DIOGO BERCITO, ENVIADO ESPECIAL MANCHESTER, REINO UNIDO (FOLHAPRESS) – O governo britânico anunciou nesta quarta-feira (24) que investiga uma rede terrorista pelo atentado contra um ginásio que abrigava um show pop em Manchester. O ataque que feriu mais de 60 pessoas e deixou 22 mortos na segunda (22), incluindo uma garota de oito anos, não teria sido planejado somente por Salman Abedi, 22, britânico de origem líbia que se explodiu após um show da americana Ariana Grande. A declaração, feita pelo chefe da polícia regional, Ian Hopkins, coincidiu com uma série de buscas, incluindo mais de uma ostensiva ação militar no centro da cidade. Sete pessoas foram presas desde o atentado, incluindo o irmão mais velho de Abedi. O irmão mais novo e o pai de Abedi foram detidos na Líbia. O irmão mais novo, Hashem, 20, é suspeito de ter planejado ações em Trípoli. “Há prova de que ele está envolvido com [a organização terrorista] Estado Islâmico. Monitoramos ele por mais de um mês e meio”, disse um porta-voz da influente milícia Rada, ligada ao governo. “Ele estava em contato com o irmão e sabia do atentado.” Não foi dada nenhuma explicação para a detenção do pai, que mais cedo havia insistido na inocência do filho. “Nossa família está um pouco confusa, porque ele não seguia essa ideologia, não tinha essas crenças”, o pai dissera à agência de notícias Reuters. “Falei com ele cinco dias antes [do ataque].” A indicação de que possa haver uma célula terrorista com a capacidade de produzir bombas preocupa e explica a decisão de elevar o grau de alerta ao nível máximo (“crítico”), colocando quase mil soldados nas ruas. O governo considera haver risco iminente de ataque. O deslocamento de soldados e policiais para a proteção de lugares públicos levou à necessidade de cancelar a icônica troca da guarda diante do palácio de Buckingham, a residência real. BOMBA E VAZAMENTO Surgiram novos detalhes durante o dia que reforçaram a preocupação. O ministro francês do Interior, Gerard Collomb, disse que Abedi viajou à Líbia e provavelmente à Síria e que tinha “laços comprovados” com a milícia terrorista Estado Islâmico, que reivindicou a ação e que tem bases nos dois países. Por sua vez, a inteligência dos Estados Unidos sugeriu que Abedi não agiu sozinho. O repetido vazamento de informações pelo governo americano levou a ministra britânica do Interior, Amber Rudd, a criticar o país aliado. “A polícia britânica foi clara sobre querer controlar o fluxo de informação para proteger a integridade das operações e o elemento surpresa”, disse. “É irritante haver divulgação por outras fontes. Fui bastante clara com nossos amigos. Isso não deve acontecer outra vez.” O jornal americano “The New York Times” publicou fotografias de perícia esmiuçando os componentes do explosivo, descrito como sofisticado, provavelmente escondido em uma mochila. Abedi teria detonado a bomba com um dispositivo em sua mão esquerda. Os estilhaços perfuraram portas de metal e paredes de concreto. As 22 pessoas que morreram, das quais dez ainda não haviam sido identificadas (leia mais na pág. A 17), estavam quase todas à sua volta no saguão de acesso ao ginásio. Como as imagens parecem ter sido feitas pelas autoridades britânicas, um integrante do governo disse ao diário “Guardian”, sob anonimato, que membros do gabinete da primeira-ministra, Theresa May, estão “furiosos”. O prefeito de Manchester, Andy Burnham, expressou seu descontentamento ao embaixador americano. O mal-estar será um ruído de fundo nesta quinta (25) quando o presidente americano, Donald Trump, e May se reunirem durante uma cúpula da Otan (aliança militar ocidental) em Bruxelas. Os serviços de segurança britânicos enfrentarão outro mal estar: membros da diáspora líbia em Manchester disseram que já tinham alertado as autoridades para o risco da radicalização de jovens em sua comunidade. Com a proximidade das eleições gerais de 8 de junho, a informação pode ser interpretada como descaso do governo com um assunto relevante para o eleitor. As campanhas, interrompidas pelo ataque, serão retomadas. “Manchester tem a maior comunidade de líbios no Reino Unido e sabemos exatamente o que está acontecendo”, disse Salah Suhbi. “Temos avisado há anos.” Outro líbio disse à imprensa local, sem se identificar, que “Manchester é alvo de radicais há bastante tempo”.