PAULO SALDAÑA
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Reivindicações de amplas mudanças na Base Nacional Comum Curricular podem exigir uma extensa revisão no texto atual do documento. Essa possibilidade não estava no plano do MEC (Ministério da Educação).
O CNE (Conselho Nacional de Educação) divulgou na noite de terça-feira (7) uma lista de 234 documentos com críticas e propostas ao texto.
Uma terceira versão da base -que é considerada pelo governo federal como a definitiva- está desde abril em discussão no conselho, que realizou uma série de audiências públicas e esteve aberto a colaborações.
A maioria dos textos foi recebida durante as audiências. Também há o registro de 283 manifestações orais.
A base vai prever o que escolas públicas e privadas devem ensinar a cada ano da educação básica (da creche ao ensino médio). A norma vai orientar escolas na elaboração de currículos e a produção de livros didáticos.
Após o MEC apresentar uma primeira versão da base, em setembro de 2015, houve uma consulta pública na internet. O MEC sistematizou as indicações e recebeu críticas de especialistas para construir a segunda e terceira versões. Desta última, foi retirada e adiada a parte do ensino médio.
Sob o governo Michel Temer, o MEC tem mantido um discurso de que a análise no âmbito do CNE deve ser limitada, e que cabe ao órgão emitir um parecer e uma resolução para implementação.
Mas os textos recebidos pelo CNE e a análise de alguns conselheiros apontam falhas e lacunas a serem resolvidas. Nas áreas de língua portuguesa, de tecnologia e ciências, por exemplo, residem críticas consideráveis. “O que se vê é que o documento precisa de modificações. Mas na área de alfabetização as críticas são maiores”, diz Antonio Augusto Batista, coordenador de pesquisas do Cenpec (Centro de Estudos e Pesquisas em Educação, Cultura e Ação Comunitária).
A organização é uma das que encaminharam propostas. O teor de todos os documentos mostra que mais da metade traz críticas. Cerca de 20% dos arquivos têm como mote a volta de conteúdo de ensino religioso, que foi suprimido na terceira versão.
Já é consenso no CNE a reintegração do ensino religioso, considerando a previsão de uma abordagem sociológica e plural do assunto.
GÊNERO
Outros 8% dos documentos falam da questão de gênero. O MEC retirou da terceira versão, de última hora, menções às expressões “identidade de gênero” e “orientação sexual”. O termo aparecia, por exemplo, em capítulo que fala sobre a importância da base para que o país tenha “equidade” no ensino.
Entre os documentos recebidos sobre o tema, há, por exemplo, moções de Câmaras municipais que se limitam a “repudiar” o que chamam de “ideologia de gênero”. Entidades educacionais, por sua vez, criticam a ausência.
No documento encaminhado pela Anec (Associação Nacional de Educação Católica do Brasil), a supressão do tema é criticada. “Não entendemos que a base tenha um cunho de ‘ideologia de gênero’. Queremos garantir uma educação inclusiva, que prevê também a discussão do gênero”, diz Roberta Guedes, gerente da Câmara de Educação Básica da Anec, e que defende alterações consideráveis no documento.
O MEC não respondeu sobre seu posicionamento acerca da discussão de gênero. Argumentou que o objetivo é ter um documento que reflita “necessidades, interesses, diferenças e pluralidade do panorama educacional brasileiro”. “O MEC mantém interlocução permanente e produtiva com o CNE”, diz em nota, ressaltando que confia na conclusão neste ano.
O presidente da comissão que analisa a base no CNE, Cesar Callegari, diz esperar a incorporação das contribuições. “Não estamos conduzindo um documento interno, mas para a sociedade”.