ALEX SABINO E GUILHERME SETO
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O atacante João Sales, 31, tinha duas propostas para jogar no segundo semestre. Aceitou a do Grêmio Prudente. Era a mais lógica. Ele mora em Presidente Prudente (557 km de São Paulo) e sua mulher trabalha na cidade.
Por causa desta escolha, ele hoje está desempregado.
Uma decisão tomada pela Federação Paulista de Futebol (FPF), com a anuência dos clubes, fez com que ao menos 89 atletas com mais de 23 anos até o final do ano ficassem impossibilitados de disputar a Segunda Divisão do Campeonato Paulista –equivalente à quarta divisão.
O regulamento de 2017 do torneio determina que nenhum atleta acima desse limite de idade pode ser inscrito. Nas temporadas anteriores, era permitida a inscrição de até três atletas nesta faixa etária.
O Sindicato dos Atletas Profissionais no Estado de São Paulo recorreu e conseguiu liminar no final de março que retirou a restrição de idade. Com isso, não era permitido nem mesmo o limite de três vagas para atletas que vigorou até 2016. A federação pediu reconsideração e o regulamento voltou a funcionar como nas últimas edições, com as três vagas para maiores de 23 anos.
Nenhum time, porém, inscreveu atletas com mais de 23 anos. Se fizessem e a decisão na Justiça for favorável à Federação, os clubes poderiam depois perder pontos conquistados em campo.
“Já sabia da liminar do sindicato ao ser contratado pelo Prudente, e o clube imaginava que eu poderia jogar. Mas o sistema da federação não deixava me relacionarem para as partidas, e então não pude jogar. Apesar da decisão da Justiça, eles não querem que jogadores com mais de 23 anos entrem em campo. E que clube que vai peitar a federação?”, diz Camilo, 31, com passagens por Sport e Ponte Preta. Desempregado e treina em Assis (a 434 km de São Paulo) para manter a forma.
Sales faz relato parecido.
“Quando apareceu a possibilidade de jogar no Prudente, fiquei com um pé atrás porque tinha essa história da liminar. Mas me disseram que tudo ia ficar bem. A FPF tem todo o poder. Ela manda em tudo”, afirma.
Apesar da proibição há nove jogadores acima do limite de idade estipulado ligados a clubes da segunda divisão. Eles, porém, não foram inscritos nem entraram em campo no campeonato.
“Estão tirando vagas de trabalhadores só porque eles têm mais de 23 anos. Tem muita gente desempregada. Todo time de garotos precisa de jogadores experientes”, completa. Atualmente, o atacante treina nas dependências do clube que o contratou.
Tanto Camilo como João Sales rescindiram seus contratos em comum acordo com o clube, já que não seriam mais relacionados.
Presidente do Grêmio Prudente, Murilo Salles diz que o sindicato tentou impor a escalação dos jogadores à revelia do clube.
“Ao meu ver, o sindicato que está errado. Nós nem tentamos relacionar os atletas por uma decisão da comissão técnica. A questão do sistema existiu, mas caso realmente os quiséssemos em campo poderíamos ter feito a inscrição manualmente. Achei absurda a ação do sindicato, e não gostei”, diz.
“Como não tem uma decisão final sobre o tema, decidimos não os inscrever para não arriscarmos perder as vagas no futuro, caso a liminar caia. Se fosse como nos anos anteriores, eles estariam no time”, completa.
Ao jornal “O Imparcial”, de Presidente Prudente, Mello disse ter sido informado pelo departamento jurídico da FPF das possíveis consequências.
“Em caso de reversão da sentença, a FPF punirá os clubes que fizerem uso de atletas acima dos 23 anos, mesmo que o uso ocorra no decorrer de tempo em que vigora a determinação da Justiça”.
“A Justiça no Brasil funciona desse jeito: se cai a liminar, tudo volta a ser como era. Se jogasse sob liminar, perderia os pontos”, disse à Folha.
Camilo e Sales afirmam terem sido contratados para serem titulares. O goleiro diz que vinha treinando no time principal e já havia ouvido da comissão técnica que estava escalado para a partida contra o Presidente Prudente. No dia do jogo, 6 de maio, foi avisado do problema com o sistema da FPF e não entrou em campo. O sindicato levou um perito a Prudente na rodada seguinte para comprovar o bloqueio do sistema.
“Houve ação cautelar para constatação de prova e foi feito laudo por um perito atestando que o sistema não permitia que os jogadores fossem adicionados”, diz Guilherme Martorelli, advogado do sindicato.
A Federação afirma que os sistema bloqueou a utilização dos jogadores porque foi programado de acordo com o regulamento inicial da competição. Rinaldo Martorelli, presidente do sindicado, diz que houve pressão sobre os clubes após a decisão judicial.