REINALDO JOSÉ LOPES
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O DNA de um dos bichos mais enigmáticos da pré-história da América do Sul, tão estranho que é preciso compará-lo a uma lhama com tromba para dar uma ideia de sua aparência, foi obtido pela primeira vez por uma equipe internacional de pesquisadores. Resultado da análise: a macrauquênia (Macrauchenia patachonica) é uma prima distinta do grupo de herbívoros que inclui os cavalos, os rinocerontes e as antas.
Com o resultado, a misteriosa fauna de ungulados (mamíferos com casco) que habitou o Brasil e outros países sul-americanos durante dezenas de milhões de anos começa a ficar menos “órfã”.
As macrauquênias (algo como “lhama comprida”) são só um dos exemplos das criaturas esquisitas que se diversificaram por aqui no longo período entre o fim da Era dos Dinossauros e a formação da ponte de terra da atual América Central, quando o nosso pedaço do continente era uma grande ilha.
A falta de conexão com o mundo normalmente estimula o surgimento de faunas peculiares, como se pode ver em ilhas menores. Foi o que também aconteceu na América do Sul — e, como a separação entre a região e o resto do planeta aconteceu quando os grupos de mamíferos estavam apenas começando a se diversificar, saindo da sombra dos dinos, era difícil saber em que galho da árvore genealógica do grupo faria mais sentido encaixar as macrauquênias.
Tal enigma persistia desde os dias do naturalista britânico Charles Darwin, principal arquiteto da teoria da evolução –Darwin foi o primeiro a identificar fósseis da inaudita criatura ao visitar a Patagônia argentina nos anos 1930.
No novo estudo, publicado na revista científica “Nature Communications”, diversas instituições internacionais se uniram no esforço de recolher amostras de ossos de macrauquênia e também de outro ungulado bizarro da antiga América do Sul, o toxodonte (bicho que talvez possa ser comparado a um hipopótamo peludo).
O resultado colocou a criatura como parente dos perissodáctilos, ou ungulados com número ímpar de dedos (como o cavalo, que só tem um). A separação entre os ancestrais dela e os perissodáctilos teria ocorrido há 66 milhões de anos, justamente na época em que os dinossauros sumiram do planeta, calculam os cientistas.