Bem Paraná — O que é, de fato, a bruxaria?
Mauricio Melo — Não existe uma única forma de bruxaria. Muita gente acha que é tudo a mesma coisa, mas não é. Cada segmento, cada senda, cada tradição, vai trabalhar de forma diferente, conter idade diferente, espíritos diferentes, com mitologia própria. E a gente ainda tem a questão dos bruxos solitários, que são aquelas pessoas que bebem em várias fontes e criam uma prática única. Então não tem como dizer o que a bruxaria é. Ela é um ofício que rege a transformação da realidade. Qualquer coisa além disso vai de cada grupo, de cada praticante.

BP — Como se dá essa transformação da realidade?
Mauricio — Nós acreditamos, e isso é uma das poucas coisas que é senso comum na bruxaria, que tudo é energia. Então o bruxo, utilizando-se de técnicas, transforma a realidade através da movimentação dessa energia. Não é aquela coisa de pegar e transformar chumbo em ouro falando uma palavrinha mágina, mas é alterar os estados de consciência, porque toda transformação é interna, começa dentro da gente.

BP — O preconceito contra bruxos é ainda algo muito presente na sociedade?
Mauricio — Preconceito é uma coisa que existe na nossa sociedade. Se você não está inserido no que é senso comum, acaba sofrendo preconceito. É com a bruxaria, as religiões de matriz afro… Tudo aquilo que não é senso comum acaba enfrentando preconceito.

BP — Tem muito do imaginário popular, certo?
Mauricio — É assim: Você é bruxo, então mata criancinha, sacrifica animais. De fato muitos bruxos sacrificam animais, mas as pessoas se esquecem que bife não dá em árvore. Sacrifício não é o mesmo que tortura. Muitos grupos praticam o sacrifício animal, mas aquela carne é aproveitada, o animal é limpo, aquilo vira o banquete da celebração também.

BP — Você já passou por isso?
Mauricio — Todo mundo que pratica bruxaria já sofreu preconceito, já ouviu piada, já foi discriminado. O que as pessoas não entendem é: bruxo é alguém que tem o dom de transformar a realidade. Ponto. Bruxo pode ter crença em santos, em anjos, em deuses antigos, em demônios, no que ele quiser. Ou pode não acreditar em absolutamente nada. Dá para ser bruxo e ser ateu? Para mim é estranho, mas dá. Desde que você tenha esse dom e possa transformar a realidade, se você vai trabalhar com o plano espiritual ou não, independe.

BP – Quais dicas daria para quem se interessa pelo assunto, quer conhecer mais?
Mauricio – A dica é: o assunto te interessa? Pesquise, busque pessoas que praticam para conversar sobre. Mas não deixe de pesquisar. Hoje estamos diante de uma nova geração de bruxinhos que tem uma preguiça absurda, então querem tudo mastigado. As pessoas não compram mais livros, elas buscam saber de bruxaria através da opinião de outros bruxos. Mas espera lá, gente. Se eu ler um livro e fizer uma resenha sobre esse livro, vai ser diferente de outro alguém ler um livro e você ler essa resenha, porque acabamos colocando opinião pessoal, a visão do nosso caminho. Bruxaria não é um caminho para gente preguiçosa.

BP — Quais os avanços, as mudanças no meio da bruxaria ao longo dos últimos anos? Já há mais respeito? O paganismo e a bruxaria estão em crescimento no país?
Mauricio — A situação da bruxaria e do paganismo já foi muito pior. Se por um lado temos um grupo de pessoas que nos consideram demoníacos, diabólicos, também temos a bruxaria sendo tratada como uma coisa infantil, ridicularizada. As pessoas não sabem a diferença entre ficção e realidade. Temos os bruxinhos Harry Potter, a pessoa lê e acha que aquilo ali é base para bruxaria, que todos os bruxos ficam brincando com a varinha e tudo mais. Também temos os bruxos que leram Brumas de Avalon, e olha, é um problema, porque por não ser um livro infantil, tem gente que pega a história das Brumas e acha que aquilo ali é reflexo da prática de bruxaria. 

BP — Como é ser bruxo no Brasil?
Maurício — No Brasil, ao mesmo tempo que a gente avança, a gente retrocede, porque o desrespeito é muito grande dentro da comunidade pagã. Você se dá bem com os membros do seu grupo e acaba hostilizando os membros de outros grupos. Tem sempre rixa, tem sempre picuinha acontecendo.