ANA ESTELA DE SOUSA PINTO, ENVIADA ESPECIAL
TÓQUIO, JAPÃO (FOLHAPRESS) – Ao confrontar declarações recentes do presidente filipino, Rodrigo Duterte, o Japão tem como meta estreitar a parceria com os Estados Unidos, afirma o diretor do Instituto de Estudos Asiáticos Contemporâneos da Universidade Temple de Tóquio, Robert Dujarric.
Especializado em geopolítica asiática e em comércio internacional, Dujarric diz que a estratégia do governo japonês é a de deixar claro que “não está contente” com Duterte.
O presidente filipino adotou um recurso errático nos últimos dias, oscilando entre o “modo de ataque” -quando afirma querer “chutar para fora do país” todos os soldados estrangeiros -e o “modo de afago”- em que diz que jamais sonhou em romper a aliança militar com os EUA.
Duterte já vinha incomodando os japoneses por minimizar a decisão da Corte Arbitral de Haia a favor das Filipinas em disputa territorial com os chineses pelas ilhas Spratly, no mar do Sul da China.
Pequim, que tem ocupado territórios e construído ilhas artificiais na região, também vem intensificando sua atividade no mar do Leste da China, segundo o governo japonês.
Os dois países disputam a posse das ilhas Senkaku, situadas a 330 km da costa chinesa e 410 km da região japonesa de Okinawa.
O governo do Japão diz que os chineses se recusam a levar o caso a um árbitro internacional e têm elevado as invasões territoriais por ar e por mar.
Segundo o Ministério das Relações Exteriores japonês, 16 ilhas artificiais (plataformas metálicas) já foram construídas pela China na região do arquipélago em disputa.
Mesmo que não esteja diretamente envolvido nas questões do Sudeste Asiático, interessa ao Japão limitar a influência política e militar dos chineses naquela região.
Há também impactos comerciais, já que passa por ali o petróleo que vem do Oriente Médio.
O governo japonês, porém, não deve criticar nem cobrar publicamente o presidente filipino.
O primeiro-ministro Shinzo Abe terá uma reunião particular com ele nesta quarta (26) e, segundo o Ministério das Relações Exteriores, Tóquio quer “ouvir atentamente as explicações de Duterte”.
“Os japoneses estão cautelosos, não sabem bem como lidar com ele. Aliás, ninguém sabe como lidar com ele”, diz Dujarric.
Na avaliação do professor, a aproximação entre as Filipinas e os chineses não é ameaça concreta ao Japão, já que não há indicações de que Pequim planeje construir bases navais no local.
Mas politicamente é importante que Japão e Estados Unidos reafirmem seu poder.
“Os últimos anos foram bons para aliança nipo-americana. Os EUA retiraram boa parte de suas tropas do Iraque e do Afeganistão e elevaram sua presença militar na região, estreitando laços com a Índia, o Vietnã e Cingapura. O Japão também tem dado pequenos passos para fortalecer sua defesa e colaborar nesse campo com países do Sudeste Asiático”, diz o professor.
Os japoneses também querem consolidar a parceria com os americanos no Tratado Transpacífico, bloco de comércio que, se ratificado pelos Congressos dos países membros, dará ao Japão mais competitividade comercial.
MODO DE ATAQUE
Antes de embarcar para Tóquio, o presidente filipino voltou a provocar os americanos: “Não sou o cachorrinho de estimação dos Estados Unidos”, declarou em discurso.
“Os únicos que podem me tratar como ‘tuta’ (cachorro) são os filipinos. Ponto. Mais ninguém”, disse ele pouco antes da viagem.
À mídia filipina, Duterte se disse irritado com comentários do secretário-assistente de Estado americano Deniel Russell, de que suas declarações estavam deixando os empresários nervosos.
“Podem ir todos embora. Vamos sofrer, mas garanto que nos recuperaremos e vamos sobreviver. Já passamos por momentos muito piores neste planeta.”
Ele voltou a criticar o acordo de cooperação militar que permite aos EUA estabelecerem bases em território filipino.
“Já disse aos americanos que não nos tratem como cachorros. Não falem comigo como se eu fosse um cachorro numa coleira para quem jogam coisas que não posso alcançar. Sou um político, estou acostumado com insultos, mas não insultem meu país. Talvez os ricos e a elite, inclusive a filipina, não goste de mim. Azar. Também não gosto deles”, afirmou o presidente.
MAIS SOLDADOS
Apesar das críticas e ameaças do presidente, 107 tropas americanas vão continuar em solo filipino, segundo o comandante da região oeste de Mindanao (sul do país), Mayoralgo dela Cruz.
Os soldados treinam as forças filipinas em retiradas de emergência e cuidados médicos a militares feridos em operação.
Dela Cruz disse não ter recebido ordem para expulsar as tropas americanas.