SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O juiz federal Sergio Moro, responsável pela Operação Lava Jato, criticou o projeto de lei que só permite o fechamento de acordos de delação premiada por acusados que não estejam presos e a proposta legislativa que reduz os efeitos da recente decisão do STF (Supremo Tribunal Federal) que autorizou o Judiciário a determinar a prisão de condenados após julgamentos de segunda instância. Segundo o magistrado, as duas propostas legislativas, ambas do deputado federal Wadih Damous (PT-RJ), podem trazer de volta o “‘status quo’ da impunidade dos poderosos”.

Moro expôs sua contrariedade aos dois projetos de lei em trâmite no Congresso em palestra no 12º Simpósio Brasileiro de Direito Constitucional, organizado pela Academia Brasileira de Direito Constitucional, em Curitiba, na noite de quinta-feira (26), conforme informou o site do jornal “O Estado de S. Paulo” nesta sexta-feira (27).

“Quando eu vejo esse projeto que proíbe a colaboração de quem está preso e também o projeto que visa restabelecer a exigência do trânsito em julgado para execução de penas, coincidência, apresentadas pelo mesmo parlamentar, do mesmo partido político, eu fico me indagando se não estamos vendo alguns sinais de uma tentativa de retorno ao ‘status quo’, aquele ‘status quo’ da impunidade dos poderosos”, disse Moro.

Segundo o juiz, “há uma gama de pessoas poderosas que por muito tempo foram blindadas nas nossas cortes de Justiça. Podemos utilizar todo e qualquer argumento, mas nada muda essa verdade”. Para Moro, a decisão do STF de permitir a execução das penas a partir das decisões de segunda instância, mesmo sem o esgotamento de todos os recursos possíveis aos tribunais superiores, “é um marco no sistema legal, de recuperar o conceito básico de que todos devem ser tratados de forma igual perante a lei, independentemente do poder político e econômico”.

Quanto ao projeto de lei 4372/16, que barra a assinatura de acordos de delação premiada por investigados que estão presos, Moro apontou que “é preciso analisar as duas perspectivas, do investigador e também do acusado e da defesa. Por trás de um projeto como esse, a preocupação não é com a voluntariedade do colaborador, mas sim com as consequências para os eventuais delatados”, disse.

O magistrado ainda propôs uma indagação sobre o tema: “será que nós podemos, de uma maneira consistente, com direito a ampla defesa, negar ao colaborador, por estar preso, o recurso a esse mecanismo de defesa?”. O juiz citou a experiência da operação Mãos Limpas, que combateu a corrupção na Itália. “A partir de determinado ponto, a operação Mãos Limpas passou a perder o apoio da opinião pública e isso propiciou uma reação do sistema político. E essa reação veio principalmente a partir da aprovação de leis que acabaram minando muito a efetividade da Mãos Limpas”, afirmou.