Opinião, Expressão, Agressão, são rimas, mas estão longe de serem a mesma coisa. O direito de ter opiniões e expressá-las é tão básico que sequer precisaria ser definido na legislação, mas é importante que seja; agressão não é um direito, é uma contravenção ou crime tipificados claramente em Lei. Vivemos um tempo de ofendidos, e aqueles conceitos parecem estar cada vez mais imbricados: alguém acredita em alguma coisa e expressa essa crença em redes sociais, e até aí está exercendo plenamente seu direito e liberdade, mas o passo seguinte pode ser atacar violentamente quem não concorda com sua opinião, ou dizê-la de modo ofensivo. Pode-se ser a favor ou contra as cotas sociais ou raciais – opinião – pode-se manifestar esta opinião – expressão –; desacatar, xingar, ofender, desqualificar quem não pensa da mesma maneira é agressão, e isto é crime. O debate de ideias fica reduzido a uma guerra de torcidas em que não há possibilidade de consenso, apenas a vitória interessa; e será certamente a proverbial vitória de Pirro, em que não há sobre que triunfar pois tudo terá sido destruído.

Aparentemente perdemos o senso de proporção, e já não conversamos, guerreamos. O respeito pelo Outro, a inclusão, tornaram-se meros discursos aplicáveis apenas àqueles que pensam da mesma forma, professam a mesma ideologia, funcionam como espelho do ego.

Nas escolas, locais que auxiliam a modelagem, mas também refletem nossa sociedade, e onde violências de todos os tipos explodem atualmente, estes conceitos tem se misturado de forma perigosa, com juízos sobre pessoas ou acontecimentos sendo esgrimidos contra colegas, como se fossem verdades lacradas e sem a menor possibilidade de contra argumentação.

O problema está em que opiniões são construídas ao sabor de fake news e completa ausência de empatia: crianças e jovens as expressam mais como forma de demarcar posições, de marcar território, de adquirir uma personalidade, principalmente em oposição aos demais, como forma de ataque aos que são diferentes de alguma forma. Suas ideias, estruturadas principalmente em redes sociais, quase sempre mera aglomeração de outros jovens que pensam exatamente igual, consultam as mesmas fontes, estão sujeitos às mesmas influências, giram no entorno de poucas evidências, mas muito voluntarismo. Assim, perderam a capacidade de dissenso, de ouvir outros modos de encarar os mesmos fatos.

Não temos mais opiniões, temos armas a serem utilizadas contra os demais; quando Sigmund Freud caracterizou a agressividade como parte integrante do eu, de sua formação e da sua relação com seus objetos, afirmou também que esta pode ser sublimada, recalcada, não precisa ser exteriorizada, pois temos o recurso da palavra, da chamada mediação simbólica. A violência seria sintoma, decorrente do mau funcionamento da ordem constituída, que impede a realização plena do indivíduo, sua felicidade. Para Freud, em todo ser humano coexistem hostilidade e ódio, manifestando-se sob diferentes formas: olhar, ironia, insulto, chiste obsceno e até ódio declarado.

Em nossa sociedade aparentemente está havendo uma falha fundamental da família na função de conter os impulsos agressivos, que se manifestam inclusive nas instituições escolares, também incapazes de contê-los. No entanto, são estes os espaços de reconhecimento da legítima autoridade e exercício da solidariedade.

Este vácuo na formação abre espaço para a degradação de uma tendência moderada e normal de egocentrismo em violência e delinquência, extremas em muitos casos. É preciso lembrar que, antes de sermos a pessoa que comete transgressões e agressões, somos a pessoa que perdeu, ou jamais teve, um lugar no mundo.

Wanda Camargo – educadora e assessora da presidência do Complexo de Ensino Superior do Brasil – UniBrasil.