Amigos que mantém seus passaportes marcados por muitas viagens ao exterior, foram conhecer Buenos Aires e Bariloche, lugares que ainda não faziam parte de seus currículos de turistas. Trouxeram na bagagem um bocado de decepções. Com a impressão de que Bariloche ficou parado no tempo e a capital argentina vive a decadência político-econômica, que assola a região há décadas: lojas fechadas, comércio abandonado, restaurantes que deixaram de existir, calçadas em péssimo estado. Até o hotel, indicado por gente da terra, teve que ser el trocado após a primeira noite de Buenos Aires.

Sem neve, Bariloche de hoje já foi Brasiloche há alguns anos, invadida por ávidos turistas na procura de compras, diversão, ambiente suíço do aprés ski e muita festa. Agora, até comprar uma lembrancinha está difícil. O que é uma pena, porque a viagem aérea é curta, pouco mais de duas horas. Mais perto do que ir de carro até Piçarras.

A Argentina é um país nostálgico, que cultiva mitos: Gardel, Evita, Maradona, Borges. Uma das principais atrações turísticas de Buenos Aires é o cemitério de Recoleta, onde foram enterrados alguns desses mitos, e em cujas imediações se instalaram bares e restaurantes, quando os brasileiros faziam da capital argentina o principal destino de finais de semana, compras, férias, lazer, antes de tomarem o rumo de Miami, em tempos de dólar acessível. Dólar que é a moeda usada na Argentina e que transforma tudo em algo extremamente dispendioso: das compras às refeições. Está mais barato até ir para Paris ou Zurique. E, embora Buenos Aires tenha querido repetir Paris na América do Sul, não guardou praticamente nada da Cidade Luz, a não ser a cópia da arquitetura que substituiu o centro antigo colonial.

Mafalda, o mito argentino mais apreciado no planetaNão estou chorando, dizia Mafalda. Estou lavando lembranças
Política sempre foi o assunto da menina filósofaEm alto e bom som, Mafalda sempre gritou verdades que ninguém tinha coragem de dizer

MAFALDA – UM SÍMBOLO
Um mito cultivado até hoje pelos intelectuais e que ultrapassou fronteiras, nunca existiu em carne e osso. Mafalda foi um símbolo criado pelo cartunista Quino, uma menina irreverente e cheia de verdades, inconformista, que tinha como animal de estimação uma tartaruguinha chamada Democracia, alimentada com folhinhas de alface. Isso, em plena ditadura militar. Tempos em que Mafalda erguia sua voz bem alto, falando o que o povo não podia dizer.

Mafalda nasceu em 1968 e teve como pai o desenhista Quino, apelido de Joaquín Lavado. Enfant terrible, foi criada para ilustrar propaganda de uma marca de eletrodoméstico, mas ganhou autonomia e vida própria ao ser publicada no semanário mais importante do país, a revista Primeira Plana, conquistando o mundo por atacar a Guerra do Vietnã, a Cortina de Ferro, a polícia e sua violência, o capitalismo selvagem.

Uma pesquisa realizada por um grupo de jornalistas para descobrir a casa de Mafalda, levou ao centro de Buenos Aires, porque os desenhos das tirinhas correspondiam aos cenários, e também mostravam o ônibus da linha 86. O bairro apontado foi San Telmo e tudo acontecia no lado norte da Avenida Independência, onde fica a Praça Dorrego, famosa pela feira de antiguidades.

Quem quiser fazer um tour por onde viviam Mafalda, seus pais e o irmão Guille, vai passar pelo número 371 da rua Chile, prédio onde morou Quino nos anos 60, no décimo andar. Pertence ao bairro de Montserrat, o mais antigo da cidade e palco dos principais acontecimentos históricos da capital. O prédio foi retratado nos mínimos detalhes, destacando a maçaneta de bronze no portão de entrada. O carro Citroen usado pela família em viagens de férias, era guardado pelo pai de Mafalda no estacionamento da rua Balcarce, no mesmo quarteirão.

