Pela quarta vez em três anos anos, a prefeitura de Piraquara, na Região Metropolitana de Curitiba, tenta sem sucesso preencher vagas para médicos. Entre 2018 e 2019, dois processos emergenciais de seleção foram lançados para temporários e, mesmo assim, a demanda não foi suprida. A situação se agravou depois que o município perdeu 16 médicos do Programa Mais Médicos. O déficit é semelhante em outras prefeituras da Grande Curitiba. Elas alegam que a mudança fez com que os cofres municipais fossem demandados para arcar com o pagamento de médicos próprios, enquanto os profissionais do programa eram pagos pelo governo federal.

Além dos cubanos que foram embora após desacordo entre o governo Jair Bolsonaro e governo de Cuba, os outros, na maioria brasileiros, deixaram o programa para tentar vagas consideradas melhores que estavam previstas nos editais extraordinários do Mais Médicos lançado no fim do ano passado e início deste ano. Com isso, as 11 unidades básicas de saúde de Piraquara ficaram desfalcadas. No último processo seletivo, segundo a prefeitura de Piraquara, os cinco médicos aprovados que chegaram a tomar posse pediram exoneração em menos de seis meses.

O novo processo emergencial lançado neste mês por meio de Processo Seletivo Simplificado (PSS) oferece vagas para atuação nas unidades básicas de saúde do município com remuneração de R$ 10.920,74, mais adicionais. A jornada é de 40 horas semanais. As inscrições gratuitas devem ser feitas até o dia 18 de abril. No comunicado de divulgação, a prefeitura destaca que tem “dificuldade na contratação de médicos” e que, “para suprir a demanda, desde 2016 a prefeitura de Piraquara realizou três concursos públicos e dois PSS, porém a adesão dos profissionais sempre foi pequena e poucos assumiram o cargo. Em razão da urgência, um novo PSS foi aberto agora”.

“É uma dificuldade que vários municípios estão passando. Nós convocamos um grande número de médicos, mas poucos assumiram o cargo e muitos dos que foram admitidos pediram exoneração meses depois”, explicou a Secretária de Saúde, Maristela Zanella.

O Tribunal de Contas do Estado (TCE-PR) não recomenda contratação de médicos temporários, mas o município argumenta que precisou apelar à modalidade emergencial em razão de os médicos aprovados em concursos convencionais, estatutários, terem abandonado os cargos em curto espaço de tempo. O atual processo emergencial oferece três vagas.

Piraquara tem hoje 29 vagas para médicos de 40 horas, generalistas, para saúde da família. Dessas, 16 vagas são do Mais Médicos. O déficit atual é de 18 vagas. Oito são do mais médicos e dez do próprio município. “Desde janeiro de 2018 temos vagas em aberto. A situação se agravou com a impossibilidade de renovação de contratação do Mais Médicos. Não temos perspectiva de repor essas oito vagas”, aponta a secretária.

Falta de atenção básica aumenta emergenciais

Maristela Zanella aponta que o município investe 18,5% do orçamento em Saúde, 3% a mais que os 15% exigidos por mês. Ela afirma que o município não pode, neste momento, abrir mais que as três vagas oferecidas no PSS, em razão da Lei de Responsabilidade Fiscal. Piraquara está com orçamento comprometido e muito próximo do limite prudencial previsto na lei, que é de 50% de gastos com pessoal. “A estrategia da saúde da família está descoberta. Isso causa dois problemas. O serviço é prejudicada em si e também pode haver diminuição de repasses do governo federal”, alerta.

A redução na atenção básica deve afetar índices de mortalidade. “Prejuízo ao atendimento da população com doenças crônicas, hipertensão, diabetes a gente pode observar um aumento de mortalidade por esse tipo de causa. Aumenta também a mortalidade infantil. Tem mais um agravante. Com a crise econômica, muitas pessoas que tinham plano de saúde migraram para o SUS (Sistema Único de Saúde). Em Piraquara, 85% da população depende do SUS. Apenas 15% tem plano de saúde”, aponta., “O nosso maior problema é a atenção primária. Se está bem estruturada, com equipe completa, a gente consegue resolver os problemas. Estima-se que 85% dos problemas de saúde da população possam ser resolvidos na atenção primária”, aponta a secretária. A redução de profissionais do Mais Médicos é apontada pela secretária como uma das principais causas da falta de profissionais. “Saíram os cubanos e está um caos. Estamos do lado de Curitiba. Imagina nos municípios mais afastados. Tínhamos três cubanos que foram substituídos por brasileiros que já saíram. O mais recente passou em outro concurso”, afirma. Cada médico de atenção básica atende em média 30 consultas por dia. Nas 16 vagas do Mais Médicos, cada um custa aproximadamente R$ 14 mil. Por mês seriam R$ 225 mil, vezes 12 meses, seriam R$ 3 milhões que agora precisam ser absorvidos pelo município.

Secretarias cobram política nacional

Giovani de Souza, que também é presidente do Conselho Regional dos Secretários da Saúde da Região Metropolitana (Cresems), que congrega 29 municípios, incluindo Curitiba, afirma que não dá tempo de substituir médicos que desistem das vagas após tomarem posse. “Outra coisa que atrapalha muito é quando médico não quer mais trabalhar conosco – e nós perdemos uns 15 que foram embora, que se inscreveram, entraram no concurso e já saíram – ele sai em 30 dias com o aviso que ele deu. Para retornar e nós termos um novo médico, o processo burocrático administrativo fica entre 60 e 90 dias. É uma estrutura extremamente difícil de organizar”, lamenta. “Eu tenho o recurso financeiro, eu tenho as vagas disponíveis, se 20 médicos se apresentassem em São José dos Pinhais para trabalhar conosco eu conseguiria colocá-los de imediato nas nossas unidades. Como o processo demora de 60 a 90 dias, quando eu chamo dez, já saíram três (médicos). Quando eu chamo 15, três saíram de licença”, explica.

