Considerado hoje o melhor restaurante do mundo, segundo a lista do 50 Best, o Geranium está instalado dentro de um estádio de futebol, o Parken, casa do Copenhague, na Dinamarca. O espaço é comandado pelo chef Rasmus Kofoed e tem três estrelas Michelin. O Geranium integra uma lista de restaurantes que privilegiam a alta gastronomia e têm se tornado tendência em estádios e arenas mundo afora.

No Brasil, as arenas têm acompanhado esse movimento e também estão deixando de ser usadas apenas em jogos e shows. Na verdade, algumas delas têm aproveitado esses eventos para atrair público para novas experiências. O movimento ainda é tímido e recente, mas existe uma mudança de cultura em curso para ocupar esses espaços que antes só recebiam mesmo as partidas de futebol.

Essa tendência se tornou comum em arenas e estádios na Europa e nos Estados Unidos e pode se consolidar no Brasil. No terceiro andar do Allianz Parque, do Palmeiras, em São Paulo, foram inaugurados recentemente o italiano La Coppa e o Braza, especializado em grelhados. Ambos são administrado pela GSH (Gourmet Sports Hospitality), empresa responsável por toda a área de alimentos e bebidas da casa palmeirense.

A GSH também cuida do Nagairô Sushi, de culinária japonesa. As três casas oferecem pratos de alta gastronomia e mesas com visão privilegiada para o gramado, que se transformam em grandes camarotes em dias de jogos e shows, com pacotes vendidos para um público de alta renda. Mas funcionam em dias sem jogos também.

“Trouxemos algo que era inédito no Brasil. Tradicionalmente, os estádios eram lugares para refeições rápidas, onde você comprava uma comida ou uma bebida para se alimentar enquanto via o jogo”, diz Mark Zammit, CEO da GSH. “Nossa meta é elevar esse padrão e dar a possibilidade para que as pessoas desfrutem de um bom cardápio”. Isso também faz com que o torcedor/consumidor permaneça no local por mais tempo do que os tradicionais 90 minutos. O cliente almoça, conversa, se diverte e depois vê o jogo.

O consumidor que quiser assistir a Palmeiras x Fortaleza, por exemplo, marcado para dia 2 de novembro, enquanto prova os pratos do La Coppa ou do Braza, terá de pagar R$ 1 mil pelo pacote, que inclui bebidas, entre água, café, refrigerante, vinho, cerveja e gin, entradas/petiscos e pratos principais à vontade, além de sobremesas.

Para o show do cantor canadense Michael Bublé, o próximo evento musical no Allianz Parque, marcado para o dia 5 de novembro, os pacotes são vendidos a R$ 1.870. Zammit entende que ainda não se tornou algo cultural frequentar restaurantes e bares em estádios de futebol no Brasil, mas esse conceito tem agradado aos brasileiros que podem pagar.

Mas com a “gourmetização” das comidas nos estádios, o preço, consequentemente, também sobe. “O estádio sempre foi atrelado a comida de má qualidade e, consequentemente, a preços baixos, mas com a modernização e o aumento dos preços dos ingressos elevou-se a expectativa das pessoas quanto aos serviços dentro desses locais”, acredita Zammit. Ainda assim, opções simples, como amendoim, pipoca e cachorro quente, seguem populares entre os torcedores nas arenas.

Essas novas instalações, sobretudo gastronômicas, ganharam forças nos estádios à medida que eles viraram megaestruturas. No Allianz Parque, existe um projeto chamado Arena Viva, criado para mudar a maneira como os visitantes se relacionam com a arena a partir de diferentes experiências, para além das partidas e dos shows. O plano é fazer com que o espaço seja um lugar multiúso na cidade, dado seu potencial de atrair público e gerar receitas para seus donos e parceiros.

“O que vi quando cheguei era que, em dias de shows e jogos, o Allianz era reconhecido como a melhor arena da cidade, mas nos outros 300 dias no ano ele ficava ocioso”, explicou Cláudio Macedo, de 38 anos, CEO da Wtorre Entretenimento, em entrevista recente ao Estadão. A WTorre é a construtora da arena palmeirense.

PERNAMBUCO

No Recife, o Sport anunciou no mês de agosto o lançamento do SportBar. Com uma programação ampla e gourmetizada, a estrutura comporta 150 pessoas sentadas e terá temática toda rubro-negra para jogos dentro e fora da Ilha do Retiro, além de reservas para eventos corporativos e particulares, como festas de aniversário e confraternizações.

Nos dias de jogos, haverá um telão especial e televisões em todos os espaços. Sócios terão 10% de desconto no consumo. O local será custeado integralmente por um sócio-investidor. O contrato foi firmado por cinco anos e o projeto teve orçamento de R$ 250 mil.

“Fizemos um bar para o torcedor rubro-negro chamar de seu, seja em jogos fora, em casa ou em dias comuns. O SportBar é a oportunidade de o torcedor viver uma nova experiência dentro da Ilha do Retiro. E se reunir em dias de jogos. É a modernização do patrimônio do Sport atrelado ao conforto do torcedor”, afirma André Fernandes, vice-presidente administrativo do clube pernambucano.

REI DOS CAMAROTES

Léo Rizzo, de 39 anos, é formado em Educação Física, mas ele nunca trabalhou na área. Ele sempre gostou de eventos e usou a expertise que adquiriu com organização de festas infantis, formaturas, casamentos e sua antiga empresa de bartender para criar um modelo de negócio diferente. O empresário passou a dominar os camarotes nas arenas a partir de 2015, ano seguinte à Copa do Mundo do Brasil, para o qual foram inauguradas arenas modernas e com capacidade de abrigar setores vips. Hoje, ele é dono do Camarote dos Ídolos, no Morumbi, do Fanzone, no Allianz Parque, e do FielZone, na Neo Química Arena.

Os espaços costumam lotar. Lá, os torcedores pagam um valor fixo para comer e beber à vontade. O ticket médio no estádio do São Paulo e do Corinthians gira em torno de R$ 500. Na casa do Palmeiras, sobe para R$ 1 mil. Os torcedores podem experimentar desde açaí até uma roda gigante de costela. As opções são oferecidas de acordo com as particularidades dos torcedores.

“No Allianz Parque, a gente trabalha com uma comida mais requintada, como se fosse um bistrô francês. Na Neo Química Arena, o foco são churrasco e hambúrguer. No Morumbi, a prioridade são as comidas de estádios, a tradicional pipoca, o amendoim e os sanduíches. A torcida também gosta muito de feijoada”, conta Rizzo.

“O negócio surgiu volumoso. Criamos um modelo de negócios que não existia no Brasil”, diz o empresário, que não paga aluguel nos estádios. Geralmente, ele é sócio dos clubes e divide o faturamento. “Posso te garantir que se você somar todos os camarotes que existem nos estádios, nenhum dá mais retorno do que o meu”, afirma.

Rizzo está empolgado. No início do ano que vem, vai inaugurar novos camarotes no Maracanã, no Rio, e no estádio dos Aflitos, no Recife. “Eu dou palestras até fora do País e digo que essa é a tendência mundial. Ninguém mais quer saber daquelas suítes quadradas, onde um fica olhando pra cara do outro. Nossos espaços quebram essa monotonia”, salienta, orgulhoso de seus serviços. Em seus ambientes, ele diz que o fã de futebol conhece uma experiência diferente. Tem até estúdio de tatuagem e barbearia. “O torcedor vive o time dele, assiste ao jogo com seu ídolo e come uma comida boa”.