Há exatos 75 anos, em 22 de agosto de 1942, o Brasil de Getúlio Vargas, o mesmo que havia proibido a entrada de judeus no país, entrava oficialmente na Segunda Guerra Mundial para combater as forças nazistas e fascistas de Adolf Hitler e Benito Mussolini.

Hoje, passado tanto tempo, as redes sociais dão voz àqueles que propõem discussões cujo script é a dualidade das torcidas de futebol, não é segredo, com experts que brotam de todos os lugares e, com seus achismos muitas vezes catastróficos, espalham ódio e preconceito e incentivam a violência nos canais que fartamente chegam aos computadores e smartphones do cidadão comum.

Ao refletir sobre esta data, olhando para os últimos episódios dessa trama globalizada que envolve terrorismo, racismo, xenofobia e antissemitismo, destaco a marcha dos neonazistas e supremacistas brancos na pequena Charlottesville, nos Estados Unidos, que resultou em três vítimas e mais de 30 feridos, que em uma visão canalha e reducionista, brasileiros tentam se aproveitar do frágil momento político que o país atravessa para classificar Hitler e seu movimento nazista como um movimento de esquerda e capitalizar em favor de nossa novíssima ultra direita.

O assunto não é raso ou de simples compreensão, e passa por questões históricas como a Revolução Francesa, a Revolução Industrial, o que nos leva a considerar correntes que possuem base ideológica como o Iluminismo, o jacobinismo, o socialismo, o positivismo, o marxismo, o fascismo, o nazismo, o comunismo, o sindicalismo revolucionário… Há também de se considerar que a matriz da dualidade esquerda-direita remonta o contexto pré-Revolução Francesa e as posições na Assembleia Nacional daquele país: à direita, clero e nobreza; à esquerda, burguesia, camponeses e trabalhadores urbanos. Nos dias atuais a situação é bem diferente.

Ainda que no início do século XX esquerda e direita pudessem partilhar ideias comuns, o contexto histórico pós-Primeira Guerra, a decomposição da ordem social e da economia liberal, o advento da crise de 1929, o descrédito ao liberalismo, as novas tecnologias que permitiram o nascimento da era das massas fizeram com que houvesse uma ruptura, polarizando o cenário político, empurrando o ódio para os extremos, o que reforça o argumento de que regimes e ideologias situados nas margens opostas do espectro político se avizinham quando a linha política é remontada sobre a esfera.

Hitler e o Nazismo alemão não eram de esquerda. Nem Mussolini e o Fascismo italiano. Nem o Nacionalismo espanhol de Franco. Aqui, a questão não é ideológica e sim político-militar. (…)
É necessário que, antes de tomar o nome do Partido Nacional Socialista dos Trabalhadores Alemães, fundamentalmente antimarxista, como referência para discorrer sobre uma ideia da amplitude das crueldades perpetradas por Nazistas e Fascistas, somente para que dessa referência se possa desacreditar um determinado partido ou obter alguma vitória na guerra dos posts, o indivíduo busque compreender o quão completo é o espectro político, que conheça o Diagrama de Nolan, que entenda o quão sanguinário também foi o Comunismo, e mais, que ao assumir tal postura, tenha consciência de não estar sendo apenas mesquinho e leviano, mas de estar revelando publicamente sua ignorância e falta de conhecimento histórico, sobretudo o fato de que nem sempre existe lógica ou coerência no ambiente político: para vencer o Nazismo, as forças aliadas reuniram, dentre tantos outros, a comunista União Soviética, baluarte da esquerda; os Estados Unidos, potência capitalista e ideal de muitos governos de direita, e o Brasil, com suas fronteiras fechadas aos judeus.

João Paulo Vani é presidente da Academia Brasileira de Escritores, Mestre em Teoria Literária