Nos próximos dias veremos entrevistas coletivas, operações especiais e números de apreensões de drogas, armas e munições, anunciados pela Receita Federal e Polícia Federal, principalmente.


Esquecido o debate sobre a fragilidade no controle das fronteiras, detonado pós a derrubada de um helicóptero da Polícia no Rio de Janeiro por um criminoso utilizando uma arma contrabandeada, voltaremos a realidade de que nossas fronteiras estão abertas para a entrada de produtos nocivos à sociedade brasileira.


Alguns exemplos desta realidade: Porto Murtinho, que fica às margens do rio Paraguai, no Mato Grosso do Sul, está praticamente abandonado pela Receita Federal. Em Barra do Quaraí, que tem fronteiras fluviais com a Argentina, pelo rio Uruguai, e através do rio Quaraí, com o Uruguai, a Receita Federal simplesmente não opera mais. O mesmo pode ser verificado em vários pontos dos mais de 15 mil quilômetros de fronteira seca que dividem o Brasil dos demais países do continente.


Corumbá, no Mato Grosso do Sul, é outro exemplo alarmante. Estradas de terra e trilhas abertas a menos de 100 metros da Receita Federal facilitam o contrabando e o tráfico de drogas, armas e munições na divisa do Brasil com a Bolívia. Se alguém resolver “exportar” 100 carregamentos de armas para o Brasil, pelo Porto de Santos, perderá no máximo cinco. Os outros noventa e cinco entrariam livremente em território nacional, isto porque neste Porto, o maior da América do Sul, apenas 5% das cargas passam por vistoria física. Mas, se o “importador” não quiser correr nenhum risco, pode utilizar milhares de quilômetros de fronteira seca onde não há nenhuma fiscalização.


Essa realidade, desconhecida por muitos brasileiros e ignorada por inúmeras autoridades, é de conhecimento dos contrabandistas de droga, armas e munições que sabem que a chance de serem pegos nestes locais é praticamente zero. Aliás, é perfeitamente possível imaginar que, neste momento, em alguma parte do território nacional, um verdadeiro arsenal de guerra está estocado para ser distribuído para criminosos nas grandes cidades.


            Os fatos são simples e de uma realidade terrível. Nos últimos anos a Receita Federal ocupou a linha de frente no controle das fronteiras e, em alguns pontos, é a única força do Estado brasileiro a atuar no combate ao tráfico de drogas, armas, munição, descaminho, contrabando e pirataria. Mesmo assim, tem agido de forma precária, com insuficiência de pessoal, sem equipamentos e em instalações inadequadas. A futura compra de scanners poderá atenuar esta situação, mas dificilmente resolverá a maioria destas questões.


A definição quanto ao uso de armas de forma ostensiva pelos servidores da Receita Federal em fronteiras, fiscalização e vigilância permanente do órgão com apoio da Polícia Federal; as operações mais frequentes em zona secundária (rodovias, estradas de terra e demais áreas fora da aduana) em parceria com a Polícia Rodoviária Federal; destruição de portos clandestinos e patrulhamento do Exército são algumas das medidas de curto prazo que podem ser tomadas sem intermináveis discussões nos gabinetes em Brasília.


Outros exemplos de medidas a serem tomadas a médio prazo são: a definição quanto ao uso de scanners, inteligência fiscal e policial, o deslocamento e a contratação de mais servidores para as regiões de fronteiras, bem como a criação de adicionais de risco como estímulo à permanência desses funcionários públicos nessas áreas estratégicas.


 Integração e o fim de rivalidade entre os órgãos de fiscalização e policiamento de fronteiras, ampliação do trabalho em conjunto com as polícias militar e civil, uso da diplomacia junto aos países fronteiriços, ações em conjunto com a Interpol e desenvolvimento de um Plano de Ação de Defesa são exemplos de medidas a longo prazo.


Entrevistas coletivas com anúncios de operações especiais e números de apreensões são necessárias, mas visam apenas dar uma satisfação momentânea e não enfrentar o problema definitivamente. Esperamos que o governo entenda isto. Não podemos mais assistir imóveis a derrubada de helicópteros e menos ainda devemos esperar que quadrilhas por todo o País aumentem seus arsenais para um confronto aberto contra o Estado brasileiro e à nossa democracia, o que parece cada dia mais próximo.


*  Paulo Antenor de Oliveira é presidente do Sindicato Nacional dos Analistas-Tributários da Receita Federal do Brasil (Sindireceita) – [email protected]
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