MARCELO NINIO, ENVIADO ESPECIAL HAVANA, CUBA, E SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Em um dos momentos mais esperados de sua presença em Cuba, o presidente dos EUA, Barack Obama, fez um discurso endereçado à população do país, em que ressaltou uma mensagem de paz, disse que é preciso “abraçar a mudança” e que o objetivo da histórica viagem é “enterrar” a Guerra Fria. “Não devemos temer a mudança, devemos abraçá-la”, disse nesta terça-feira (22), no Grande Teatro de Havana Alicia Alonso, completando com a frase “acredito no povo cubano”, em espanhol.

O ditador Raúl Castro assistia, da plateia, ao discurso de Obama. Em sua fala, Obama relembrou a história de agressões entre Cuba e os Estados Unidos, e disse que a viagem a Havana tinha o objetivo de “enterrar os restos da Guerra Fria nas Américas”. “Por que agora?”, perguntou. “O que os EUA estavam fazendo não estava funcionando. Uma politica da Guera Fria não fazia mais sentido no século 21”, disse o presidente, aplaudido de pé quando voltou a pedir ao Congresso americano o fim do embargo econômico dos EUA a Cuba, em vigor desde 1962.

A reaproximação entre os dois países, iniciada no fim de 2014, corrige uma política fracassada mantida nas últimas décadas pelos EUA, disse o presidente.

 

DIREITOS HUMANOS

Em boa parte de seu discurso, Obama defendeu mudanças e liberdades para a população de Cuba, deixando claro, no entanto, que a mudança deverá partir dos cubanos, e não de uma intervenção americana. “Não posso forçá-los a acreditar, mas devem saber o que penso”, disse, enfileirando uma série de direitos, como liberdade de expressão, de fé, de organização, de manifestação e voto em eleições democráticas. “Nem todos concordam comigo, mas acredito que esses direitos humanos são universais, são direitos dos americanos, dos cubanos e de pessoas de todo o mundo”, disse Obama, antes de emendar que “não é segredo que nossos governos divergem”.

O americano citou o fato de Cuba também criticar os Estados Unidos por uma “longa lista” de problemas na área de direitos humanos, mas afirmou que a possibilidade de se manifestar e de debater permitiu que mudanças ocorressem em seu país e ele acabasse eleito presidente. “O fato de termos debates abertos é o que nos permite melhorar.” Ovacionado após o discurso de cerca de meia hora, Obama deixou o teatro ao som de Guantanamera. Apesar da mensagem amistosa, entremeada de frases em espanhol, o presidente não venceu a desconfiança de muitos presentes. “Ele diz que cabe aos cubanos decidir o futuro de Cuba, a questão é a que cubanos se refere, os trabalhadores, estudantes e camponeses ou os mercenários pagos para criticar o regime”, disse à reportagem enquanto deixava o belo teatro o estudante de física Vicente Díaz, 21.

O discurso aos cubanos abriu o último dia de visita de Obama a Cuba, que também se reunirá com dissidentes e irá a um jogo de beisebol antes de partir em direção à Argentina. É a primeira visita de um presidente americano a Cuba em 88 anos. Nesta segunda (21), Obama prestou homenagem no memorial José Martí e, em seguida, se reuniu com o ditador Raúl Castro.

Após a conversa, os dois participaram de uma entrevista coletiva onde o tema dos direitos humanos na ilha comunista foi um dos pontos centrais. Raúl foi questionado sobre presos políticos e sobre avanços nos direitos humanos -o ditador negou a existência de presos políticos e afirmou que Cuba cumpre com parte dos direitos previstos em instrumentos internacionais, e que nenhum país cumpre todos. Obama, de outro lado, afirmou que os Estados Unidos vão continuar a defender a democracia na ilha e citou que melhorias nos direitos humanos podem acelerar o fim dos embargos americanos contra Cuba.