MARCELO NINIO, ENVIADO ESPECIAL FILADÉLFIA, EUA (FOLHAPRESS) – As minorias decidirão a eleição presidencial americana, a questão é se elas se mobilizarão em torno de Hillary Clinton, como fizeram para garantir duas vezes a vitória de Barack Obama nas urnas. Esta foi a mensagem quase unânime das bancadas negra e latina no Congresso dos EUA reunidas nesta segunda (25), na Filadélfia, horas antes da abertura da convenção democrata que irá confirmar Hillary como a candidata do partido.

Segundo Cornell Belcher, um dos principais especialistas do país em pesquisas sobre a população afro-americana, não adianta desperdiçar recursos para ampliar a base de eleitores brancos do Partido Democrata, já que isso não acontece desde que o presidente Lyndon B. Johnson assinou a Lei de Direitos Civis, em 1964.

A mudança demográfica nos EUA, com a diminuição da parcela branca da população, aumenta o peso do que ele chama de “eleitorado emergente”, formado de jovens das minorias. A cada eleição, diz, o eleitorado fica 2% mais negro ou marrom. “O voto das minorias será decisivo. Quando olhamos a coalizão de Obama, vemos que ela foi proporcional ao eleitorado americano emergente, mais jovem e de pele mais escura”, disse Blecher à reportagem: “45% dos eleitores dessa coalizão de Obama eram ‘pessoas de cor.’ Temos que tentar reproduzir essa coalizão, porque não estamos ganhando mais eleitores brancos”.

Pesquisas mostram que Hillary tem amplo apoio entre latinos e negros contra o candidato republicano, Donald Trump. Mais de três em cada quatro latinos são favoráveis à democrata, diz uma pesquisa recente da rede Univision. Entre os afro-americanos, a diferença é ainda mais esmagadora: 80% preferem Hillary, apenas 1% inclina na direção de Trump, segundo pesquisa NBC/Wall Street Journal.

TENSÃO RACIAL

Tradicionalmente, desde os anos 1950, os afro-americanos tendem a votar em grande maioria no Partido Democrata, e essa tendência deve ser reforçada pelo acirramento das tensões raciais no país, após uma sequência de episódios violentos entre negros e a polícia. A preocupação entre os democratas é que muitos deles não votem, achando que a vitória de Hillary está garantida. “Esta eleição vai ser vencida pelas mulheres, latinos e negros”, diz Jorge Quintana, um “superdelegado” democrata, como são conhecidos os membros do partido que não precisam seguir o resultado das prévias presidenciais ao escolher seu candidato presidencial na convenção.

Filho de cubanos, ele acha que o mais importante é não baixar a guarda e mobilizar as minorias para derrotar Trump em novembro. Primeira latina a ocupar um cargo no gabinete presidencial, por indicação de Obama, a ex-secretária do Trabalho, Hilda Solis mostra surpresa por ainda haver eleitores hispânicos que apoiam Trump, depois de o magnata ter prometido deportar os imigrantes ilegais e chamar os mexicanos que entram nos EUA de estupradores e traficantes de drogas. “Minha mãe é nicaraguense e odeia o Trump. Se ele for eleito, ela corre risco”, disse Solis à reportagem. “O objetivo desta convenção é unir os democratas contra a ameaça que é Trump.”

O candidato republicano tem acusado Obama de aprofundar a divisão racial no país, o que líderes democratas consideram uma calúnia. É o caso do renomado ativista de direitos civis Jesse Jackson, que em 1984 tornou-se o primeiro negro a entrar na disputa pela candidatura presidencial por um grande partido. “Quem aumentou a divisão foram os republicanos, com essa guerra civil contra o presidente”, afirmou Jackson. “Obama estendeu a mão a eles, mas eles nunca tiveram interesse.”

O apoio de supremacistas brancos a Trump e o discurso do bilionário contra minorias como latinos e muçulmanos provoca calafrios entre muitos no evento da bancada negra. Delegado democrata pelo Estado da Geórgia, Franklin Delano Williams não pensa muito quando solicitado a imaginar como seria um governo de Donald Trump. “Alemanha, 1932”, diz, lembrando o ano em que o genocida Adolf Hitler chegou ao poder. Entretanto, nem todos votarão em Hillary com gosto. “Rocky” Roque De La Fuente foi pré-candidato na disputa democrata sob o lema “Orgulho Latino”. Empresário da Califórnia, ele está resignado. “Nunca é bom ter que escolher entre o menor dos males”, afirma. “Mas temos que pensar no objetivo maior, que é evitar a vitória de Trump.”