ANA ESTELA DE SOUSA PINTO
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – A governadora de Tóquio,Yuriko Koike, lançou nesta sexta (6) o “Yurinomics”, plataforma econômica alternativa ao “Abenomics” do primeiro-ministro, Shinzo Abe.
Koike, 65, tornou-se a principal rival de Abe, 63, na política nacional, ao criar há duas semanas um novo partido, o Partido da Esperança, para concorrer com o governista Partido Liberal Democrata nas eleições parlamentares previstas para o dia 22.
As eleições foram convocadas por Abe como estratégia para ganhar peso político para seus planos de reformar a Constituição (e conceder mais autonomia militar ao Japão ) e elevar impostos sobre consumo em 2019.
O “Yurinomics” rechaça esse aumento, critica o aperto fiscal do primeiro-ministro e promete uma renda mínima universal para os japoneses, como forma de responder à apreensão crescente de que a automação vai acabar com fatia significativa dos empregos.
O partido também propõe uma saída gradual da atual política de estímulo monetário do Banco do Japão, uma das principais medidas de Abe para tentar revigorar a atividade econômica japonesa.
Apesar de seis quartos seguidos de crescimento, a melhor marca da década, o ritmo de alta do Japão (1,3% anual) é muito inferior ao de rivais asiáticos como China e índia e supera em pouco o 0,9% de quando Abe subiu ao poder.
O afrouxamento monetário elevou os lucros das empresas e as cotações das ações, mas não conseguiu debelar a deflação.
Dentre as propostas de Koike estão tributar reservas líquidas de empresas, uma resposta à insatisfação contra a passividade das companhias, que têm apenas acumulado caixa em vez de distribuir dividendos, reinvestir ou elevar os salários.
Só a Toyota, a companhia mais valiosa da Bolsa japonesa e a maior empregadora, acumula em caixa 17,6 trilhões de ienes (o equivalente a R$ 494 bilhões), segundo a agência Bloomberg.
A quantia supera o valor de mercado de qualquer outra empresa japonesa listada em Bolsa.
“Precisamos fazer mudanças que fiquem marcadas no coração do Japão, tanto na política econômica quanto na sociedade, para voltar a crescer de forma sustentada”, disse a governadora no lançamento das medidas.
Do ponto de vista social, o programa defende igualdade de representação política para mulheres e fim da discriminação contra LGBTs (lésbicas, gays, bissexuais e transgêneros).
Hábil no manejo de imagens e símbolos, a governadora de Tóquio não só deu seu prenome como apelido ao programa econômico como lançou uma plataforma de “12 Zeros”:
1. Zero energia nuclear
2. Zero impunidade para corporações
3. Zero doação empresarial para políticos
4. Zero fila nas creches
5. Zero fumo passivo
6. Zero superlotação em transporte coletivo
7. Zero abandono de animais domésticos
8. Zero desperdício de comida
9. Zero violação de direitos trabalhistas
10. Zero idosos ou deficientes sem acesso ao transporte público
11. Zero fios e cabos aéreos, pendurados em postes
12. Zero febre do feno (rinite alérgica)
RENDA MÍNIMA PARA TODOS
Koike afirmou que a criação de uma renda mínima universal não seria feita no curto prazo. Aproveitou para usar mais um jogo de palavras: “Precisamos começar a pensar em como passar de AI (artificial intelligente, inteligência artificial) para BI (basic income, renda mínima)”.
O partido de Koike também defende uma reforma da Constituição japonesa, a primeira em seus 70 anos de existência, mas promete ir além do artigo 9, que limita as Forças Armadas do país a funções defensivas.
Entre os pontos que poderiam entrar numa reforma estão o banimento da energia nuclear, uma das plataformas do PE.
Apesar de seu destaque no novo partido, Koike afirmou que não vai renunciar ao governo de Tóquio para concorrer à Câmara Baixa (o equivalente à Câmara dos Deputados), órgão que elege dentre seus membros o primeiro-ministro, chefe do Executivo no Japão.
A governadora de Tóquio já impôs duas derrotas ao primeiro-ministro Abe em menos de dois anos: ex-filiada ao PLD, desafiou o próprio partido para concorrer ao governo e se elegeu com quase 3 milhões de votos em julho de 2016 e, um ano depois, seu partido local venceu o do premiê para a Assembleia Legislativa.
Ela não deve repetir a façanha desta vez -pesquisas recentes, no entanto, apontam para uma vitória de Abe nas eleições do dia 2-;, mas em menos de uma semana seu partido já fez estragos no plano do primeiro-ministro de sair fortalecido do pleito.
OS RISCOS PARA ABE
Em uma semana, da governadora atraiu dezenas de políticos (incluindo governistas do PLD), anunciou que lançará ao menos 50 candidatos e já aparecia com quase 15% das intenções de voto (contra 24% do PLD) em pesquisa feita no sábado (30) e no domingo (1º) pelo instituto Kyodo.
Mesmo sem ser candidata -ao menos até agora-, Koike é a favorita para ser primeira-ministra para 33% dos entrevistados, contra 45,9% que preferem Abe.
Analistas internacionais têm comparado a situação de Abe à da primeira-ministra britânica, Theresa May, que também convocou eleições para reforçar seu poder no Parlamento.
Um revés reduziu as cadeiras de seu partido, obrigando-a a novas coligações.
Abe tem hoje a maioria de 60% dos deputados, necessária para reformar a Constituição, e esperava ampliá-la num momento em que seu então principal opositor, o Partido Democrata, se esfacelava entre conflitos internos e denúncias de corrupção.
O movimento de Koike e seu talento midiático podem acabar com a pretensão do premiê. A imprensa local especula até que uma perda significativa de postos da coligação LDP e Komeito pode apear Abe do cargo de primeiro-ministro, que ele ocupa desde 2012.
A campanha política começa na próxima terça (10).