DIREITO E POLITICA
Aonde está a sacanagem?
*Carlos Augusto Vieira da Costa
Um velho amigo, político experiente e parlamentar de seis mandatos, a maioria dos quais na oposição, costumava dizer que sempre que o governo apresentava um projeto de lei encabeçado por sua tropa de choque, a primeira pergunta que fazia era: aonde está a sacanagem? Quando explodiu o esquema do mensalão, disseminou-se a idéia de que seria necessário uma reforma política para colocar fim a esse tipo de prática, que teve sua origem no PSDB mineiro, na eleição de Eduardo Azeredo para o governo de Minas no ano de 1988, contaminou o governo Lula no ano de 2005, e ainda teve fôlego para fundamentar a cassação de José Roberto Arruda (DEM) do governo do Distrito Federal, em março de 2010. Ou seja, trata-se de um esquema longevo e multipartidário, que realmente exige um combate mais incisivo. Mas como uma reforma política poderia ajudar? A resposta veio na forma de um conjunto de medidas propostas pela Câmara Federal e pelo Senado, dentre as quais destacamos 3 pontos: o primeiro é a lista fechada para a eleição proporcionais; o segundo, o financiamento público das campanhas; e o terceiro, o voto distrital. No voto em lista fechada o eleitor não escolhe mais o seu candidato, e sim um determinado partido, que possui uma lista de candidatos que serão eleitos pela ordem de acordo com a proporção de votos da legenda. O aspecto positivo desta medida está no fortalecimento das siglas partidárias, pois forçará um identificação do eleitor com o partido, e não mais com o candidato. O lado negativo, porém, é que retira do eleitor o direito de escolher o seu representante, e acaba por impor mais uma instância entre o eleitor e sua representação, o que desfavorece a democracia, pelo menos na forma que estamos acostumados. Já o financiamento público de campanha, que necessariamente está vinculado à lista fechada, objetiva acabar com a influência do poder econômico nas eleições, pois cada candidato escolhido por seu partido terá a mesma quantidade de recursos econômicos. Todavia, quem garante que não haverá caixa 2, tão comum nos dias de hoje? Outro ponto negativo é que o custo da brincadeira ficará por conta do contribuinte, num contexto em que quem paga já reclama que paga muito, e quem gasta sempre diz que falta para a saúde e para a educação. Por fim, a última medida é o voto distrital, que limita a disputa eleitoral proporcional a uma pequena parcela do território do seu estado ou de seu município, o que certamente melhora a representatividade e barateia a campanha. De todas, esta é a única medida que resultará em evidentes melhorias. Contudo, a questão aqui não é discutir se as medidas são boas ou ruins, até porque todas podem representar avanços formais, mas sim debater no que estas novidades ajudariam na erradicação da corrupção, tal qual justificadas na sua origem. Mas por mais que me esforce, não consigo vislumbrar como isso pode vir a acontecer. E frente a esta incógnita, não há como deixar de lembrar do meu velho amigo parlamentar citado no início, que em situação similar sempre começava pela pergunta: aonde está a sacanagem?
* Carlos Augusto Vieira da Costa Procurador do Município de Curitiba
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Igualdades jurídicas *Roberto Victor Pereira Ribeiro
Doutrinariamente reconhecem-se duas formas de demonstrar a igualdade. A primeira é conhecida como igualdade formal, e se manifesta através da concepção clássica do Estado, quando este proclama por meio de seus diplomas legais a seguinte máxima: todos são iguais perante a lei, sem qualquer espécie de distinção. A outra demonstração de igualdade recebe as denominações de igualdade material, efetiva, real, concreta ou situada. A igualdade material leciona acerca das questões fáticas da vida social e econômica dos indivíduos. Destarte, o alvo principal dessa segunda espécie de igualdade, é buscar ao máximo a equiparação de todos na sociedade nos quesitos sociais e econômicos. Neste sentido, o constituinte quando da elaboração da Carta Maior, demonstrou sua preocupação e zelo com a profunda desigualdade em plagas brasileiras. Diante de tal quadro, as forças foram todas guiadas no sentido de assegurar uma igualdade real entre os cidadãos, através de mecanismos legais. O bom Estado é aquele que não se furta a buscar incessantemente a igualdade material, mas também prestigiando a igualdade formal. Faz-se mister explicar que a igualdade na lei é objeto de estudo do legislador e serve para lhe nortear na criação de dispositivos que