Estrelas Além do Tempo, filme que estreia nesta quinta-feira em Curitiba, narra a história de três mulheres corajosas e excepcionais que tiveram um impacto extraordinário na história. O filme é ambientado nos turbulentos anos 60 nos Estados Unidos, em plena corrida espacial contra a União Soviética. Um ambiente que, na época, não era lugar para mulher. Menos ainda se fosse negra.

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Mesmo assim, Katherine Johnson (Taraji P. Henson), Dorothy Vaughan (Octavia Spencer) e Mary Jackson (Janelle Monáe) fizeram a diferença naqueles tempos machistas e racistas. Elas trabalhavam na Nasa (a agência espacial norte-americana) e eram chamadas de “computadoras de cor”, mas foram decisivas para reverter a corrida espacial, que então era favorável aos soviéticos. Os cálculos matemáticos de Katherine Johnson foram fundamentais para o sucesso da missão de John Glenn, “Friendship 7”, que o tornou o primeiro americano a viajar em torno da Terra em 1962.

O filme, baseado em fatos reais, teve três indicações ao Oscar: melhor filme, melhor atriz coadjuvante (Octavia Spencer) e melhor roteiro adaptado. Mas é Taraji P. Henson quem capitaneia a nau, com um desempenho magnético. A atriz, que concede esta entrevista, chegou a se encontrar com a verdadeira Katherine Johnson, que hoje está com 97 anos e foi condecorada pelo agora ex-presidente norte-americano Barack Obama.

O que surpreendeu e interessou a você nessa história maravilhosa?
Taraji P. Henson — Foi simplesmente incrível descobrir que tantas mulheres estavam envolvidas com enviar pessoas para o espaço, porque quando se olha todas as gravações ou documentários sobre a corrida espacial, nunca se vê mulheres negras, ou qualquer outra mulher, envolvidas ou mencionadas. Assim, fico pensando, o que aconteceu? Simplesmente apagamos tudo isso da história? O que estava acontecendo? Senti que esta história era, historicamente falando, muito importante.

O que você descobriu sobre essa mulher que está interpretando e sua personalidade?
Taraji P. Henson — Ela transmite uma força muito serena. Acredito que a mente de Katherine é tão brilhante que ela parece gravitar acima dos demais de um modo mais elevado, quase numa forma espiritual mais elevada. Como as pessoas iguais a ela são inteligentes, de um certo modo sabem coisas que os seres humanos comuns não sabem (risos). Não que Katherine alguma vez tenha pensado: “Sou melhor do que você”, é apenas que as pessoas brilhantes como ela nascem com um dom especial que os outros não têm.

Como foi se encontrar com Katherine e como se identificou com ela?
Taraji P. Henson — Encontrá-la foi uma oportunidade incrível e o que se sobressaiu para mim é que ela é um excelente membro de equipe e, da mesma forma, também sou muito cooperativa, não sou uma atriz egoísta. Sei que nada sou numa cena sem meu parceiro. Você precisa dos parceiros. Qual é a graça de fazer tudo sozinho? Eu me identifiquei com ela na forma como nunca se toma muito à sério. Quando estávamos juntas, ela me contou uma história interessante. Disse que teve um professor que sempre falava para ela: “Estou cansado de você me fazer perguntas para as quais já sabe a resposta”, e ela respondeu: “Bem, eu sei que essas seis pessoas ao meu redor não sabem as respostas e quero que elas saibam”. Portanto, ela é muito humilde. Enquanto fazia pesquisas e assistia a entrevistas com ela, observei que sempre que se vê ela falando e quando o entrevistador fala sobre Katherine ser excepcional naquilo que alcançou na vida, ela sempre responde dizendo: “Não era apenas eu, éramos todos parte disso, éramos uma equipe”. Penso que é como sinto meu talento. Não acho que seja uma coisa egoísta, é algo compartilhado.

Como você se preparou para o papel?
Taraji P. Henson — Fiz muita pesquisa. É preciso lidar com o período e o que acontecia na época. Havia segregação. Eu praticamente nada sabia sobre segregação, pois cresci em integração. Assim, tive que pesquisar tudo. Depois, tive que conhecer essa mulher e sua mente brilhante. Precisei recolher todas as gravações que pude encontrar e, certamente, foi ótimo que pude ir me encontrar e conversar com ela. E havia, também, uma montanha de leituras a fazer e muita aprendizagem de matemática.

E como isso foi desafiante?
Taraji P. Henson — Pessoalmente, eu não era boa em matemática e não era conectada com ciências. Assim, esse filme me apavorou, pois trata de tudo que me reprovava na escola (risos). Meu coração palpitava com a matemática. Mas, ao mesmo tempo, é por isso que sou atriz, adoro desafios, sou uma atriz treinada e é isso que se faz neste ofício.

Até agora, você representou muitos papéis variados em sua carreira…
Taraji P. Henson  Mas o que está acontecendo na minha carreira recentemente, devido ao sucesso de Empire, o que é ótimo, agora existe uma tendência para as pessoas me verem apenas como Cookie e, com frequência, esquecem de todos os demais personagens que interpretei, como Queenie (em O Curioso Caso De Benjamin Button) e tenho que fazê-los lembrar: Não, não sou apenas a Cookie.

Você pode comentar a dinâmica entre esse trio de mulheres, altamente talentoso, em Estrelas Além do Tempo?
Taraji P. Henson — Katherine é a pensadora silenciosa. Se considerar os relacionamentos das mulheres como uma harmonia tripartite, ela seria a soprano. Ela é o pássaro canoro. Ela é muito tranquila. Fala apenas quando tem alguma coisa a dizer. É preciso lembrar que ela faz muitos cálculos. Enquanto está falando, ela vê números em sua mente, seu cérebro está sempre funcionando, assim não fala muito. E quando fala, comumente tem alguma coisa a dizer (risos)! Mary (Janelle Monáe) é quem assume as conversas. É uma personagem que expressa abertamente suas opiniões. Mas minha personagem é maravilhosa. Há uma ótima dinâmica para eu explorar e será ótimo para os meus fãs me verem passar da Cookie [desembaraçada e durona] em Empire, que não tem medo de abrir a boca, para a Katherine que é mais reservada. Ela é exigente na escolha de quando falar. Embora haja momentos em que ela poderia se fazer ouvir e pudesse dizer “espere um pouco”, não fala muito!”

Estrelas Além do Tempo é muito divertido, mas você acredita que se trata de um filme que pode ter um impacto verdadeiro, retratando mulheres fortes usando o intelecto em trabalhos importantes?
Taraji P. Henson — Acredito que a história seja bonita e importante. É surpreendente que essas mulheres, não apenas as negras, mas mulheres brancas também, foram apagadas da história. Temos visto mulheres interpretando políticas, advogadas e médicas no cinema. Não acredito ter jamais visto uma matemática ou cientista negra, assim pensei: “Uau, que oportunidade para dar a jovens algo mais a que aspirar”. Essas mulheres eram pensadoras com mentes brilhantes. Neste exato momento, com as mídias sociais, as opções para jovens estão se tornando bastante superficiais e limitadas. Assim, penso que determinadas coisas acontecem naturalmente, chegada a hora, quando são necessárias. Penso que neste exato momento este filme seja relevante, não apenas para garotas de cor, para garotas, ponto. Para todos.