Um tiro no pé. Esta é a melhor definição para explicar a tardia decisão do presidente da República, Michel Temer (PMDB), de decretar intervenção na Segurança Pública do Estado do Rio de Janeiro – aprovada pelo Congresso Nacional. Ela é necessária, mas tem interesses obscuros. A situação da segurança dos cariocas é caótica e não é de hoje. A intervenção não mudará o cenário de caos na capital carioca. Pode ser que arrefeça, mas a solução está na contramão do que estamos e iremos assistir.
As imagens dantescas de arrastões pelos pontos turísticos na capital carioca foram potencializadas devido ao período de Carnaval. A ideia do Palácio do Planalto era essa: fazer você pensar que Temer esta preocupado com a segurança no Rio de Janeiro. Ele não esta.

Em outubro do ano passado, o ministro da Justiça, Torquato Jardim, declarou textualmente: Todo mundo sabe que o comando da PM no Rio é acertado com deputado estadual e o crime organizado. Comandantes de batalhão são sócios do crime organizado no Rio. No dia do anúncio da intervenção, as autoridades disseram qual seria a prioridade dos militares: combater a corrupção dentro das polícias. Isso não é novidade para os cariocas.

Mas por que decretar esta ingerência na pasta da segurança só agora? A resposta passa por alguns fatores: todos políticos e nada técnicos. A intervenção é midiática. Apesar da boa vontade e preparo das forças armadas, o combate ao crime organizado não é o metiê dos militares. Eles são ótimos e eficazes para cumprir missão, mas quem dará as ordens? Qual o conhecimento que o Exército tem sobre a realidade do tráfico de drogas, da atuação das milícias, nos morros do Rio de Janeiro? É como colocar policiais militares e civis para guarnecer as fronteiras ou enviá-los em missão de paz para outro país, por exemplo.

A forma como a intervenção foi feita e divulgada promoveu uma cisão entre as polícias e o Exército. Esqueça qualquer trabalho conjunto – isso só se dará no discurso, na prática o clima é dos piores. Não haverá cooperação. O que os militares vão tentar fazer é uma ocupação territorial e tão somente isso. Não haverá tempo hábil para desenvolver um trabalho de inteligência – este sim, capaz de conter o crime organizado.

O que vamos assistir serão ações midiáticas, com pouca ou quase nenhuma ineficiência. Tanques e homens bem armados serão posicionados nas favelas, mas não vão evitar o tráfico de drogas. Centenas e centenas de pessoas passarão por revistas, mas o chefe do tráfico continuará dando as cartas do alto do morro. A milícia continuará cobrando o gatonet e o gás. E não estranhe se a polícia trombar com os militares. A corrupção policial, instalada no seio da segurança carioca, também ficará a margem dos interventores – sob a batuta do general Walter Braga Netto. Drogas e fuzis serão, certamente, apreendidos, alguns serão presos, mas nada disso vai impedir a ação do crime organizado.

Isso tudo sem falar nas consequências políticas. A intervenção suspendeu de imediato a tramitação da reforma da Previdência e, por incrível que pareça, pegou o governo Temer de surpresa. O staff do presidente acreditava ser possível votar a reforma dando um intervalo na intervenção. A saída para o governo agora é apostar num projeto Frankstein que altera alguns pontos da Previdência.

Em outras palavras, a intervenção foi um tiro no pé de Temer porque não vai resolver o caos da violência no Rio de Janeiro e impede o que era uma das poucas bandeiras do seu governo, a reforma da Previdência.

 

* Esta coluna é publicada todas as quartas-feiras