Rafael Silva/SMCS – Foram 34 votos favoráveis e apenas um contrário

A Câmara Municipal de Curitiba aprovou ontem, em primeiro turno, projeto que aumenta o capital social da Cohab, da Curitiba S/A e da Agência Curitiba de Desenvolvimento. A Prefeitura de Curitiba quer alocar R$ 19,2 milhões do superávit primário de 2020 nessas entidades, sendo que a maior parte, R$ 16 milhões, será usada no reequilíbrio do fluxo de caixa da Companhia de Habitação Popular de Curitiba (Cohab).

Foram 34 votos favoráveis e apenas um contrário, mas o resultado positivo não impediu que os parlamentares fizessem críticas às políticas habitacionais do Município. Por exemplo, Indiara Barbosa (Novo) destacou que “desde 2014 a Cohab tem prejuízo”. “A operação [da companhia] não se sustenta, e com a pandemia só piorou. A inadimplência [dos mutuários da Cohab] aumentou, de 30% para 50%”, afirmou a parlamentar, com base em declaração do presidente da companhia, José Lupion Neto, que na véspera respondeu a perguntas da Comissão de Economia, Finanças e Fiscalização.

Falando pela vice-liderança do governo, Mauro Ignácio (DEM) atribuiu o déficit operacional da Cohab ao atraso dos mutuários, que, na justificativa, a Prefeitura de Curitiba disse estarem em “dificuldade para honrar seus compromissos de financiamento [em razão da pandemia]”. Com isso, o aumento do capital social seria para pagar tributos devidos pela companhia, salários e fornecedores. Na véspera, Lupion Neto disse que a Cohab deixou de recolher impostos com os problemas de fluxo de caixa, ficando sem Certidão Negativa de Débitos (CND).

“Ao longo dos anos, a companhia se tornou deficitária. E como o Município é o maior acionista, acaba fazendo a transferência de aportes a cada ano”, acrescentou Serginho do Posto (DEM), para quem “o modelo habitacional passou por mudanças e agora depende muito do governo federal”. Durante o debate, Serginho do Posto explicou o controle acionário da Cohab, apesar dela ser uma sociedade de economia mista, é 99,9% da Prefeitura de Curitiba, sendo que 0,1% é uma cota atribuída ao presidente da companhia enquanto ele ocupa o cargo.

Sócios – Renato Freitas (PT), único a votar contra o crédito orçamentário, e Dalton Borba (PDT) haviam questionado quem seriam os outros sócios da Cohab em Curitiba e se eles teriam feito aportes proporcionais ao da prefeitura, uma vez que nesse desenho institucional parceiros privados, segundo os parlamentares, poderiam ter até 49% da companhia. Superado esse ponto, Borba questionou se, no futuro, conforme houvesse a adimplência dos devedores, se a Cohab devolveria o recurso aos cofres do Executivo ou assimilaria o aumento do capital social na sua contabilidade.

“Estou com um dilema: se voto a favor, mantém-se o modus operandi [de socorrer financeiramente a Cohab]; se votar contra, rompemos [esse modelo], mas põe em risco os servidores”, disse Borba. Salles do Fazendinha (DC) concordou com ele, dizendo que “se analisar com a razão, não vota no aporte”. “Mas e o coração? Se vota contrário, pune pessoas que não tem nada a ver com a desorganização financeira da Cohab”.

Freitas sugeriu a criação de uma Secretaria Municipal de Habitação, argumentando que “a cidade possui mais de 400 ocupações irregulares e essa situação não vai melhorar se não mudar a política de habitação”. Segundo o vereador, a lei é um “eufemismo para doação” e que a Cohab, como a Urbs, ao fragilizar a situação dos seus funcionários, dependendo de aportes para cumprirem suas obrigações trabalhistas, fariam “chantagem financeira”.

Tomando um caminho contrário, Indiara Barbosa defendeu que a oferta de habitação em Curitiba seja delegada à iniciativa privada. “Será que a gente precisa de uma companhia de habitação para construir unidades subsidiadas, se a própria iniciativa privada já apresenta soluções? A maior parte dos valores [devidos hoje pela Cohab] é para cobrir obrigações tributárias. A prefeitura arrecada e faz aporte para empresa pública pagar impostos [federais]”, criticou.

Interesse social – A tese de retirar o poder público da habitação de interesse social foi criticada por Noemia Rocha (MDB), para quem “quanto menos Estado, há menos políticas públicas”, referindo-se a existirem, hoje, filas “imensas” de pessoas de baixa renda esperando por moradia digna na cidade. Para Noemia, seria melhor adotar medidas de tributação progressiva, cobrando mais impostos dos mais ricos, com o objetivo de reduzir a desigualdade social.

Já Maria Leticia (PV) disse que a culpa pelo problema de fluxo de caixa da Cohab não deveria ser atribuída somente à inadimplência decorrente dos impactos econômicos da pandemia. “Para além de responsabilizar o mutuário, enfrentamos problemas de gestão na Cohab”, afirmou a parlamentar, cobrando a elaboração de um plano de governança para a companhia de habitação e criticando a votação apressada do projeto. “Não se pode admitir mais votações assim, com a água no pescoço”, disse. A situação das políticas habitacionais foi o tema de uma audiência pública na CMC realizada em outubro (leia mais).