Seguindo Mafalda, já em San Telmo, a banca de jornais de Don Jorge ficou famosa por ser frequentada pela menina filósofa. Na rua Balcarce 774 ficava o antigo armazém Don Manolo, pai de Manolito, amigo de Mafalda, que sonhava em ser Rockfeller enquanto atendia ao caixa. O armazém virou uma banca e manteve uma estátua em madeira de Manolito, como homenagem.

Felipe, Miguelito, Susanita, Manolito e Libertad, amiguinhos de Mafalda, frequentavam a escola na esquina da rua Peru com a Avenida Independência. Felipe, o dentuço que dizia até minhas fraquezas são mais fortes do que eu, era o que tinha mais dificuldade em seguir as aulas.

JORGE LUIS BORGES
Conhecido como o Nobel que nunca foi, escritor e poeta Jorge Luis Borges nasceu em uma casa no centro da cidade, que foi demolida e substituída por outra edificação da rua Tucumán 840, onde depois se instalou a Associação Cristã Feminina. Foi a avó inglesa de Borges – Frances Haslam – quem o educou no idioma inglês, na casa da rua Serrano 2.185, bairro de Palermo, endereço depois mudado para 2.147. Ambas as casas foram demolidas, não acredite no que dizem os guias. Borges descreveu o bairro como centro de malandros , dançarinos de tango e valentões. Hoje a área é conhecida como Palermo Soho, onde se instalaram bares e restaurantes. Borges iniciou carreira de colunista no jornal Crítica. Com a morte do pai, Borges foi procurar emprego na Biblioteca Miguel Cané, no bairro de Boedo, onde escreveu A Biblioteca de Babel. Também mudou de endereço, morando na rua Anchorena entre 1938 e 1943, onde escreveu um de seus contos mais famosos, As Ruínas Ceculares. Crítico do general Perón nos anos 40, Borges perdeu o lugar na biblioteca e foi designado inspetor de galinhas nas feiras. Renunciando ao cargo, passou a viver de conferências e aulas. Com a queda de Perón (1955) foi nomeado diretor da Biblioteca Nacional, que na época funcionava na rua México. Praticamente cego, rodeado por cerca de um milhão de livros e uma de suas frases foi Deus, que com magnífica ironia, me deu ao mesmo tempo os livros e a noite.

Entre 1944 e 1986, Borges morou com a mãe em um apartamento da rua Maipú, quase esquina com Alvear. Perto dali fica a Praça San Martín, onde Borges passeava nos finais de tarde acompanhado de sua governanta. Detalhe: na praça está enterrado o gato de estimação Beppo, personagem de reportagens e fotos. Em 1986 Borges casa com sua ex-aluna Maria Kodama e viaja para Genebra, que considerava sua outra pátria. Morreu meses depois e seu corpo ficou no cemitério de Plainpalais, na Suíça.

MÃE DOS POBRES
Eva Duarte nasceu no vilarejo de Los Toldos, foi criada em Junín e seguiu na juventude ao cantor de tangos Agustín Magaldi, para a capital, trabalhando como modelo e atriz, o que na época também significa prostituição. Mas tudo deixou de ter importância quando conheceu o coronel Juan Domingo Perón no Luna Park. O romance entre a jovem e o Ministro da Guerra e Secretário do Trabalho seguiu para o número 1.567 da rua Posadas, onde em 1945 Perón foi preso pelos militares. Depois de solto, aconteceu o casamento e em 1946 Perón foi eleito presidente, quando o casal passou a morar no Palácio Unzué, esquina da rua Austria com avenida do Libertador. A mansão foi demolida no golpe de 1955. Na região fica o moderno prédio da Biblioteca Nacional. Junto do prédio foi colocada uma estátua de Evita.

