DIOGO BERCITO
MADRI, ESPANHA (FOLHAPRESS) – Caso a organização terrorista Estado Islâmico tenha sido de fato responsável pelo atentado ao aeroporto de Istambul, na terça-feira (28), terá dado assim novos indícios de que hoje se dedica mais a ataques de grande magnitude do que à administração de territórios.
Ao menos 41 pessoas morreram durante o atentado, cuja autoria o governo turco credita ao EI, apesar de não ter havido uma reivindicação formal por parte da milícia radical.
Os atentados de grande porte no exterior eram até recentemente consideradas mais a marca da Al Qaeda do que do EI -e uma das razões para a divisão entre essas organizações terroristas.
Quando o EI declarou seu califado em territórios da Síria e do Iraque, há exatos dois anos, sua liderança divergia da estratégia implementada pela Al Qaeda de primeiro atacar alvos no exterior para, em um futuro distante, consolidar o seu domínio e criar um Estado.
O auto-proclamado califa Abu Bakr al-Baghdadi preferiu pular os meios e ir direto aos fins, dedicando-se à gestão de uma espécie de governo religioso, montado a partir da burocracia local e administrado por seus próprios ministérios e instituições.
Não tardou, no entanto, para que o Estado Islâmico se dedicasse a uma série de ataques externos, como o de Paris em novembro e o de Bruxelas em março. O de Istambul, na terça, pode ser o episódio mais recente dessas operações, que têm a mira nas primeiras páginas dos jornais e no debate público.
SOB PRESSÃO
O EI é em parte forçado a essa estratégia devido às derrotas sofridas na Síria e no Iraque, onde hoje os governos locais e a coalizão internacional dizimam seus militantes e reduzem seu poder.
“Eles estão respondendo à perda de território ao transformar-se em uma organização mais parecida com a Al Qaeda”, diz à reportagem o diplomata americano Alberto Fernandez, que chefiou de 2012 a 2015 o Centro para Comunicações Estratégicas de Contraterrorismo, do Departamento de Estado dos EUA.
“É, de alguma maneira, uma substituição à vitória militar e à expansão do califado. Eles agora se expandem por atos de terrorismo de grande magnitude no exterior”, afirma Fernandez.
Assim como outros especialistas, o analista descarta a tese de que o aeroporto internacional de Istambul tenha sido atacado por ser incapaz de defender-se. “Estive ali há uma semana, e havia segurança pesada”, afirma.
“O problema não é o aeroporto, mas o crescimento de uma extensa rede do EI dentro da Turquia. Isso é parte da amarga consequência de a Turquia ter dado espaço a grupos extremistas para operar na Síria a partir de 2012.”
FRAGILIDADE
Para Karim Hauser, especialista na Casa Árabe, “Istambul viveu uma trégua temporária com o Estado Islâmico devido ao fato de que fechou os olhos para a passagem ilegal de armas e de pessoas por suas fronteiras porosas com a Síria”.
A Casa Árabe, que tem sede em Madri, é um consórcio público espanhol para a promoção das relações com o mundo árabe e muçulmano.
Veja o vídeo
O ataque ao aeroporto de Istambul demonstra, para Hauser, que organizações terroristas são capazes de causar danos nas imediações de aeroportos internacionais, como foi visto em Bruxelas.
“Isso mostra a fragilidade que todo tipo de objetivo estratégico tem diante da determinação dos terroristas.”
Ainda não está clara qual é a motivação por trás desse ataque. Hauser cita, por exemplo, a posição turca no conflito sírio -ao mesmo tempo contra o regime de Bashar al-Assad e contra o EI- e a crise doméstica com alguns movimentos curdos.
O analista também não descarta que haja vínculos com as recentes reaproximações entre Turquia, Israel e Rússia, em um movimento que parece destinado a salvar Istambul do isolamento regional e devolver-lhe sua influência no Oriente Médio.