Celebraremos este Natal sem festejá-lo: é necessário proteger a quem amamos e a nós mesmos (Imagem: Pixabay)

Dizer que 2020 foi um ano extremamente difícil seria, como todos sabem, um grande eufemismo. Até o ano passado, para muita gente o fim do ano girava em torno de velas, canções natalinas, presentes embrulhados e árvores decoradas. Mas dessa vez é diferente; temos um Natal com personagens e enfeites novos: o novo coronavírus, a necessidade de vacinar a população, o álcool em gel, a máscara, o enfrentamento da dor, do medo, da incerteza, da tristeza, do luto e o desejo de que a vida renasça em esperança.

Sim, passamos por um ano desafiador, que ficará marcado na história da humanidade. E no mundo todo, nesta Noite Santa, milhares de crianças, jovens e adultos talvez não queiram um presente. Muitos de nós desejarão tão e simplesmente alguém presente. Ora, é algo que pode parecer trágico para qualquer perspectiva do comércio, mas impactante quando percebermos que a essência do ser humano, no fim das contas, é estar na presença do amor de quem se ama.

Neste fim de ano, quantos de nós irão relembrar alguém? Quantos de nós irão fechar os olhos para implorar pela vida daquela filha ou avô que está lutando pela vida no hospital? Sim, dói pensar que alguém vai derrubar lágrimas por aquele filho ou avó que já se foi, e quem sabe sonhar apenas por um instante com sua presença ali, sentado solenemente à mesa, para a ceia de Natal. 

Nesta noite, pasmem: muitos maridos e esposas irão para a cama solitários, pois tiveram os corações dilacerados pela ausência dos companheiros que escolheram para a vida; adormecerão sem um beijo de boa noite. E quantos de nós desejaremos, só mais uma única vez, dar um abraço em nosso pai ou em nossa mãe, algo que a inflexível Covid-19 arrancou de nossas mãos pelo dissabor do luto ou pela distância física.

Quantos e quantas de nós celebrarão esta Noite Feliz preocupados com aquele membro da família ou amigo que estará em plantão garantindo a sobrevivência dos que lutam pela vida nos hospitais, a segurança dos que transitam por ruas e estradas, ou que trafegam entre cidades para nos garantir alimento, remédios, provisões… A eles, o nosso mais profundo reconhecimento e gratidão.

Ora, não sejamos tolos: o período de Natal suscita agradecimentos, lembranças, o desejo de se estar com quem amamos e de nos inclinar diante do mistério da vida e de sua contemplação. É festa, mas é antes de tudo celebração. Natal é aquele tipo de instante que resgata o passado e evoca a aspiração de se fazer votos para o futuro. Tem todo ano, mas todo o ano, é sempre novo.

É dia do tio do pavê, da uva passas no arroz, da maçã na maionese, das brincadeiras sobre o tamanho do peru, de riso, de alegria, de esperança. É momento de aglomeração, de gente em movimento, de se estar com amigos e com a família para celebrar, de alguma maneira, o dom da vida – seja a de Cristo para quem Nele acredita, seja a da própria vida para quem não se identifica com a proposta religiosa de sua festividade.

Nesta noite haverá alegria e tristeza; às vezes uma sensação de vazio e de ansiedade. Também haverá solidão e presença, saudade e talvez gargalhadas. Mas para muitos, será uma noite de lágrimas. Esperancemo-nos: o sentido do Natal é compreender que toda adversidade pode de alguma maneira se transformar em Luz.

Indiferentemente do modo como celebramos cada Natal, tenhamos cuidado. Quantos de nós levantaremos as taças para brindar pela última vez hoje, com os nossos entes queridos? Se não dá pra deixar pro ano que vem, tenhamos a consciência de que este Natal não deve ser festejado, só celebrado. Meditado. Experimentado. 

Façamos festa irrefutavelmente na intimidade do nosso coração. Evitemos o contato físico. Preservemos a vida! Só assim poderemos proteger a quem amamos e a nós mesmos. Afinal de contas, a pandemia não acabou.

Com certeza, o verdadeiro presente do dia de hoje é reconhecermos a importância de, ao adentrarmos 2021, compreendermos o valor da saúde e do quanto não estar presente pode ser o mais valioso presente. 

Minha solidariedade às famílias enlutadas. Muita esperança para 2021! E um Feliz Natal pra você!

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    * Ana Beatriz Dias Pinto, é comentarista convidada do blog e nos traz reflexões sobre temas atuais e contextualizados sob a ótica do universo religioso, de maneira gratuíta e sem vínculo empregatício, oportunizando seu saber e experiência no tema de Teologia e Sociedade para alargar nossa compreensão do Sagrado e suas interseções. Quer falar com ela? Escreva para [email protected]