ARTUR RODRIGUES E GIBA BERGAMIM JR.
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – “Este é um produto abençoado”, disse o prefeito de São Paulo, João Doria (PSDB), no último dia (8) antes de degustar o “granulado alimentar” —espécie de biscoito feito à base de alimentos que estão perto da data de validade.
Anunciado pelo tucano como uma medida que visa erradicar a fome em São Paulo e no país com apoio da Igreja Católica, o produto foi alvo de uma série de críticas de nutricionistas e chefes de cozinha, ganhando inclusive o apelido de “ração humana”.

Abaixo, entenda o que é esse granulado alimentar, a polêmica em torno dele e os argumentos contra e a favor da iniciativa.
1. O que é a farinata?
Uma espécie de farinha feita a partir de vários alimentos (frutas e legumes, por exemplo) que estão perto da validade e seriam incinerados por produtores e supermercados. O objetivo é combater a desnutrição.
2. O que é o granulado alimentar?
Um produto feito à base da farinata. Essa farinha também pode ser adicionada a bolos e pães ou ser usada como ingrediente para “reforçar” sopas, já que teria boa quantidade de carboidratos e proteínas.
3. Qual foi o projeto anunciado por Doria?
Trata-se de um programa para combater o desperdício de alimentos e erradicar a fome. O texto, do vereador Gilberto Natalini (PV), foi apresentado ainda na gestão de Fernando Haddad (PT) e aprovado em setembro na Câmara Municipal.
4. O granulado faz parte do projeto municipal aprovado?
Não especificamente. O produto foi mostrado pelo prefeito apenas como exemplo durante evento para sanção da lei. Doria o apresentou dentro de uma embalagem com uma imagem de Nossa Senhora e o chamou de “abençoado”.
5. Por que Doria apresentou o granulado se ele não faz parte do projeto?
A Plataforma Sinergia, organização sem fins lucrativos que fabrica o granulado, estava no evento e entregou uma amostra a Doria. Sem saber detalhes do produto, o prefeito fez um vídeo o promovendo.
6. Como seria a distribuição desse produto pela prefeitura?
Segundo a gestão, o granulado seria distribuído sem custos, a partir de outubro, por entidades cadastradas —como igrejas, templos e sociedade civil— e pela própria prefeitura. Ainda não se sabe, porém, a quem e a quantas pessoas seria destinado. Nem a própria empresa tem dimensão do quanto poderia produzir. A secretária de Direitos Humanos de Doria, Eloísa Arruda, disse que haverá uma reunião em breve para definir um plano de ação.
7. Quem forneceria a matéria-prima usada no granulado?
Os alimentos próximos do vencimento seriam doados por produtores, redes de supermercados e até pessoas físicas.
8. Qual é a relação do produto com a Igreja Católica?
A Arquidiocese de São Paulo apoia o uso da farinata no combate à fome desde 2013, quando o dom Odilo Scherer a recomendou ao Papa Francisco. À reportagem, porém, o arcebispo afirmou que pode ter havido equívoco na forma de apresentação do produto pela gestão Doria e lamentou uma possível interrupção do projeto por questões políticas.
9. Por que alguns nutricionistas e chefes de cozinha são contra a ideia?
Eles argumentam que a alimentação é um ritual que inclui saborear o alimento, preferencialmente in natura. Outra preocupação é o fato de a farinha ser feita à base de produtos próximos do vencimento. Nutricionistas que criaram o produto afirmam que ele pode ser um complemento de combate à fome em situação emergencial.
10. Produtos semelhantes à farinata já foram usados antes no país para o combate à fome?
Sim. Zilda Arns, médica sanitarista e fundadora da Pastoral da Criança, defendia um produto chamado multimistura, composto por farelo de arroz, trigo e pó de sementes. Apesar de ter sido divulgada como modelo nos anos 70 e 80, hoje a prática é desaconselhada pelos conselhos de nutrição por causa dos riscos relacionados a higiene e toxicidade.