O combate à corrupção e a busca pela transparência são missões de diversas instituições na sociedade – Justiça, Ministério Púbico, imprensa, ouvidorias dos órgãos públicos, organizações não governamentais – que não demanda santos nem heróis, mas exige comprometimento dos Poderes da República. Além disso, são tarefas que não serão resolvidas nem facilitadas pela politização do Judiciário, que tende a promover insegurança jurídica. Essas foram algumas das conclusões da 8ª edição do seminário Caminhos Contra a Corrupção, realizado pelo Estadão em parceria com o Instituto Não Aceito Corrupção, realizado entre os dias 29 e 30 de novembro.

Logo na abertura do evento, o procurador de Justiça Roberto Livianu, presidente do Instituto Não Aceito Corrupção, sugeriu que a população desconfie de “quem se apresenta com capas de super-herói, dizendo que vai acabar com a corrupção com bala de prata” – ou seja, uma solução simples e única. “São impostores”, frisou. Ele acentuou que é preciso estratégia e planejamento para combater a corrupção.

Para o jurista Miguel Reale, a aceitação desses personagens heroicos ou santificados acaba por conduzir a uma politização do processo. “Tenho receio de que a sociedade seja contaminada por visão santificada da luta contra a corrupção”, afirmou. Foi o que aconteceu, de acordo com ele, na vigência da Operação Lava Jato, em que o ex-juiz Sérgio Moro (hoje senador pelo União Brasil-PR) foi “endeusado” por muitos. “Ele é das pessoas mais nocivas para a luta contra a corrupção, porque ele comprometeu, para sua ambição política, a luta contra a corrupção, sendo juiz. Isso contamina muito”, afirmou.

Instituições

Em vez de heróis ou santos, o País precisa de instituições fortes e confiáveis. “É preciso fortalecer as instituições”, sublinhou Livianu. “Não se pode minar a transparência.” O procurador defende liberdade para o trabalho dos jornalistas, como uma parte essencial da transparência. “Não pode haver discricionariedade excessiva que acaba minando as instituições”, completou.

Livianu também questionou a continuidade das iniciativas contra a corrupção. “Qual foi a engrenagem colocada no lugar da Lava Jato? Não há. Há um hiato”, disse. O procurador citou Jair Bolsonaro e o fato de o ex-presidente ter “desativado a Lava Jato”, e também criticou o governo Lula, ressaltando que o presidente “não está comprometido” com o tema.

A politização das ações também foi lembrada pela professora Laura Barros, ex-controladora-geral da Prefeitura de São Paulo. Ao falar da Proposta de Emenda à Constituição que pretende restringir poderes de ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), ela ressaltou que o debate no Congresso envolve uma questão simbólica. Em sua avaliação, quando o Legislativo se pretende disciplinador do dia a dia do Judiciário, “passa uma mensagem muito ruim. Mostra instabilidade, falta de coesão entre poderes e gera angústia na população, no mercado, nos investidores”, avalia.

Na avaliação de Reale Jr., o problema da PEC não é o conteúdo, mas a forma. “Foi um acinte desnecessário, um jogo político do presidente do Senado para cativar senadores bolsonaristas e mineiros bolsonaristas”, afirmou.

Mandato

As discussões do seminário também tocaram outra PEC, a que dispõe sobre mandatos para os ministros do Supremo. Guilherme Casarões, cientista político da FGV, considera que a sociedade ainda não tem informações suficientes para determinar se a redução do mandato vitalício para um prazo de 10 anos, por exemplo, resolverá os problemas do dia a dia do STF.

“A pergunta que quase nunca é feita é: vai melhorar?”, questionou. Na mesma linha, Maria Tereza Sadek, cientista política da USP e da FGV, perguntou: “É razoável que alguém fique no Supremo durante 30 anos? Não tenho uma resposta. Não seria mais produtivo que houvesse uma renovação? Toda e qualquer instituição pode ser aprimorada”.

Ex-ministro da Educação, Renato Janine Ribeiro foi mais enfático e defendeu a criação dos mandatos para o STF, mas com algumas condições. Para ele, é preciso vetar a possibilidade que um único presidente indique todos os ministros e que a renovação do STF seja escalonada. “Também teria que ser impossível a recondução, porque isso colocaria o ministro à mercê do presidente da República e do Senado, a quem ele teria que agradar para ser reconduzido”, avaliou.

Ex-diretor da Transparência Brasil, o cientista político Manoel Galdino considera que o principal problema da corrupção no Brasil atualmente é o que ele chama de corrupção “legalizada”, em referência a atos considerados ilegais do Legislativo e do Judiciário que são chancelados por eles mesmos.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.