O presidente do Cresems afirma que outros municípios estão situação pior. “Nós estamos enfrentando dificuldades, mas tem cidades que enfrentam ainda maior. Em Tijucas do Sul, por exemplo, tem duas unidades que o prefeito não consegue médico há mais de ano. Ele tem uma dificuldade ainda maior porque o piso do prefeito é R$ 14 mil e o salário de médico não pode (por lei) passar o do prefeito”, conta. Problema semelhante ocorre em Pinhais, onde um médico não pode ganhar mais que o prefeito em razão de lei municipal. Mesmo com crescimento previso em plano de carreira, o salário do médico esbarra no teto do município.

Para o secretário, um dos motivos da falta de profissionais é a falta de cursos de medicina e o alto custo da graduação. “A Prefeitura de Curitiba, para ter 80 médicos, já tinha chamado 350 concursados. É um problema que enfrentamos que não é a pauta do médico, eu entendo que o problema que temos no Brasil, no Paraná e aqui, é que tem poucas universidades com o curso de medicina. Em (Grande) Curitiba, que tem 5 milhões de habitantes, quase 50% do Estado, tem uma universidade federal de medicina. Os outros cursos são todos privados. Um enfermeiro paga mil reais por mês para fazer a graduação, depois ele ganha cinco mil. O fisioterapeuta paga mil e ganha cinco. Um médico, a faculdade dele custa entre R$ 7 mil e R$ 10 mil. Um profissional, que é médico, que paga isso por mês, mais três anos de residência, mais especialização, não quer trabalhar por R$ 14 mil. O salário para um médico deveria ser de R$ 20 mil, mas é incompatível no Brasil”, estima.

A solução, segundo o presidente do Cosems, não será encontrada sem passar por uma política nacional. “Estamos estudando isso, procurando uma metodologia para resolver. Mas uma coisa é certa: alguma coisa vai ter que acontecer. Não só da gente aumentar o salário do médico, mas também o Brasil vai ter que investir em universidades públicas para o valores gastos diminuam e para que tenha mais profissionais no mercado”, diz.

Secretarias cobram política nacional

Giovani de Souza, que também é presidente do Conselho Regional dos Secretários da Saúde da Região Metropolitana (Cresems), que congrega 29 municípios, incluindo Curitiba, afirma que não dá tempo de substituir médicos que desistem das vagas após tomarem posse. “Outra coisa que atrapalha muito é quando médico não quer mais trabalhar conosco – e nós perdemos uns 15 que foram embora, que se inscreveram, entraram no concurso e já saíram – ele sai em 30 dias com o aviso que ele deu. Para retornar e nós termos um novo médico, o processo burocrático administrativo fica entre 60 e 90 dias. É uma estrutura extremamente difícil de organizar”, lamenta. “Eu tenho o recurso financeiro, eu tenho as vagas disponíveis, se 20 médicos se apresentassem em São José dos Pinhais para trabalhar conosco eu conseguiria colocá-los de imediato nas nossas unidades. Como o processo demora de 60 a 90 dias, quando eu chamo dez, já saíram três (médicos). Quando eu chamo 15, três saíram de licença”, explica.

O presidente do Cresems afirma que outros municípios estão situação pior. “Nós estamos enfrentando dificuldades, mas tem cidades que enfrentam ainda maior. Em Tijucas do Sul, por exemplo, tem duas unidades que o prefeito não consegue médico há mais de ano. Ele tem uma dificuldade ainda maior porque o piso do prefeito é R$ 14 mil e o salário de médico não pode (por lei) passar o do prefeito”, conta. Problema semelhante ocorre em Pinhais, onde um médico não pode ganhar mais que o prefeito em razão de lei municipal. Mesmo com crescimento previso em plano de carreira, o salário do médico esbarra no teto do município.
Para o secretário, um dos motivos da falta de profissionais é a falta de cursos de medicina e o alto custo da graduação. “A Prefeitura de Curitiba, para ter 80 médicos, já tinha chamado 350 concursados. É um problema que enfrentamos que não é a pauta do médico, eu entendo que o problema que temos no Brasil, no Paraná e aqui, é que tem poucas universidades com o curso de medicina. Em (Grande) Curitiba, que tem 5 milhões de habitantes, quase 50% do Estado, tem uma universidade federal de medicina. Os outros cursos são todos privados. Um enfermeiro paga mil reais por mês para fazer a graduação, depois ele ganha cinco mil. O fisioterapeuta paga mil e ganha cinco. Um médico, a faculdade dele custa entre R$ 7 mil e R$ 10 mil. Um profissional, que é médico, que paga isso por mês, mais três anos de residência, mais especialização, não quer trabalhar por R$ 14 mil. O salário para um médico deveria ser de R$ 20 mil, mas é incompatível no Brasil”, estima.

A solução, segundo o presidente do Cosems, não será encontrada sem passar por uma política nacional. “Estamos estudando isso, procurando uma metodologia para resolver. Mas uma coisa é certa: alguma coisa vai ter que acontecer. Não só da gente aumentar o salário do médico, mas também o Brasil vai ter que investir em universidades públicas para o valores gastos diminuam e para que tenha mais profissionais no mercado”, diz.