GUILHERME GENESTRETI
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O raio vermelho de Bowie não tinha como não resvalar no terreno do cinema -o músico contabiliza mais de 450 participações em trilhas sonoras. Sua presença camaleônica também não tardaria a acender a mente dos cineastas, despertos para o potencial do cantor como corpo para personagens excêntricos.
De vampiro a duende do mal, passando por Andy Warhol e Pôncio Pilatos, Bowie conta com mais de 30 atuações, em geral marcadas e antinaturalistas, fruto do contato que músico teve com a mímica e o teatro experimental nas mãos do do coreógrafo Lindsay Kemp, nos anos 1960. O estilo não raro gerou chiadeira dos mais afeitos a interpretações realistas.
Em 1969, enquanto Bowie levava a música a dimensões estratosféricas a reboque de seu “Ziggy Stardust”, ele viveu em seu primeiro longa um jovem militar de preocupações bem mais terrenas: “Os Soldados Virgens” aborda um grupo de recrutas que temem tanto o front quanto ter uma mulher na cama.
O primeiro papel esquisitão foi em 1976 na ficção científica “O Homem que Caiu na Terra”, de Nicolas Roeg. O filme entrou em cartaz pouco antes de sair o disco “Station to Station” -o “Thin White Duke”, a persona zumbificada vivendo à base de leite e cocaína que Bowie encarnou no álbum encontra ecos no ET do longa, que busca retornar para casa, mas se depara com a ganância dos terráqueos.
A década de 1970 para Bowie também seria marcada pelo alemão “Just a Gigolo” (1978), de David Hemmings. Ele vive um veterano de Guerra que se torna um gigolô no bordel tocado por uma baronesa (Marlene Dietrich).
Os anos 1980 registram alguns dos papéis mais conhecidos, a começar pelo vampiro andrógeno de “Fome de Viver” (1983), de Tony Scott. O filme, com Catherine Deneuve, foi um fracasso de bilheteria. A crítica ralhou com as atuações e com o ritmo lento, mas a obra ganhou status cult.
A compensação crítica veio no mesmo ano com “Furyo, em Nome da Honra”, de Nagisa Ôshima: a trama sobre um militar britânico num campo de prisioneiros japonês foi ao Festival de Cannes.
Data também desta década, mais precisamente de 1986, outro dos seus personagens marcantes: o vilão de “Labirinto: A Magia do Tempo” (1986), fantasia oitentista repleta de bonecos desenvolvidos por Jim Henson, o criador dos Muppets. No filme, Bowie faz o rei dos duendes.
Em 1988, Martin Scorsese escala o músico para viver Pôncio Pilatos em “A Última Tentação de Cristo”, retrato mundano da vida de Jesus. A primeira escolha do diretor para o papel do vilão bíblico, contudo, era o cantor Sting.
Os anos 1990 renderam a Bowie papéis bem menos memoráveis, como o bartender de “Romance por Interesse” (1991), o gângster de “Everybody Loves Sunshine” (1999) e o ser de 400 anos de “O Segredo de Mr. Rice” (2000). De mais relevante na década, há sua interpretação de Andy Warhol, que alavanca a carreira de Jean-Michel Basquiat na cinebiografia “Basquiat – Traços de uma Vida” (1996).
Nos últimos anos, tendo colhido bombas no cinema, o músico passou a ser mais seletivo: participou da comédia de “Zoolander” (2001), de Ben Stiller, viveu o cientista Nikola Tesla em “O Grande Truque” (2006), de Christopher Nolan, e encerraria com uma participação no drama “Reação Colateral”, de 2008.