ARTUR RODRIGUES
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O promotor da área da saúde Arthur Pinto Filho vinha conversando com a gestão João Doria (PSDB) nos últimos dois meses sobre a formatação do atendimento aos viciados da cracolândia. Ele diz ter sido surpreendido no último domingo (21) com uma operação totalmente diferente do combinado e classificou a ação como uma “tragédia” e “selvageria”.

Pergunta – Como o senhor vê a operação na cracolândia?
Arthur Pinto Filho – Como uma tragédia. Um equívoco do começo ao fim. Uma ação que não tem nenhuma vírgula do que foi tratado com a prefeitura. Discutimos durante dois meses a elaboração do projeto chamado Redenção. Nos encaminharam projeto para uma última discussão nesta quinta-feira (25).

Qual era o plano?
Iniciar o trabalho com equipes de saúde na região, verificando a situação de cada pessoa. Equipes que trabalhariam por setores de quarteirão. Teriam que trabalhar 24 horas por dia, sete dias por semana.

Há sentido na construção de um centro psicossocial só sete dias após a operação?
Nenhum, porque as pessoas se dissolveram pela região. Os grupos de apoio não têm mais contato com as pessoas. Elas estão vagando. A ideia era um projeto civilizatório com começo, meio e fim, que daria resultado a médio prazo.

E em relação aos hotéis?
O que se previa era o seguinte: conforme a prefeitura fosse arrumando outros locais longe da cracolândia, as pessoas sairiam tranquilamente dos hotéis já com locais de moradia. O que estão fazendo é uma selvageria. Eles deram duas horas para as pessoas saírem dos hotéis. Estão derrubando tudo.

A prefeitura diz que não avisou nem sua estrutura para evitar vazamento da ação policial. Como avalia a tática?
É uma tática que não deu certo. Tenho informação que vários órgãos de imprensa sabiam da operação desde sábado à noite. Agora, nós não sabíamos. Nem a Defensoria.

A Promotoria vai investigar a GCM por fazer revistas na área. Agora, os agentes também estão fazendo vistoria para verificar situação de pensões. Eles podem fazer isso?
Poderia ser Defesa Civil ou outra entidade, menos a guarda. A guarda foi criada pela Constituição para cuidar dos próprios municipais. E cuida muito mal. A GCM está sendo desviada de função para coisa que não sabe e não deve fazer.

Que atitudes o Ministério Público vai tomar?
Estamos absolutamente estupefatos. O que está acontecendo agora naquela região é uma coisa absurda. Não tem paralelo você destruir casas com pessoas dentro. Vamos nos reunir agora, porque o que nos parecia uma coisa que poderia até ter um encaminhamento razoável daqui para frente ficou impossível. O que aconteceu ali é uma selvageria que não tem paralelo.

O governador e o prefeito têm discursos dissonantes. Há descompasso também na ação?
Se há descompasso não consigo saber com nitidez. Consigo perceber que a prefeitura não se organizou para essa operação. Não tinha um equipamento necessário aberto para colocar essas pessoas.

O prefeito pode ser responsabilizado por essas medidas?
Não há dúvida nenhuma. A impressão que me dá é que o comando é dele. Portanto, nós vamos instaurar o inquérito para saber quem comandou.

Ele responderia civilmente ou criminalmente?
Por improbidade administrativa [área cível].

E em relação ao Estado, que promoveu a ação policial?
A ação policial não tem avaliação da nossa parte, porque quem está avaliando são os colegas [promotores] criminais. O que a gente avalia é o depois da operação.