Uma condição essencial para a liberdade e a felicidade é a possibilidade de ganhar a vida de forma digna. O trabalho ocupa pelo menos um terço de nosso tempo, define muito de nossa identidade social e familiar, garante nossa sobrevivência. Trabalho está ligado diretamente à Educação, que não é treinamento. Mesmo os mais focados cursos profissionalizantes devem ser precedidos de alguns anos de formação geral; e isso ocorre porque cada vez menos o profissional do mundo atual é um apertador de parafuso, tarefas simples e repetitivas serão cada vez mais executadas por máquinas programáveis de vários níveis de complexidade, cabendo ao ser humano fazer aquilo que requer capacidade de pensar e decidir. Mesmo no campo, onde sempre se achou que residia a simplicidade, a tecnologia e a ciência ocupam lugar de destaque, e operadores de máquinas agrícolas e manejadores de animais têm formação cada vez mais sofisticada. Os corajosos empreendedores de um país em crise precisam saber bem mais do que aquilo que se refere exclusivamente ao seu negócio.

E para tudo isto uma boa formação escolar é indispensável, e não se fala apenas de cursos médios ou superiores, a referência inicial é o nível básico. É nos primeiros anos que se adquire os fundamentos sobre os quais se assentará praticamente todo o conhecimento técnico e científico: expressar-se com clareza e entender claramente o que é comunicado, conhecer o desenho do mundo, ter noção de como se formou seu país, ter percepção das leis naturais e, finalmente, mas nem um pouco menos importante, dominar os princípios dos números e suas operações. A ética, a preocupação com a comunidade e o meio ambiente serão consequência natural do convívio com professores e colegas. Esta realidade, embora pareça simples, não é a da maior parte das escolas de ensino fundamental no Brasil, principalmente as públicas. Os motivos são vários, começam na deficiência de formação e desestímulo profissional de muitos professores, passam pelo sucateamento de instalações, laboratórios, bibliotecas, áreas de convívio, prosseguem no nível absurdo de violência, culminam no total desinteresse de alunos oriundos de famílias desestruturadas e que não tiveram ou têm condição sequer de prover-lhes alimentação adequada.

É, no entanto, a realidade das escolas básicas de praticamente todos os países que superaram a linha de pobreza e garantem o mínimo de justiça social a seus povos. Talvez caiba a esses países o enigma circular proposto numa antiga propaganda de biscoitos: têm melhor educação porque deram certo ou deram certo porque têm melhor educação?

A resposta pode estar no caso da Coréia do Sul, que há pouco mais de quarenta anos tinha um PIB per capita inferior ao do Brasil e hoje nos supera amplamente neste quesito, em produção industrial e inovação tecnológica, graças a um grande esforço nacional pela melhoria educacional de sua população. Deu certo porque melhorou o ensino. O sistema educativo da Finlândia é considerado por educadores e pesquisadores um dos melhores do mundo. Nas avaliações do PISA, programa internacional para avaliação de estudantes, adolescentes finlandeses sempre mostram excelente rendimento em matemática, ciências e leitura; quase a totalidade das escolas fundamentais é pública com acesso irrestrito, e a qualidade é boa em todas elas. Professores devem obrigatoriamente ter mestrado, recebem bons salários e têm elevada respeitabilidade, a profissão é das mais desejadas e os processos de seleção são muito rigorosos. Não por coincidência, é um dos países mais estáveis do mundo, com um ótimo sistema protetivo que abrange toda a sociedade. Num momento de propostas insensatas como a militarização da educação brasileira, precisamos clareza de que esta possível melhora não passa por autoritarismo ou palavras de ordem, de direita ou de esquerda. Começa por uma coisa tão simples como fé, nas pessoas, no poder do conhecimento, na honestidade de propósitos; prossegue no trabalho bem feito daqueles que se especializam na área e conhecem o dia-a-dia escolar.