O Belgrano trouxe cerca de 4 mil pessoas à Curitiba para o jogo de ida (as informações do borderô não são públicas no site da Conmebol e nem Coritiba ou FPF confirmaram os números). Isso equivale a 20% do público total daquele jogo, 21 mil pessoas. Ontem, em Córdoba, os argentinos encheram um estádio com capacidade para 57 mil pessoas. É importante frisar: o Belgrano é, numa comparação simplória, um clube como a Ponte Preta. Córdoba tem pouco mais de 1 milhão de habitantes – para os padrões argentinos, a segunda maior do País; porém, no Brasil, similar a Campinas, atrás de inúmeras capitais brasileiras com sua importância econômica inquestionável. O Belgrano jamais venceu um campeonato que não o local de Córdoba – foi vice nacional, sua maior glória. E ainda assim deixou algumas lições aos clubes do Paraná sobre como valorizar sua história e sua torcida.

Falar a linguagem da massa
O Belgrano tem convidado seus torcedores a aderirem ao plano de sócios do clube e ajudarem a construir o novo estádio do clube. Ontem o ingresso custava 200 pesos para não-sócios, sendo que menores associados poderiam pagar 50 pesos. No câmbio oficial, não mais que R$ 42 para o ingresso mais caro. O salário mínimo na Argentina é de 8060,00 pesos, o que dá o valor de 40 ingressos. No Brasil, o mínimo está em R$ 880. O Coritiba cobra R$ 50 enquanto que o Atlético pede R$ 100 nos mais baratos em ambos. Valores desproporcionais ao que o torcedor pode pagar. Não a toa foi apenas com uma promoção que o Coxa conseguiu colocar os 21 mil presentes no Couto, no jogo de ida. Foi também com promoção de ingressos que o Furacão quase encheu sua nova Arena com 36 mil pessoas contra o Criciúma, na Primeira Liga. O Brasil não passa um grande momento econômico, a população tem outras prioridades. Na Argentina, idem. A diferença por lá é que os clubes querem realmente os torcedores como parceiros e trabalham para eles.

A alegria de torcer
Os estádios argentinos são tão violentos – ou mais – que os brasileiros. Ainda ontem a organizada do Independiente deu trabalho à polícia de Santa Catarina no duelo com a Chapecoense. Talvez por exceção do Estádio Libertadores de América, do Independiente, a maioria dos estádios brasileiros são mais modernos e confortáveis que os da Argentina. A mítica Bombonera é um estádio envelhecido. Na Europa, modernos estádios como o Signal Iduna Park, do Borussia Dortmund, são caldeirões para os adversários e confortáveis para a torcida. No Brasil essa combinação parece impossível. Enquanto argentinos e alemães respeitam o jeito da torcida fazer o que sabe fazer de melhor – torcer – aqui se vetam trapos, bandeiras, mensagens e até a cerveja. Imaginem o futebol alemão sem cerveja: impossível. Por aqui, proíbe-se o sinalizador por que ele mata, mas o responsável pela agressão segue solto; proíbe-se a cerveja, exceto quando o patrocinador exige – e vale dizer que o UFC na Baixada tinha cerveja e luta como atrações. Testosterona lá em cima, briga zero. Os dirigentes brasileiros são especialistas em estragar o prazer do torcedor. E depois ainda querem casa cheia. Querem mesmo?

Respeito às tradições
Agora a Conmebol fará mudanças na Libertadores. A maioria positiva, como o calendário anual e a integração com a Copa Sul-Americana, tal qual Champions e Europa League. Já a final em jogo único e lugar pré-estabelecido é um desastre, tanto quanto querer mudar o calendário brasileiro emparelhando com a Europa. Não temos infraestrutura de transporte nem economia forte o suficiente para que massas de torcedores se desloquem para um jogo único como na Champions. Da Itália a Holanda se vai de trem; e do Brasil ao Equador? Além disso, o calendário da Europa segue o verão deles. Acreditam em bons jogos e grandes públicos no sol escaldante de janeiro e no carnaval de fevereiro? É preciso respeitar as regionalidades. Isso significa compreender o público local, mesmo se a relação for como a de consumidor. Mas em Curitiba já não se sabe nem se o maior clássico terá o estádio da Copa à disposição, por que a preferência é por um show musical. Uma distância gigante entre o que se exige e o que se oferece.

Napoleão de Almeida é narrador esportivo e jornalista especializado em gestão