Para saber mais sobre a Mãe dos Pobres é preciso visitar o Museo Evita, com objetos pessoais e documentos, em Palermo. Construindo seu mito, Evita criou a Fundação Eva Perón, tinha escritório na Câmara de Vereadores ( hoje funciona a Assembléia Legislativa da Capital Federal), duzentos metros da Casa Rosada, onde Evita fazia seus inflamados discursos. Em 1951 mais de 2 milhões de pessoas ouviram Evita dizer que não seria candidata a vice-presidente. Morreria um ano depois, de câncer. Perón planejou um mausoléu para a amada, que nunca foi erguido. Os militares que derrubaram o presidente em 1955 esconderam o corpo de Evita em um cemitério da Itália. Perón só voltaria a encontra-la nos anos 70, pouco antes de morrer. Na época os dois foram colocados lado a lado na residência presidencial de Olivos. O golpe militar de 1976 voltou a separar o casal. Perón foi enterrado no Cemitério La Chacarita e Evita, dizem, está no Recoleta, atraindo multidões de visitantes.

EL PIBE DE ORO
Maradona, um dos mitos de fins do século 20, ganhou muitos apelidos: Dios, La Mano de Dios, El Diez. Diego Armando Maradona nasceu em 30 de outubro de 1960 em Avellaneda, na Grande Buenos Aires e cresceu no bairro de Villa Fiorito, município de Loma de Zamora, no município de Loma de Zamora, região metropolitana da capital. Na época o bairro era região dos operários. A carreira começou no Cebollitas, divisão infantil do Argentinos Juniors. Mais tarde foi a vez do Boca Juniors, onde a gloria chegou ao estádio La Bombonera. Mas o noticiário depois ficou lotados de notícias de problemas de saúde, drogas, escândalos. O sucesso quase sempre tem o reverso da medalha.

Nostágica, Buenos Aires repetiu o estilo arquitetônico da EuropaCemitério da Recoleta, onde vários mitos se transformaram em atração turística

GARDEL ADOTOU BUENOS AIRES
Uns dizem que Gardel era uruguaio. De Tacuarembó. Outros, que era francês nascido em Toulouse. Mas nada importa, quando se pensa o que, ele, sozinho, fez pela Argentina. O maior cantor de tangos e milongas do planeta. Gardel cresceu no bairro de Abasto, perto do centro de Buenos Aires, criado pela mãe viúva, trabalhando no velho mercado, carregando caixas de legumes e frutas. No centro da cidade o ponto preferido pelo cantor era o Café Tortoni. Frequentava também o Palais de Glace, salão de baile. O local foi transforma do museu.

Viciado em corridas de cavalo, Gardel vivia emoções no Hipódromo de Palermo e até dedicou vários tangos às corridas, a Palermo, aos jóqueis. Tinha até um cavalo de corridas, o Lunático. Gardel morreu em Medelín, em um acidente de avião, foi transportado para Buenos Aires, velado no Luna Park e enterrado no La Chacarita, onde seu mausoléu tem uma estátua do cantor, sempre recebendo flores, especialmente cravos. Gardel, como Presley, chegou a pesar 118 quilos. Embora a maior parte dos restaurantes que frequentava tenham sido fechados ou transformados, dá para experimentar os pratos preferidos do cantor: raviólis recheados com carne de vitela, risoto com fungos e açafrão e o puchero criollo, o típico cozido da Argentina.


DESTAQUES

BRASIL CONTINUA CARO
É mais barato ir para Santiago do Chile, do que para Fortaleza. Ou Punta Cana, no Caribe, do para as praias de Imbituva, Santa Catariana (cerca de 400 quilômetros de Curitiba) terá que optar por dirigir ou ir de ônibus. Caso nenhuma das opções sirvam, por motivos de saúde, vai ter que escolher um táxi. Começando então com uma despesa básica de três mil reais, contando com ida e volta, almoço, lanche. E ainda fica faltando pagar diárias de hotel ou pousada. O pacote de 8 dias, 7 noites para Santiago do Chile inicia em R$ 1.537,00 o de 5 dias e 4 noites no Resort Green Coast Deluxe de Punta Cana tem tarifa a partir de R$ 1.777,00. Para para pensar.

Voando Emirates, incluindo hospedagem e café da manhã, um pacotes de 5 dias para Dubai custa R$ 3.202, pagáveis em dez vezes. Promoção da operadora Abreu. Preferindo Nova York, voando Avianca, a mesma operadora tem pacote de 5 dias, com tour panorâmico, a partir de R$ 4.155,00.