LÍGIA MESQUITA, ENVIADA ESPECIAL
PARATY, RJ (FOLHAPRESS) – Um debate sobre intolerância com a participação dos colunistas da Folha de S.Paulo Jairo Marques e Alexandre Vidal Porto levou às lágrimas parte da plateia lotada da Casa Folha na manhã desta quinta (30) em Paraty (30), onde acontece a Flip (Festa Literária Internacional de Paraty).
Marques, que acaba de lançar o livro “Malacabado – A História de Um Jornalista sobre Rodas” (Três Estrelas), em que narra algumas das suas lutas como um cadeirante, foi o primeiro a chorar.
“Fui impedido de ir à escola num momento importante da minha vida, na infância. Os olhares são determinantes para uma pessoa com deficiência. Não precisa domesticar o olhar, mas educá-lo”, falou.
Já para o diplomata e escritor Porto, o que os membros da comunidade LGBT buscam é “um olhar”. “A gente não é visto. A gente é ‘invisibilizável’, se é que essa palavra existe. Ao contrários dos deficientes, dos negros, o homossexual decide se vai enfrentar o preconceito, se vai ser respeitado”, declarou Porto, militante do movimento LGBT.
“O olhar que se dirige aos deficientes é de pena. Para os homossexuais, é de superioridade e ódio. Talvez por isso os LGBTs evitem esse olhar, pensam em querer continuar na sombra.”
Falando das dificuldades enfrentadas na infância e adolescência, Marques lembrou que a busca pela cura para a deficiência de um filho leva as famílias a debater pouco “a condição humana”.
“Existe um diabo nesse mundo chamado Estados Unidos e lá mora a cura de tudo”, brincou. “Às vezes a família passa anos em uma busca infinita pelo retorno de uma condição e a vida daquela pessoa com deficiência vai se esvaindo. Esse processo de cura é doloroso.”
No caso dos gays, segundo Porto, o problema é que “não há cura” para a homossexualidade. “Somos todos iguais no sentido que somos todos diferentes. Essa igualdade na diferença é com o que você tem que aprender a lidar.”
“Fui um homofóbico, não gostava de ficar comigo. Até o momento que percebi que estava vivendo a minha vida como um personagem. Até você se gostar e se aceitar, percebe que está gastando seu tempo e vivendo uma vida em vão.”
A palavra enfrentamento foi muito usada pelos colunistas para falar da luta por respeito tanto das pessoas com deficiência quanto dos gays, e do atual momento de intolerância. Porto contou que já foi agredido por ser gay. E Marques disse que hoje quando se alerta um cidadão que ele está ferindo o direito do outro, como por exemplo quando alguém estaciona irregularmente numa vaga para pessoas deficientes, a reação é com violência.
“Sem enfrentamento a gente não vai chegar a lugar nenhum. Minha vida foi toda de enfrentamento”, disse Marques.
E provocou risos e aplausos da plateia ao dizer que um cadeirante precisa passar óleo de peroba na cara para estar em Paraty, cidade que tem ruas de pedra no centro histórico.
“Por toda delicadeza que tenho com o Diego, o bombeirão que me ajudou a subir as escadas. Tenho 41 anos, não sou gay, e estava abraçando o bombeiro. Tem que ter óleo de peroba porque dói ser abraçado por um bombeiro. E não quero desistir de estar nos lugares”, falou.
“Acho que Paraty tinha que ter mais dignidade para as pessoas. Entendo que seja patrimônio histórico. Mas o patrimônio histórico serve à humanidade.”