A atividade docente nem sempre é fácil, mas suas maiores dificuldades costumam estar atreladas a uma certa expectativa por parte dos alunos de receber auxílio para a compreensão do mundo. São crianças ou jovens que, com razão, tem dificuldade em entender determinados mecanismos sociais, e esperam que seus professores possam orientá-los, ou até mesmo tenham respostas prontas para algumas questões complexas.

Quem anda pelas ruas centrais de qualquer cidade média ou grande constata a enorme quantidade de pessoas em situação de rua, eufemismo para esses pobres deserdados da humanidade. São muitos, e por muitos motivos passaram a habitar calçadas, viadutos, pontes, praças; e muitos órgãos de assistência social públicos e privados prestam um serviço heroico na busca de paliativos às suas condições precárias, grande parte graças ao empenho de abnegados solitários, mas não obtém o resultado esperado em todos os casos devido à resistência dos moradores de rua em se recolher a abrigos mesmo durante as noites mais frias, ou fornecer informações que lhes permitiriam obter bolsa-auxílio ou tratamento médico. Muitas dessas pessoas temem o poder público por já terem sofrido algum tipo de violência por parte de autoridades, e há também os que possuem cachorros e não querem se separar deles, talvez seus únicos amigos e companheiros.

As referências familiares e o estímulo vital são perdidos por alcoolismo, drogadição, doença mental, miséria extrema, desgraças ou perdas que não se consegue superar, e até por problemas sentimentais. Mas no princípio e fim de tudo está a falta de alternativas, opções; ou alguém pode achar que uma pessoa enfrentaria os riscos, o desconforto, a insalubridade, a humilhação de viver naquelas condições se tivesse escolha que lhe fosse aceitável?  

A cidade de São Paulo tenta resolver há quase vinte anos a questão de sua cracolândia, nome jocoso para um dos infernos na Terra. São diversas ruas no centro velho da cidade, área degradada desde os anos 1970 onde se reúnem usuários de crack que terminam morando em casarões abandonados e calçadas. Praticamente todos os últimos prefeitos e governadores propuseram e tentaram soluções para a região, fizeram projetos de reurbanização que se resumiram à demolição de alguns imóveis, tentaram retirar as pessoas (para onde?), combateram o tráfico prendendo traficantes (na verdade mais repassadores de pequenas quantidades de droga), e de positivo ofereceram oportunidades de internação voluntária para desintoxicação.

Agora surgiu como novidade a intensificação de internações compulsórias supostamente para recuperar viciados. Esta política, além de flagrantes ilegalidades já contempladas devidamente pela Justiça, vai contra a opinião de muitos especialistas em drogadição e alcoolismo: o doente só terá chance real de cura se desejar se curar, a internação forçada só poderia ser feita em emergência, quando há perigo concreto de morte ou de ameaça à integridade de outrem. No entanto, outros especialistas afirmam a inexistência de autonomia para este tipo de decisão a partir de determinados estágios da drogadição.

Jovens se sentem perdidos neste emaranhado de possibilidades, sem conseguir perceber qual seria a melhor solução para este tipo de problema, e ao ligar um aparelho de televisão ou mesmo seu celular, estão expostos a opiniões contraditórias, o que poderia ser saudável mas soa extremamente confuso; ao mesmo tempo em que notícias de corrupção e desvios de verbas – incluindo a área de saúde – fazem com que percam as esperanças de solução a curto ou médio prazo. A vida adulta mostra-se uma selva, em que sobrevive o mais forte, o menos sensível, o que menos compartilha.

Professores se questionam sobre a viabilidade das lições de solidariedade. 


Professora Wanda Camargo é assessora da presidência do Complexo de Ensino Superior do Brasil