Coroando uma semana de máxima tensão entre o governo venezuelano e a Organização dos Estados Americanos – OEA -, afinal removendo o que restava da máscara de estado de direito, o governo de Nicolás Maduro ordenou ao Tribunal Supremo de Justiça – TSJ – venezuelano que afastasse de uma vez por todas de seu caminho a incômoda Assembleia Nacional, o parlamento unitário do país.

O Tribunal Supremo, considerando que o Legislativo estaria em permanente estado de desacato, assumiu suas competências nessa 4ª. Feira, 29 de março de 2017. A decisão reza textualmente: Se advierte que mientras persista la situación de desacato y de invalidez de las actuaciones de la Asamblea Nacional, esta Sala Constitucional garantizará que las competencias parlamentarias sean ejercidas directamente por esta sala o por el órgano que ella disponga para velar por el Estado de Derecho”. A data ficará conhecida como o fim da democracia na Venezuela chavista e bolivariana
Na antevéspera o mesmo TSJ cassou as imunidades parlamentares, passo preliminar para que os deputados sejam processados por supostos delitos civis ou militares e para que em seguida sejam colocados na cadeia junto a diversos outros líderes oposicionistas.
Iniciativas anteriores de diálogo entre governo e oposição fracassaram sistematicamente, como o encabeçado pelo Secretário-Geral da Unasul, o colombiano Ernesto Samper tendo quatro facilitadores – os ex-presidentes da República José Zapatero da Espanha, Leonel Fernandez da República Dominicana, Martín Torrijos do Panamá e um representante do Vaticano. O processo logo se transformou numa conversa entre surdos, não conseguindo nem libertar os presos políticos nem definir data para eleições nacionais. Enquanto o Secretário-Geral da OEA, o uruguaio Luís Almagro, declara que a Venezuela viola todos os artigos da Carta Democrática Interamericana aprovada em 11/9/2001. a chanceler Delcy Rodrigues pede a destituição de Almagro de suas funções. A bancada de oposição, quando ainda podia reunir-se no prédio do Congresso, pediu a aplicação da Carta Democrática, uma atitude qualificada por Nicolás Maduro como traição à pátria, um delito punível com até 30 anos de cárcere.
Muitos se perguntam porque tudo isso ainda não degringolou numa guerra civil. As razões para isso são, em essência, duas: por um lado, como explica o renomado acadêmico Ricardo Hausmann, “a oposição não está preparada para lutar contra uma ditadura”. Por outro lado, o governo está militarizado e, além do Exército, as milícias bolivarianas criadas por Hugo Chávez estão fortemente armadas, o que torna um processo revolucionário repentino um provável e irresponsável suicídio em massa. Outros consideram a possibilidade de uma intervenção de países vizinhos, algo impossível na atualidade. Nos velhos tempos, uma invasão dos Estados Unidos seria uma hipótese óbvia, mas agora a administração Trump, afundada em seus próprios problemas, designou como responsável pelas relações externas a Rex Tillerman, um ex-presidente da Exxon que só ouviu falar da Venezuela pelas disputas que em passado recente sua empresa manteve com o governo de Chávez. Fora disso, os problemas da América Latina são consideradas uma das últimas prioridades na agenda internacional norte-americana, cuja opção é esperar que  tanto o governo de Maduro quanto o povo venezuelano sejam consumidos por suas próprias desgraças.

Vitor Gomes Pinto
Escritor. Analista internacional