vedem quaisquer tipos de desigualdades entre as pessoas, sejam no âmbito social, religioso, sexual ou qualquer outro. Um segundo aspecto interessante no quesito igualdade na lei, diz respeito à consagração do Estado Democrático de Direito, quando deve ser policiado pelo legislador a não-criação de leis ou normas que privilegiem ou persigam pessoas. O egrégio artigo quinto de nossa Constituição reza que homens e mulheres são iguais perante a lei. Neste ínterim, corrobora também o artigo 226, em seu parágrafo 5º, preconizando a seguinte redação: Os direitos e deveres referentes à sociedade conjugal são exercidos igualmente pelo homem e pela mulher. Desta forma, a Constituição Federal de 1988 de forma cristalina veio despir qualquer preconceito ou discriminação nas relações masculinas e femininas. Assim, a Carta Maior hasteou a bandeira da igualdade, colocando fim a qualquer aresta relativa à autoridade masculina sobre a mulher. Inclusive há exceções a essa igualdade, mas todas as exceções são em benefício da mulher. Pretende-se, assim, expurgar o estigma que a mulher vem sofrendo ao longo dos tempos no Brasil. São alguns exemplos dessa variação: o tempo de aposentadoria para mulher; a não-obrigação de serviço militar em períodos de paz e a aferição de pesos suportados pelo homem e pela mulher na CLT, quando este diploma legal preconiza para a mulher tolerância de peso menor do que o homem suporta. Existe também a chamada igualdade tributária, modalidade esta que possui fulcro também na Carta Magna. É vedado o tratamento desigual a contribuintes que estejam em situação equivalente, desta forma, leciona o artigo 150, II, da CF/88. Através dessa igualdade pratica-se de forma concreta a velha lição de tratar os iguais como iguais, e os desiguais como desiguais. Desta feita, quem ganha mais, paga mais; quem ganha menos, paga menos; e quem não ganha nada, não paga nada. Para encerrar, rogamos a todos que busquem praticar em suas vidas, o lema da igualdade, pois não há maneira mais fácil e efetiva de compreender e auxiliar a sociedade a evoluir para o bem-estar de todos.
* O autor é advogado do Ribeiro Advocacia & Advogados Associados e escritor da Academia Brasileira de Direito
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A CONDUTA E O DIREITO PENAL
Apropriação até 10 mil é crime de bagatela * Jônatas Pirkiel
É interessante esta decisão do Superior Tribunal de Justiça, cujo texto divulgado pelo Tribunal é bastante elucidativo, como podemos ver: …Dois réus foram denunciados por apropriação indébita de dez contribuições previdenciárias descontadas de seus empregados, entre os anos de 2002 e 2004, totalizando pouco mais de R$ 12 mil reais. Um dos réus foi absolvido e outro foi condenado à pena de dois anos e quatro meses de reclusão, em regime aberto, e multa. Posteriormente, a pena de reclusão foi substituída por prestação de serviços comunitários e prestação pecuniária. O MPF e o réu condenado apelaram ao TRF4, o primeiro pedindo também a condenação do corréu absolvido, o segundo defendendo a própria absolvição. O tribunal regional considerou que o valor remanescente da sonegação, que ainda não havia prescrito, somava cerca de R$ 6.800. Isso permitiria a aplicação do princípio da insignificância, com a consequente exclusão da tipicidade do delito – razão pela qual o TRF4 determinou a absolvição do réu anteriormente condenado. No recurso ao STJ, o MPF afirmou que o artigo 168-A do Código Penal (CP), que trata do crime de apropriação indébita previdenciária, não estabelece valores mínimos, e que o fato de o Estado não promover a cobrança de débitos inferiores a R$ 2.500,00 não significa que não tenha interesse no recebimento dessas quantias. O ministro Gilson Dipp, relator do recurso, considerou que a jurisprudência já é pacífica no sentido de que o princípio da insignificância se aplica a situações em que os débitos tributários envolvidos não passem de R$ 10 mil. No caso, apontou, considera-se a hipótese do crime de bagatela, em decorrência do artigo 20 da Lei 10.522/02, conforme ficou decidido pela Terceira Seção do STJ ao julgar o REsp 1.112.748, no regime dos recursos repetitivos. O magistrado disse ainda que, com a Lei 11.457/07, que incluiu os débitos relativos à contribuição previdenciária na dívida ativa da União, o mesmo raciocínio aplicado ao delito de descaminho, quanto à incidência do princípio da insignificância, deve ser adotado para o crime de não recolhimento das contribuições para a previdência social. Com essa fundamentação, o ministro Dipp negou o recurso do MPF.
