Escrito especialmente para o Dramamix, das Satyrianas 2014, ‘Até que deus é um ventilador de teto’ segue a mesma vertente dramatúrgica onde realidade e imaginação se mesclam, sem distinção, nas ações das personagens. Para a montagem, os Parlapatões convidaram o diretor Pedro Granato em busca de uma linguagem intensa e contemporânea, permitindo que a poesia do texto dialogue com o público e, com isso, trazendo uma plasticidade que revela os incômodos e prisões cotidianas de uma pessoa de classe média de uma grande cidade.

‘Até que deus é um ventilador de teto’ conta a história de um jornalista de 50 anos que trabalha como redator e, de dentro de seu carro, imagina que um velho senhor, vendedor de balas no semáforo, possa ser um deus que desceu à Terra para observar a vida dos homens. O jornalista é sequestrado e tem como vigia o tal velho, que já conhecia da rua. Suas reflexões revelam a relação deste homem com o mundo, com sua mulher e seu filho.

Pedro Granato acredita que esse homem, cansado de tantas relações virtuais e do esvaziamento de sentido da vida, é catapultado para reflexões que misturam o risco da vida real com delírios de sua cabeça. Por isso, sua encenação coloca o homem cercado em um pequeno aquário que representa todos os espaços em que vive confinado: sua mesa no escritório, seu carro com ar condicionado e sua lanchonete de costume.

Já o misterioso velho, em sua tarefa de vigiar e aguardar ordens, desmistifica o tempo todo aquilo que o homem imagina, trazendo um componente de humor negro à relação entre eles. O velho revela uma total descrença com a vida e coloca o homem em pânico diante de sua falta de esperança.

O espetáculo trata com humor a crise de um homem que se vê tomado por compromissos e, vivendo uma situação limite de perigo, pode colocar a sua vida em perspectiva. A encenação foge do descritivo e abre espaço para o poder simbólico das imagens. O texto gira em torno de como o medo integra a vida dos brasileiros que, cercados pela violência e todo o imaginário que ela carrega, mudam suas relações, gerando preconceitos e dificultando aproximações mais humanas.

A direção de Pedro Granato pretende trazer, por meio de efeitos de luz e sonoplastia que interagem com a cena, uma interpretação que coloque os Parlapatões, Hugo Possolo e Raul Barretto, no limiar do drama e do humor negro que o texto aponta, flertando com uma desconstrução, que foge do naturalismo, para revelar a alma das duas personagens. Já a iluminação de Aline Santini trabalha o isolamento da personagem em contradição com o imenso espaço que vai encontrar em seu cativeiro, buscando também jogar com os signos urbanos que nos sufocam diariamente, com os matizes de cores e a pulsação de um semáforo.

A trilha de Raul Teixeira busca trabalhar os respiros da cena, como uma pontuação minimalista das emoções que transitam e das imagens criadas pelo homem que faz reflexões diante de seu desespero. A cenografia de Diego Dac e Saulo Santos, do Ateliê Russo, deixa o homem ficar preso a uma cadeira, um aquário que é, ao mesmo tempo, seu carro, escritório e cativeiro, por onde o velho circula com liberdade e poder. Uma leitura crua sobre a maneira como a classe média lida com seu medo da violência urbana.

Se equilibrando entre emoção, humor, absurdo e reflexão, o grupo Parlapatões dá mais um passo em sua pesquisa artística para trazer dilemas dos dias de hoje ao palco. O texto inédito de Hugo Possolo encontra na encenação de Pedro Granato espaços para serem completados pela plateia com imagens fortes e sintéticas. Um espetáculo onde até deus pode ser um ventilador de teto.

Serviço
Teatro: Até que Deus é um Ventilador de Teto
Onde: Caixa Cultural Curitiba. Rua Conselheiro Laurindo, 280 – Curitiba (PR).
Quando: de hoje a26 de novembro de 2017 (quinta a domingo). Quinta a sábado, às 20h; domingo, às 19h.
Quanto: vendas a partir de 18 de novembro (sábado). R$ 10 e R$ 5 (meia – conforme legislação e correntistas que pagarem com cartão de débito CAIXA). A compra pode ser feita com o cartão vale-cultura.
Bilheteria: (41) 2118-5111 (De terça a sábado, das 12h às 20h. Domingo, das 16h às 19h.)