Os beirais de telhados, uma das mais óbvias e antigas soluções para afastar a água da chuva das paredes, funcionaram no Brasil sobretudo como uma solução para o calor tropical. “São elementos de conforto térmico e de proteção da edificação”, diz a engenheira civil Claudia Andrade Oliveira, professora de construção da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP (FAU-USP).

O passar do tempo e o surgimento de novas técnicas construtivas multiplicaram as formas possíveis. Na arquitetura colonial, eles cresceram e tornarem-se grandes varandas, para encolher novamente com o crescimento das cidades e a conseqüente falta de espaço, até desapareceram completamente na arquitetura contemporânea.

“Os arquitetos que adotam o estilo contemporâneo esconderam tudo em nome de uma estética limpa e retilínea. Calhas e cobertura ficam embutidas e escondidas atrás da platibanda”, explica João Roberto Leme Simões, professor de Tecnologia da Construção e Projeto na pós-graduação da FAU-USP.
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Entretanto, há preferência de proprietários por ter beirais nas construções modernas. “A maioria das residências novas é feita com beiral”, diz Simões. “Além de serem uma expressão cultural, sem o beiral há um aumento do gasto com manutenção”, emenda Claudia.

Simões diz que o beiral é uma boa solução para proteger as paredes e dar conforto térmico ao ambiente interno, mas é também um problema estético. “Tem que ter um bom desenho, caso contrário, vira um chapéu mexicano ou aquela beiradinha que quase some. É como chapéu: há um modelo correto para cada um.” Segundo o professor, os mais belos beirais estão na arquitetura japonesa e chinesa.

Manutenção

Cláudia explica que, mesmo com calhas embutidas e funcionando bem, os pingos de chuva batem e escorrem na parede. “Fica aquela parede escorrida, além de acelerar o desgaste do revestimento.” Com o tempo, aparecem fungos e até mesmo algas, quando há pouca insolação ou ventilação no local. Ela faz um alerta para a manutenção, invariavelmente negligenciada não apenas pelos proprietários. “Ninguém pensa nisso na hora de construir ou projetar”, diz.

Na maioria das edificações, segundo a professora, mesmo que o proprietário se disponha a fazer limpeza e inspeções periódicas, terá dificuldade de acesso. “As pessoas se esquecem que alguém terá que subir no telhado para fazer a limpeza das calhas e os beirais, em geral, não suportam o peso da escada. Muitas vezes nem um malabarista consegue subir”, conta.

Acesso

Os equipamentos da vida moderna tornam o local ainda mais vulnerável. “Há uma lista grande de equipamentos que ficam na cobertura, como as antenas de televisão a cabo. Mesmo assim, não há acesso.” Além de criar uma forma de acesso, segundo Simões, um bom projeto deve respeitar a indicação de declividade do telhado, que varia de acordo com o tipo de telha escolhida. “O fabricante da telha é o único que pode definir isso. Toda vez que negligenciei essa recomendação, paguei castigo”, diz. “Pagar castigo” significa ter infiltrações. “Se a inclinação não estiver correta, a água escoa devagar e reflui. Já tive que refazer um telhado inteiro e pagar do meu bolso.”

As telhas francesas, por exemplo, exigem declividade de 35%. “Elas têm um pequeno espaço de sobreposição, de mais ou menos cinco centímetros. Se a inclinação for pequena, vai infiltrar água e nem há necessidade do refluxo. Ela entra por capilaridade”, diz Cláudia. Há uma regra básica: quanto maior a telha, menor será a inclinação.

Calhas mal dimensionadas também causam infiltrações. Simões diz que é preciso ter os dados pluviométricos do local, mas ensina uma fórmula geral, que só vale para a cidade de São Paulo e que serve para dar uma idéia do que será necessário: “Para cada m² de telhado, é necessário 1 cm² de calha.”