* O autor é advogado criminal ([email protected])
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ESPAÇO LIVRE RDC x STF: O fracasso da Copa na conta do Supremo
*Luis Henrique Braga Madalena
No início do corrente mês, foi ajuizada perante o STF, Ação Direta de Inconstitucionalidade em face da Lei nº 12.462/2011, o famigerado Regime Diferenciado de Contratações (RDC) a ser utilizado pelo Poder Público na realização de obras e aquisições de bens, concernentes à Copa do Mundo de 2014 e aos Jogos Olímpicos de 2016. Na falada ação há alegação de vício formal que chama bastante a atenção uma vez que teria se manifestado na conversão da Medida Provisória nº 527/2011 na Lei nº 12.462/2011, exatamente no momento em que ocorreu a inserção do RDC na normatização. Originalmente, a MP não fazia qualquer menção a contratações públicas, unicamente tratando de alterações na estrutura organizacional e das atribuições dos órgãos da Presidência da República, além de promover adaptações na ANAC e Infraero. Apenas quando de sua conversão em lei é que se deu o enxerto do RDC. Tal prática, além de bastante estranha, é completamente vedada, não apenas pela Constituição, mas também, pela jurisprudência do STF. A mencionada restrição é indispensável para garantia da separação dos Poderes. Fosse permitido ao Legislativo acrescentar qualquer matéria ao texto de uma Medida Provisória, estaria se transferindo para esse Poder uma atribuição que a Constituição reserva exclusivamente ao Presidente da República, qual seja a de decidir os casos de urgência e relevância que devem ser encaminhados pela falada via. Muito estranho que o Governo não tivesse conhecimento de tal limitação na hora de confeccionar, aprovar e sancionar a normatização tratada. Isso sem contar que o RDC limita a competitividade e dificulta o controle, além de não haver norma que defina prévia e firmemente em quais contratações o mesmo deverá ser utilizado, o que acaba por ficar integralmente a cargo do Executivo. Todos os pontos tratados na ação já haviam sido discutidos e ressaltados como problemáticos por juristas e órgãos de controle, de modo que se vislumbram grandes chances de que a demanda seja procedente, tendo em vista as flagrantes inconstitucionalidades que afligem o RDC. Diante deste quadro, o Governo já se movimenta com vistas a pressionar o STF para que não declare o RDC inconstitucional, o que se observou nesta semana por meio de manifestação da ministra da Casa Civil, Gleisi Hoffmann. O apelo político é feito sem quaisquer argumentos jurídicos, apenas alegando que, sem o novo regime, há grandes chances de fracasso dos eventos aos quais o mesmo se destina, em especial a Copa do Mundo. Fala-se que no caso de naufrágio do RDC, não há plano B, denotando que, sendo declarada a inconstitucionalidade deste, os eventos que justificam a criação do mesmo restariam bastante prejudicados, devido à carência de celeridade nas contratações, a qual apenas seria permitida pela lei questionada. Ora, isso seria o mesmo que transferir a responsabilidade do êxito ou fracasso dos falados eventos, em especial da Copa do Mundo, ao STF, de modo a forçar uma decisão política que venha a beneficiar o Governo e não o Interesse Público. Trata-se de um artifício muito parecido ao utilizado no caso da chamada lei da ficha limpa, na qual, por claras determinações legais a mesma não poderia vigorar para as passadas eleições, uma vez que não foi aprovada a tempo. Mesmo assim, deixou-se que o STF tomasse a decisão de que a mesma apenas viesse a valer para o próximo certame eleitoral, passando a Corte Superior como grande vilã e promotora da impunidade. Se o STF promover uma acertada decisão JURÍDICA, fazendo com que o navio completamente esburacado do RDC venha a naufragar e com ele a Copa do Mundo, já teremos um culpado, um bode expiatório: O próprio STF! Afinal, de quem é a culpa pela urgência nas contratações, as quais, como já vistas nos Jogos Pan-Americanos de 2007, permitem gastos muito além do orçamento (de 300 milhões para 3 bilhões de reais)? Seria do Supremo?
* O autor é advogado do escritório Marins Bertoldi de Curitiba, especialista em Direito Constitucional e Teoria Geral do Direito pela Academia Brasileira de Direito Constitucional e membro da Comissão de Estudos Constitucionais da OAB/PR e do Instituto dos Advogados do Paraná – IAP.
* * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * PAINEL JURÍDICO Conferência A XXI Conferência Nacional dos Advogados realizada pela Ordem dos Advogados do Brasil vai acontecer em Curitiba no período de 20 a 24 de novembro. Organizada em 20 painéis, duas conferências magnas, tribuna livre e encontros culturais, o evento, cujo tema central é Liberdade, Democracia e Meio Ambiente, tem confirmada a participação de grandes juristas, ministros de Estado e ministros do STF, do STJ e do TST, totalizando 114 palestrantes. Informações no site https://conferencia.oab.org.br
Afeto A filiação socioafetiva predomina sobre o vínculo biológico. Com esse entendimento, a 3ª Turma do STJ impediu um pai biológico de mudar a certidão de nascimento de uma menor registrada pelo pai afetivo.
