duque de Caxias fez um desfile seguro, mas burocrático. O tema da Unidos da Tijuca era difícil: a terra. Disfarçado no enredo, uma “homenagem” em busca de patrocínio: a cidade-símbolo escolhida foi Sorriso (MT), considerada a capital nacional da soja. Mas a escola, com a força dos três títulos conquistados (2010, 2012 e 2014), esteve muito bem. Destaque para o carro abre-alas, que mostrou a criação do homem, com os componentes cobertos de barro. A bateria foi outro ponto alto. Como a Beija-Flor, a Tijuca briga com o regulamento embaixo do braço. Desfila sem ousadia: seu negócio é não perder pontos. De volta à elite, a tradicional Estácio de Sá abriu a noite de desfiles confiando na força de São Jorge para permanecer no Grupo Especial, do qual saiu em 2007. Fez uma apresentação bonita, cujo maior mérito foi saber contar a história do santo. Ponto para o carnavalesco Chico Spinoza, que dirigiu a escola no título de 1992. A maior decepção foi a União da Ilha. Pegando carona na Olimpíada (mesmo sem receber verba extra da prefeitura), fez com que os deuses gregos visitassem o Rio. A proposta de fazer humor não funcionou, e o público mais ficou confuso do que se divertiu. Candidata ao rebaixamento. A ver se a velha máxima -“a campeã sempre sai na segunda”- se confirma. Hoje desfilam uma favorita, Salgueiro, e duas escolas de torcidas apaixonadas: Portela e Mangueira.