Desaposentação A 5ª Turma do TRF da 4ª Região reconheceu o direito de um aposentado do à desaposentação sem ter que devolver ao INSS os valores já recebidos.
Sol Empregado que trabalha a céu aberto não tem direito ao adicional por insalubridade. O entendimento é da 4ª Turma do TST.
No México O professor Ricardo Marcelo Fonseca, diretor do Setor de Ciências Jurídicas da UFPR, fez palestra no último dia 05 de outubro, na cidade de Morélia, no México, durante o III Encuentro Latinoamericano de História del Derecho. Ele é autor de várias obras e também é presidente do Instituto Brasileiro de História do Direito.
Descanso Por decisão do Órgão Especial do TJ gaúcho, a OAB-RS obteve a suspensão dos prazos processuais de 20 de dezembro de 2011 a 6 de janeiro de 2012.
Mestrado A Caixa dos Advogados do Paraná (CAA/PR) renovou o convênio com a UniBrasil que concede 20% de desconto nas mensalidades para o mestrado em Direitos Fundamentais e Democracia. Para ter direito ao benefício é preciso estar em situação regular junto a OAB Paraná. Mais informações: (41) 3361-4315 ou www.unibrasil.com.br.
TRT do Paraná A atual vice-presidente do TRT do Paraná, desembargadora Rosemarie Diedrichs Pimpão, foi eleita, no último dia 05 de outubro, para a presidência do Tribunal. Também foram eleitos os desembargadores Altino Pedrozo dos Santos, para vice-presidente, e Dirceu Buyz Pinto Júnior, para corregedor regional. A cerimônia de posse será no dia 1º de dezembro.
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DIREITO SUMULAR Súmula nº 470 do STJ – O Ministério Público não tem legitimidade para pleitear, em ação civil pública, a indenização decorrente do DPVAT em benefício do segurado.
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LIVROS DA SEMANA
Este trabalho tem como foco um dos princípio basilares do sistema registral brasileiro: o da publicidade registral em que se apoia, o autor busca o momento e os fundamentos da institucionalização da publicidade entre nós, o que se deu no século XIX, com o registro hipotecário. Conclui, por exemplo, que os motivos que impulsionaram a adoção do sistema de publicidade registral em nosso país foram de ordem econômica, como o fomento ao crédito territorial e a garantia aos empréstimos de capitais. Marcelo Salaroli de Oliveira — Publicidade Registral Imobiliária — Editora Saraiva, São Paulo 2011
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A cidadania européia foi instituída pelo tratado de Maastriccht em 1993, e o assunto foi revisto pelo Tratado de Amsterdam, de 1997. Segundo esses documentos, e cidadãos da União Européia qualquer pessoa que tenha a nacionalidade de um Estado membro. Muito embora os termos cidadania e nacionalidade possuam significados distintos, estão indissoluvelmente relacionados. Thomas Richter; Rainer Schmidt — Integração e Cidadania Européia — Editora Saraiva, São Paulo 2011
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JURISPRUDÊNCIA Contrato de comodato inviabiliza a aquisição de propriedade por usucapião O julgamento da pretensão sob determinado fundamento é circunstância que deve ser apreciada pelo próprio julgador, sem que isso incorra em julgamento extra petita, mormente se a lide foi decidida nos seus limites, considerando que a qualificação jurídica do fato/indicação de artigo de lei não integra a causa de pedir. Se, em ação possessória em que a parte autora da ação de usucapião figura como ré, o pedido é julgado improcedente, não se interrompe o prazo da prescrição aquisitiva. Ainda que se seja aceito, hodiernamente, que a contagem do tempo necessário à usucapião extraordinária se encerre após o ajuizamento da ação, sem o indispensável preenchimento absoluto dos requisitos legais (art. 550, CC/1916), é inviável a declaração de aquisição do domínio pela prescrição aquisitiva. A partir do momento em que, voluntariamente, tornou-se comodatária, a posse da autora da ação de usucapião passou a ser precária, tornando impossível a aquisição da propriedade pela usucapião. Decisão da17ª Câmara Cível do TJ/PR. AC. n. 0741873-3 (fonte TJ/PR).
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COORDENAÇÃO: RONEY RODRIGUES PEREIRA [email protected]
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